Salsinha

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Capítulo 4 - Salsinha

"Conhecimento Útil"

 Os sons do lado de fora continuam altos e agitados, deve passar das três horas da tarde. O quarto agora está escuro de uma forma que só Clara consegue deixá-lo. Talvez as cortinas não gostem de mim.

 Deitadas embaixo do cobertor, com o tecido encostando em nossos corpos nus e a sensação de meu corpo no dela, respiro fundo, criando coragem para perguntar.

 — Quando vai realizar meu desejo?— falo rápido, antes que mude de ideia.

 — Ora, — Clara afaga meus cabelos ternamente. — meu trabalho é vender flores e guiar umas almas aqui e outras ali para seu fim. Quem realiza desejos aqui é você.

 — Vou reformular a pergunta...— levanto-me, olhando-a nos olhos. — quando vai guiar a mim?

— Quando seu nome aparecer na minha lista. — suspira. — Sabe que odeio falar sobre isso com você.

 Clara levanta-se, sentando na cama. Observo atentamente cada parte de seu corpo, seus cabelos abundantes, longos e escuros, tão escuros quanto o céu da noite, caem sob seus ombros e seios. A pele morena de sol brilha levemente, devido ao suor, na fina luz que ultrapassa a porta, vinda do corredor.

 — Vamos tomar um banho e comer algo? — ela se vira para mim, mexendo no cabelo desconfortável. — Logo você precisa salvar um rapaz e seu peixe.

 — Falando nisso... - reviro os olhos para seu comentário -- você quebrar regras por esse rapaz não tem problema? — pergunto curiosa. — será que ele morreria tentando pelo menos reaver o corpo?

 — Provavelmente. Mas o que me preocupa é se você alterar essa linha do tempo, transformando-o em um tritão, ainda sim o destino dele ser a morte. Será que não vai morrer no processo ou virar comida de tritão?

 — Meu trabalho é realizar o desejo dele, o que acontece depois não me interessa. — levanto-me devagar. — Também não sei como é o processo de transformar um humano em tritão, por isso preciso consultar você sabe quem, para nós duas acharmos um meio. Eu poderia procurar sozinha em alguns dos livros que tenho aqui, mas duas cabeças pensam mais rápido que uma.

 Andamos devagar e em silêncio até o banheiro, onde entramos juntas embaixo do chuveiro quente e aconchegante.

— Eu poderia te ajudar — Clara retoma o assunto de segundos atrás. — Mas não faço ideia de como ler seus livros.

— Não se preocupe com isso. Minha mãe e avó que os escreveram, por isso não consegue ler. É um idioma que elas criaram e me ensinaram algo que inventaram, para ninguém poder ler. Nem eu mesma consigo entender direito às vezes.

 Acabamos o banho e nos vestimos em silêncio. Na cozinha, enquanto Clara nos fazia maravilhosas panquecas de frango, eu a ajudava preparando a salada e, nesse tempo, conversamos. Conversamos sobre coisas banais, sobre o tempo, sobre passado e presente sobre o filme que vimos em sua casa alguns dias atrás.

 Laima juntou-se a nós, dizendo que Alex passara o dia todo em casa, em família. Com a conversa a três criamos teorias sobre Alex e o tritão, inventamos meios de tornar humanos em peixe, sem nem saber ao certo se havia mesmo um meio. Mas certeza que há.

 O jantar saiu já era mais de sete da noite, comemos sem parar a conversa, quase sem nem respirarmos, pulando de um assunto para outro, despedindo-nos lentamente, cinco dias não é muito para mim que a verei, já ela não me verá nessa linha do tempo.

A Bruxa das FloresOnde histórias criam vida. Descubra agora