Conversa; parte 2.

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- Oi, é a Min Keiko?

O garoto estava começando a palpitar. Era a primeira vez que ele adicionou uma pessoa no LINE fora de sua família. Ele não sabia o que fazer. Apenas tomou seu caminho para casa, esperando ansiosamente por uma resposta.

Em poucos segundos, assim como a aceitação da solicitação de amizade, Keiko respondeu:

- Achava que você iria esquecer. E sim, sou eu mesma! - digitou Keiko.

- Eu... eu nem sei direito como usar o LINE. Eu entro poucas vezes aqui, apenas quando minha mãe me manda mensagem...

- KKKKKKKKK. Cara, como assim? Você não tem ninguém adicionado no seu LINE? - perguntou Keiko, num tom óbvio.

- Não. - respondeu Ren, diretamente.

- Wow...

- Pois é.

- Bem, eu posso dizer com orgulho que eu sou sua primeira amiga do LINE! :) - digitou Keiko, feliz.

Ren ficou vermelho.

- Sim, verdade. - respondeu Ren.

- Ei, agora que eu parei para pensar... - começou Keiko. - você disse para mim que só fala com sua mãe pelo LINE, certo?

- Sim.

- E seu pai? Você não tem ele adicionado?

Ren já sabia da resposta, mas optou por arrumar uma saída rápida:

- Eu não quero falar sobre isso.

Keiko percebeu na hora o que ele quis dizer, e decidiu não continuar nesse assunto. Ela já formava teorias em sua cabeça. O pai dele foi preso? O pai dele se divorciou? O pai dele morreu?

- Bom, te vejo amanhã na escola! (acabo de perceber que digitei a mesma coisa que eu falei agora há pouco). - digitou Keiko, brincando.

Ren não respondeu. Apenas leu a mensagem e seguiu para sua casa. Ele não sabia mais o que o futuro lhe preparava. Acabava de se tornar amigo de uma garota. Ele nunca falou com uma e muito menos teve amigos.

Era tudo muito novo para uma mente com muito conhecimento.

Era tudo muito... inocente.

• - • - • - • - • - • - • - • - • - • - •

Ren pegou o metrô em direção à sua casa, sentando-se do lado da janela.

Ao passar por uma ponte, o pôr-do-sol desaparecia pela linha do horizonte. A luz que o sol emitia era vermelha-alaranjada, que se estampava no metro e no rosto de Ren.

Ren chegou em casa às 19:10.

Ele estava atrasado.

Ren sempre combinou com sua mãe de, em dias escolares, chegar em casa antes das 19:00.

Ele não sabia o que aguardava, e pensou se queria mesmo entrar em casa.

Ele não queria apanhar.

Após pensar muito e sentir que o clima estava esfriando, Ren criou coragem e decidiu entrar.

O barulho da porta abrindo ecoou pela rua vazia e escura.

- Cheguei em casa... - disse Ren, interrompido por um empurrão, vindo de trás.

Ren caiu no chão, reagindo a dor que lhe afetava.

- ONDE É QUE VOCÊ ESTAVA ESSE TEMPO TODO? - gritou a mãe, furiosa.

Ren não queria falar com ela, apenas se levantou e não disse uma palavra.

- POR ACASO O GATO COMEU SUA LÍNGUA? ME RESPONDE, PORRA. - gritou a mãe mais uma vez.

- Eu... acabei tendo que ficar por mais tempo na escola. - começou Ren. - Como é minha primeira semana, eu tive que receber orientações.

De um lado, ele não estava mentindo. Frequentemente professores e coordenadores o chamavam para explicar sobre os princípios da escola, regras, horários, etc.

Mas ainda tinha a Keiko, que foi o motivo do seu "atraso".

- Você acha que essa desculpa vai me convencer? - disse a mãe, em um tom irônico.

A mesma se aproximou do filho.

Olho com olho.

Ren tentou se afastar do rosto da mãe, mas não conseguiu. Ele foi tomado pelo medo. Seu rosto começou a suar. Ele não sabia o que fazer.

Ele só queria sair daquela situação.

Ren cogitou na possibilidade de sair correndo e se trancar em seu quarto, mas isso iria desencadear uma série de discussões.

Coisa que ele menos queria.

Após 10 longos segundos de sua mãe o encarando a centímetros de se encostarem, ela disse:

- Vai tomar banho. O jantar fica pronto daqui a pouco. - ela falou em um tom de desprezo tão visível que fez Ren engolir em seco.

Ren pegou roupas limpas em seu quarto e foi para o banheiro.

Após se livrar de seu uniforme sujo, ele ligou o chuveiro. Havia uma banheira, mas ele queria tomar um banho rápido.

A água quente caia sobre seu corpo enquanto Ren pensava em um monte de acontecimentos traumáticos que ele já vivenciou.

Ele começou a ter flashbacks.

Ren não aguentou a pressão, e começou a chorar, levando o braço cheio de cortes cicatrizados para secar suas lágrimas, mas isso não foi suficiente.

Ele se agachou e tapou seus olhos com suas mãos. Para não incomodar sua mãe, ele começou a chorar silenciosamente. A água do chuveiro ajudou no disfarce do barulho de seu choro.

Ren não queria ter nascido naquela família.

Ren não queria viver o que ele viveu anteriormente.

Ren chegou no seu limite.

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