Oitavo capítulo: A chegada.

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Jurará açu e Anhangá emergiram do igarapé, e Raoni jogou a toalha molhada em cima da fogueira instantaneamente, para que fosse apagada como Yebá belö mandou

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Jurará açu e Anhangá emergiram do igarapé, e Raoni jogou a toalha molhada em cima da fogueira instantaneamente, para que fosse apagada como Yebá belö mandou. Anhangá tinha cabelos longos, um corpo forte, olhos negros e boca carnuda. Jurará-açu estava em sua forma animal, assim como a filha.
—Minha amada! —Anhangá falou, com lágrimas nos olhos, saindo do rio e tomando a onça que agora voltava a sua forma de mulher, nos braços. Mas não a mulher velha. Yebá tomou aparência de uma mulher de 30 anos, pele de ébano reluzente, longos cabelos lisos negros, pernas grossas e cintura esbelta, a qual Anhangá aproximava de seu corpo em um abraço demorado. Jurará se aproximou da filha, ficando ao seu lado.
—Queria poder te abraçar, minha querida. — Jurará falou, chorando.
—Eu poderia te abraçar minha mãe, se não houvesses me dado a mesma maldição que tens, por pura mágoa. —Raya falou, com a voz embargada.
Inaiê continuava enroscada no corpo de Raoni, acompanhada dos gêmeos em forma animal.
—É muito estranho vê-los assim. — Raoni falou.
—Você se acostuma. —Kauê e Kaiú falaram, ao mesmo tempo.
—Vocês podem se transformar em pessoas a hora que quiserem ou são como Raya? — Raoni terminou de falar, e Inaiê voltou a sua forma humana, caindo no colo do rapaz.
—Isso responde sua pergunta? —Raoni enrubesceu, enquanto os gêmeos voltavam a sua forma humana e riam da reação do rapaz.
—Levantem-se. Precisamos traçar um plano de preparo eficiente para enfrentar Tupã. Ele virá. Por jurará, por Raya e principalmente por Raoni, que descobriu a filiação. Vai funcionar da seguinte forma: todos nós temos um papel importante aqui, treinar as próprias habilidades, e ajudar Raoni a aflorar e treinar as suas. Será uma semana intensa. Por isso agora vamos comer. Tragam tudo para a mesa.
Todos sentaram-se, e Anhangá fitava Raoni, que já estava desconfortável com o olhar do Deus.
—Tuas habilidades são raras, garoto. Nos serão muito úteis. —Anhangá falou, olhando-o enquanto comia ferozmente.
—Eu ainda não as conheço. —Raoni o encarava com olhar de curiosidade.
—Tua forma animal é o gavião. Tuas habilidades são a super visão, manipulação do tempo e a comunicação com os espíritos ancestrais animais. —Raoni sentiu um calafrio subir pela espinha.
—Os mortos?
—Os mortos. —Anhangá respondeu.
Todos comeram, e depois, ordenados por Anhangá, foram para o campo aberto em frente à casa.
—Inaiê e Raya, aflorem as habilidades e o espírito animal do garoto. Kauê e Kaiú treinem no igarapé, precisam estar atentos o suficiente quando chegar a hora. Jurará, fique de vigília. Usa tua onisciência para nos dizer o dia e a hora que Tupã virá. Yebá, vem comigo.
Inaiê, tomando Raoni pelas mãos, levou para o meio do campo, ignorando a presença de Raya.
—Para encontrar tua forma animal, tens que te concentrar em ti mesmo. Internaliza tua transformação, fecha os teus olhos e só os abre quando sentires que está preparado. Pode segurar minha mão se preferir. Mas antes, eu queria saber se queres ter a visão.
—A visão? — Raoni respondeu, confuso.
—Nós sabemos que tudo aconteceu rápido demais e você não teve tempo de processar tudo. Por longos anos tivemos que esconder a verdade de ti pois sabíamos que eras só uma criança, assim como nós. E a partir do momento que descobrisses a tua filiação e os teus poderes, Tupã voltaria, Yebá, que para ti, por muitos anos foi Moema, agora te mostra tudo, e não posso imaginar como é difícil engolir tudo isso. Passar a visão, foi o que meu pai fez comigo quando me ensinou a dominar os meus poderes, o ódio misturado com o alívio de saber de tudo limpou minha mente e meu coração, permitindo que eu me concentrasse melhor. Ao ter a visão, você vai sentir como se sempre soubesse de tudo. Desde o início. Suas lembranças ficarão um pouco distorcidas. Mas te ajudará nesse momento, e com o tempo, hão de se organizar. —Inaiê falou, tocando na mão do rapaz.
—Deixa que te passo a visão. Minha onisciência abrange bem mais do que sabe Inaiê. Se aproxima, e toca nessa carapaça. Não a solte até sentir que acabou.
Assim Raoni fez. Inaiê fitou Raya com um olhar que queimava de raiva. Raoni caiu no chão.
—Era você? Você foi violentada na infância? Moema é a criadora do mundo? Meu pai matou minha
—Shhhhh, passou meu amor, eu estou aqui, calma. —Inaiê tomou Raoni no colo, deitando-o em seu peito, afim de acalmá-lo e evitar uma possível crise de pânico, tanta informação ao mesmo tempo seria capaz de coisas irreversíveis, mas era inevitável.
Inaiê tocou em sua mão e olhou em seus olhos.
—Tenho algo a mais para te contar, a visita que tu recebeste hoje, o urutau que te acompanha e protege a tantos anos é teu espírito animal, teu protetor, teu amuleto! E talvez só tenhas notado a presença dele agora, mesmo que te acompanhe desde o dia que nascestes. Mas agora não é o momento para discutirmos isso. Vou te passar os ensinamentos de meu pai, Boitatá. —Inaiê fechou os olhos, Raoni também o fez. Quando os abriu novamente, tinham cor púrpura. Havia funcionado. Feliz, o rapaz carregou, rindo, Inaiê, a moça o beijou. E Raoni, em êxtase de emoção e um misto de sentimentos, correspondeu, dando-lhe um beijo apaixonado, após a garota ter lhe passado não só os ensinamentos de seu pai, mas todos os sinais de paixão que ela lhe deu na vida inteira e ele nunca houvera percebido.
Raya, chorando, saiu dali. Quando percebeu o que fez, Raoni pôs as mãos na testa, em sinal de arrependimento.
—Olha só quanto mal ela nos causou Raoni, não te sintas mal por isso. Se não fosse pela existência dela e da mãe, os mundos estariam em perfeito equilíbrio, teu pai não teria matado tua mãe, e nem te deserdado ou adormecido tuas habilidades. Tu sabes agora, quem de fato te ama. Cabe a você escolher.
—Se tudo tivesse sido diferente como tu dizes Inaiê, nunca terias me conhecido, como tu podes me amar se desejas isso?
—Desejo que ela não exista para atrapalhar o nosso amor, não que eu não te conheça!
—Não existe amor aqui, Inaiê! Nunca mais faça o que fez. Amo Raya, e lutarei por ela. Para que a maldição seja quebrada, e eu possa viver em paz. Me deixe em paz. —Raoni saiu, correndo, em busca de Raya, e Inaiê ajoelhou-se, chorando.
—Eu vou me vingar. —Sussurrou, com a voz embargada.

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