Entre paixões e poções (HIATUS)

1. Prólogo - A noite no orfanato

Jade não era uma garota normal e sabia disso. Todos sabiam. Por isso fazer amigos não era a coisa mais fácil do mundo, mesmo morando em uma casa repleta de órfãos, mais machucados e vulneráveis que a maioria das crianças normais. Porque eles não eram normais. Crianças com pais mortos? Crianças que os pais abandonaram? Crianças que tiveram seus pais tiradas delas? PEN! Isso, pela visão da sociedade, era algo triste, de dar pena. Mas morar em orfanato? Você estava atestando por escrito que "Sim, eu aceito sofrer bullying na escola", afinal, é tão engraçado crianças morando em um orfanato (Jade não achava engraçado. Ninguém que morava em um orfanato achava, mas por algum motivo o humor das pessoas de fora eram peculiar). E ainda assim Jade conseguia ser diferente das pessoas que deveriam ser parecidas com ela. Ela ultrapassava o normal de esquisito. Uma vez o gás tinha acabado, mas estava com muita vontade de tomar chocolate quente e sem paciência nenhuma para esperar o cara com o gás chegar, então esquentou o leite por conta própria. Não sabia como. Num minuto o leite estava frio, e no outro pelando. Ficou tão feliz que fez chocolate quente para todos, mas eles acharam estranho demais para aceitarem. Outro dia, enquanto estavam jantando, Manoel (um garoto engraçado, pelo menos uns três anos mais velho do que ela) tinha pedido a ela para passar o sal, e ela passou. O fez flutuar por toda a mesa até chegar nele. Não era uma grande surpresa para ninguém, mas ainda assim todos pareciam meio incomodados. "Você não consegue ser normal nem na hora da janta?", resmungou Manoel. Ela só queria agradar, divertir, mas aquilo, o que ela tinha, não divertia eles. Nunca.

— Mesmo para bruxas experientes, não é normal fazer saleiros flutuarem sobre a mesa — Anna, a diretora do orfanato ralhou com ela aquela noite.

Era isso que Jade era. Uma bruxa. Não lembra muito bem quando foi que descobriu, mas lembra como foi. Todos estavam na sala estudando, e então Marli e Poppy começaram a brigar por causa de um lápis de colorir. Jade já estava chegando ao seu limite, tentando se concentrar, mas foi quando coloriu para fora da linha o desenho que tinha feito com tanto cuidado para a aula de artes que ela explodiu.

— Calem a boca — gritou, e, com toda a sua raiva, liberou o que é que estivesse guardado dentro dela, preso em uma caixinha frágil. O fogo na lareira que estava baixo aumentou em um nível assustador, subindo a temperatura da sala rapidamente. Todos os papéis saíram voando, e um vento passou. Todos a olharam assustados. Assustados não. Amedrontados. Ainda não tinha percebido o que havia feito, só enxergando sua raiva e confusão no rosto de todos — O que estão olhando?

— Jade, suba para seu quarto agora — disse Anna com a voz trêmula. Ela tinha um tipo diferente de preocupação em seu rosto. Não estava necessariamente assustada com o que tinha acontecido, mas sim que aconteceu na frente de todos e ela não pôde prevenir. Foi só quando Anna disse seu nome que percebeu o que tinha acontecido. Não, o que tinha feito.

— Mas eu não...

— Agora — repetiu, com a voz um pouco mais firme.

Jade subiu, tão assustada quanto os outros. Não soube quanto tempo tinha passado, mas foi bastante, até Anna subir para o quarto e contar a ela toda a verdade. Ela não explicou muito, mas falou sobre o mundo bruxo, e que os trouxas (os que não eram bruxos. Em outra ocasião, Jade teria achado o nome engraçado) não sabiam que pessoas como ela, existiam. Pelo menos não a maioria. Disse que pais trouxas poderiam ter filhos bruxos e que este era provavelmente o seu caso.

— Foi por isso que eles me abandonaram? — perguntou, de cabeça baixa.

— Não sei — respondeu, ríspida como sempre, mas com um pouco de consolo em sua voz — Provavelmente. Agora preste atenção. Perto do seu aniversário de 11 anos uma coruja virá te entregar uma carta te recrutando para estudar na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Você não pode aceitar, entendeu?