Capítulo 1

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Me olho pela última vez na frente do espelho pendurado no meu quarto, dando uns toques na minha blusa branca, deixando que a estampa com um desenho de uma caveira no meio de coração grande pintado de xadrez de rosa e preto e os dois ossos brancos nas laterais se sobressaíssem. Sorrio visualizando o símbolo do álbum The Best Damn Thing, da Avril Lavigne.

Solto uma longa respiração longa deixando o sorriso se desfazer em meus lábios. E, pesar de usar a minha blusa favorita e do meu álbum favorito, não conseguia esconder o meu semblante de tristeza.

— Todo dia e de alguma forma eu estou melhorando. — Digo a mim mesma, visualizando o meu reflexo no espelho. — Que besteira!

Nessas férias eu li que uma mentira repetida em mil vezes ela se torna uma realidade e desde então passei a dizer está frase constantemente para mim mesma, principalmente nos momentos que iria sair de casa, mas ela não passava de uma bobagem! Eu não estou melhorando, nem aos poucos. Todo dia ainda era uma luta para sair da cama. Eu gastava a toda a minha energia contra o meu desejo de permanecer nela pelo rosto do dia e, quando levantava, tudo piorava.

Meu cérebro parecia uma montanha-russa de sobe e desce. Meus pulmões se enchiam de algodão e se expandiam por todas as minhas vias de oxigênio, dificultando a minha respiração. É uma sensação horrível e diária e, na maioria das vezes, nem uma respiração profunda era o suficiente para me acalmar e eu assumir o controle de mim mesma.

Me aproximo da porta e involuntariamente imagino milhares de situações horríveis que podem estar do outro lado. Pessoas andando de um lado para o outro, esbarrando em mim, cheiro, falatórios e barulhos de carros. Me paralisava sempre que pensava nisso e o desejo de voltar para a cama gritava em mim e eu sempre, sempre demorava para abrir a porta.

Andando sobre a calçada, buscava sempre caminhar de uma maneira que não me fizesse chamar atenção dos outros, próxima da parede e com a minha tendência de sempre manter a minha cabeça baixa enquanto usava meus fones de ouvido. Seja noite ou dia, som ligado ou não, meus fones eram meus melhores amigos.

Era uma noite cheia de constelações, brilhando por todo o céu, com os holofotes espalhados e iluminando as calçadas e os carros que davam vida a mais na pequena cidade, como todas as férias de julho. Entretanto, mesmo a rua agitada, me encontrava sozinha no ponto de ônibus, movendo a cabeça de um lado para o outro enquanto mexia meus lábios, imaginando a minha performance no Maracanã, com o público indo ao delírio cantando Nobady's Home, da Avril Lavigne.

Totalmente distraída mexendo a minha cabeça de um lado para o outro sem esconder a minha animação, uma garota surge em minha frente, bem próxima a mim, dando um sorriso bem largo.

— Você vai para à orla? — Pergunta ainda me encarando. Assenti piscando repentinamente, processando de onde ela veio. — Eu também! Vamos juntas caminhando?

Por que eu tenho dificuldade em dizer 'não'? Talvez seja a minha necessidade de agradar o outro, que mesmo em situações corriqueiras, eu sempre aceito com a minha melhor falsa simpatia. Ela ergue a sobrancelha, aproximando o rosto ainda mais do meu e abrindo ainda mais o sorriso.

— Claro! — Respondo animada.

Durante o caminho, ela falou por todo o momento, ria nos temas que só ela entendia e achava graça. Era como uma "extrovertida nata", um nome que eu dei para as pessoas que conseguem interligar uma conversa a outra e responder a si próprio ou até mesmo rir do próprio assunto, tudo isso sem precisar de alguém.

Neste tempo, ela me contou que tem dezenove anos e mora na cidade Rio de Janeiro, que adora ir ao cinema, andar no shopping com os amigos ou ir à Lapa nos finais de semana sempre que podia. Falou também que tem uma casa aqui onde eu moro há quatro anos e que passava sempre os feriados e férias aqui no interior, mas que durante esses anos não conseguiu fazer uma amizade e se queixou disso. E, no segundo semestre, iniciaria o segundo período de História da Arte, na UFRJ.

Magnólia (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora