O menino perfeito

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— às vezes? —perguntou a Cecília, enquanto eu contava a minha conversa com a minha mãe de noite — como é que ela ainda não teve a certeza que tem algum problema entre vocês? Não é preciso muito, basta estarem no mesmo espaço por alguns segundos que não da boa coisa. Da para ver pelas vossas expressões.

— bom, ela só suspeita, não tem certeza enós também já não vamos nos ver.

— mas hoje tem o jantar na casa do Sr. Rildom — lembrou-me o Heitor.

— Eu não vos contei do meu combinado e do Leandro? —  olhei para um e depois para o outro.

— contaste, no entanto isso não significa nada — disse o Heitor.

— como não? Ele me garantiu que não iria aparecer, então não tenho que me preocupar com nada.

— Também garantiste isso, mas vais ir — contrapôs a Cecília.

— Ele não vai — Reafirmei, confiante.

— Tens certeza? — indagou a Cecília, a levantar da cama.

— Absoluta — disse confiante. Eu estava certa disso. Não duvidei nem por um segundo.

Saímos de casa, eu e os meus pais lá para às 16. Não demoramos muito, já que a casa deles ficava a 6 quarteirões da nossa. Fui a primeira a descer do carro, toquei a campainha. Tive uma grande surpresa, uma horrível surpresa

— Leandro...

— Bia...

— Bianca para ti!  — fez uma careta e deu-me espaço para entrar.

O que ele faz aqui? Por que é que ele está aqui?

Perguntei-me enquanto adentrava. Sentei no cadeirão de frente a ele. Fez a sala para nós. Estávamos a lançar olhares mortais um para o outro.

— desculpa a demora — pediu o sr. Rildom, enquanto descia a escada acompanhado da sra. Rildom.

— a culpa foi toda minha —a sra. Rildom colocou toda a culpa em si. Achei lindo isso da parte dela. Sorri com o seu gesto. Meus olhos encontraram os do Leandro, que me encarava de uma forma diferente. O seu olhar estava diferente. Ele nunca havia me olhado daquele jeito. Era um olhar doce, terno. Retirei imediatamente o sorriso que estava nos meus lábios e tratei logo de desviar os meus olhos dos deles.

— nada disso, a culpa foi minha — apressou-se em chegar no último degrau e estendeu a mão para ela, que a recebeu de muito bom grado, com os olhos nos dele, a brilhar. Era tão lindo ver o amor deles. Eram por esses momentos que eu ainda, lá bem no fundo, do fundo, do fundo, que ninguém percebe, a um resquício de esperança no amor. Mas é tão difícil voltar a confiar depois de ter entregado tudo de si para alguém que não merecia nem a metade da metade.

— não importa. Eu acredito que o Leandro foi uma boa companhia — o sr. Rildom falou e depois olhou-me  — acredito que ele seja uma boa companhia.

— muito boa — falei sem esconder nenhum pouco o sarcasmo. A Sra. Rildom foi á cozinha buscar a comida com a ajuda do Leandro, tivemos que esperar mais alguns minutos e logo começamos a comer.

— a sobremesa foi o Leandro que fez, ele é ótimo com sobremesas — contou-nos a Sra. Rildom cheia de orgulho.

— além de um ótimo aluno — reforçou o Sr. Rildom. Os dois estavam com um grande sorriso nos lábios e com os olhos no Leandro. Segurei-me para não revirar os olhos. "O menino perfeito".

— então podias ajudar a Bia, davas algumas aulas de matemática.

— mãe... –a reprimi.

— qual é o problema, precisas, a tua professora de matemática ligou-me hoje e informou-me que as tuas notas baixaram muito.

Droga! Obrigada por compartilhar o quanto eu sou uma aluna ruim com os outros.

— eu vou melhorar, só preciso de mais tempo.

— para quê correr o risco de tirar negativa? O Leandro irá ajudar-te com muito prazer —respondeu o Sr. Rildom, por ele.

— claro — confirmou o Leandro — lancei-lhe um olhar mortal. Era o que me falva ter que aturá-lo mais vezes e por mais tempo.

— por que é que não vão na cozinha, Bia? podias ajudar o Leandro a terminar de enfeitar alguns bolos — sugeriu a Sra. Rildom. Mesmo sem querer ir, coloquei um pequeno sorriso nos lábios e concordei a balançar a cabeça. Levantei-me e segui o Leandro.

Quando chegamos a cozinha,  aproveitei a oportunidade para fazer a pergunta que eu tanto queria:

— estás aqui a fazer o quê?

— como assim estou a fazer o quê aqui? — respondeu-me com uma pergunta.

— o nosso combinado não era lutarmos para não estarmos no mesmo sítio ao mesmo tempo?

— também estás aqui, fiquei surpreso por ver-te. Pensei que não virias. Não podia fazer-me ausente. Tinha que ajudar a minha tia com os bolos — apontou para eles que estavam por cima da mesa. Eram 5.

— parece que tens muitas "qualidades" — fiz gestos com as mãos.

— só tu é que não percebeste e vou te ajudar com a matemática.

— evou te ajudar com a matemática — imitei-o — não preciso da tua ajuda, eu vou conseguir melhorar as minhas notas sozinha.

— não tem mal nenhum em pedir ajuda, isso demonstra humildade, que é uma grande qualidade que vejo que não tens, orgulhosa.

— orgulhosa é a tua avó, primeiro e segundo, eu não quero ter que aguentar a tua presença na minha vida.

— sabes qual é o real problema? — não respondi e encarei-o a espera de resposta. Já estávamos muito próximos. Ele aproximou-se mais ainda. Inclinou-se. Seu rosto estava bem próximo do meu — tens medo de que eu esteja muito presente na tua vida a ponto de deixar que a muralha que tanto levantas caía.

— quê? — balbucilei quase como sussurro.

Um coração com feridasOnde histórias criam vida. Descubra agora