1. Huang Renjun

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Arlin, Casa, 5h00.

— Acorda, filho. Hora de levantar.

Minhas doces e macias mãos tocam o meu rosto calmamente, quase como se este representasse um boneco de porcelana, tamanha fragilidade. Aos poucos, abro meus olhos e encaro a luz branca do meu quarto acesa, tal que ilumina todo o cômodo — assim como a rua de fora, por ainda estar escura.

Levanto-me do colchão agradável e esquentado, soltando pequenos grunhidos de desconforto ao ter de sair do espaço quentinho e confortável em que estava. Calço minhas pantufas para logo me dirigir ao banheiro, onde escovo meus dentes e jogo um pouco de água morna no rosto, na tentativa de me despertar — não funcionou.

Sento-me na mesa de jantar, onde há café pronto e pães para fazer sanduíches ou colocá-los na chapa.

— Dormiu bem, Renjun?

— Dormi, e você, mãe?

— Muito bem até, obrigada por perguntar.

A respondo com um pequeno sorriso e me ponho a desfrutar da bebida quente e pão assado para, enfim, arrumar a minha mochila e ir à escola. O dia se iniciou como qualquer outro, peguei a caneca vermelha, ou foi a laranja? O cinza das duas é o mesmo, e muitas vezes pergunto à mamãe para que a curiosidade cessasse de imediato.

Com tudo pronto, pego minha mochila cheia de livros e entro em nosso carro, que até minha doença não impede de perceber que ele é, de fato, cinza. Sento-me no banco do passageiro e antes que minha mãe iniciasse o caminho, contactei Chenle dizendo que já estava indo para a escola e estaria esperando-o. Ele dificilmente iria me responder, já que acordo mais cedo em contraposto aos outros, mas é sempre bom deixar uma mensagem.

O caminho para a escola era bem tranquilo, porém sempre muito longo, o que me forçava a acordar plenas cinco horas da manhã durante a semana. Encaro através da janela do carro as árvores, a grama e as pessoas que andam pela calçada. Observo todos eles esperando que consiga avistar alguma cor, e hoje, assim como todos os dias anteriores, só ganhei tons de cinza, branco e preto. Uma vez, vi pais lendo para seus dois filhos pequenos livros que ensinam as cores. E assim como todo o mundo ao meu redor, estes mesmos não passavam de páginas e mais páginas com palavras e imagens sem cor; sem vida.

Lembro-me muito bem quando percebi que não era igual as outras crianças da escola. Minha mãe, até hoje, não acredita que eu realmente me recordo deste dia, mas ele foi traumático demais para não o guardar eternamente em minhas memórias.

Naquela época eu tinha por volta de 2 anos de idade, frequentava uma pequena creche e lá a professora contava histórias. Eram os famosos contos de fadas, estes que sempre me causaram um arrepio na espinha. Afinal, como uma princesa acorda de um sono depois de 100 anos e não fica completamente desesperada? Não há sentido algum. Então, por que tendem a gostar tanto dessas anedotas tão irrealistas e sem sentido?

Evoco que, durante a história da Chapeuzinho Vermelho, a educadora mostrou para toda a sala uma menina vestindo um capuz bem vermelho, assim como o sangue que sai de nossos corpos quando nos machucamos. A questão é que eu não via nenhuma cor ali, era apenas um escuro e tons sem sentimentos. Aquele capuz não me passava a sensação do avermelhado vivo, ele era frio, depressivo, bem como todos os objetos e pessoas que me rondavam naquele momento. Percebi que o planeta Terra não era um breu e sem vida para todos. Compreendi que as pessoas conseguem enxergar existência nos objetos, sentir emoções apenas por imagens, diferenciar e nomear colorações facilmente.

Elas conseguem ver as cores. Eu não.

Desde então, constatei que realmente não sou colorido. Não tenho tonalidades por fora ou por dentro, sou exatamente como vejo o mundo: cinza, branco e preto.

Visão (Des)Colorida | NorenminOnde histórias criam vida. Descubra agora