Parte XI

608 72 16
                                    

Parte XI

Meu coração protestou alto, enquanto eu assistia desesperada um Loran ferido embaixo do bruto Wes, que se preparava para perfurá-lo com sua faca.

– NÃO! Pare agora, Wes! – Corri para Wes e segurei os braços dele por trás. Ele me acotovelou e fui empurrada. Tomei cuidado para não desequilibrar e cair na água, mas foi por pouco. Decidi continuar onde estava. Acrescentei alto: – Se você me ama!

Ele não me amava, mas a poção o fazia achar que sim. Ele olhou para mim. Estava enlouquecido. De ciúmes. De amor.

– Não posso suportar ter um adversário – falou com uma paixão doentia.

– E eu não posso suportar que vire um assassino – entrei no jogo dele. Eu tinha que fingir que o amava, era o único jeito de proteger o marinheiro com quem eu passara a me importar. Loran tinha que se afastar de mim e nunca voltar. – Esse homem salvou minha vida, Wes! Pelo menos seja grato por isso, poupe a vida dele por essa dívida que tenho!

Wes franziu o cenho, dividido entre o instinto e o pedido de sua amada.

– O que quer dizer?

– Quando eu estava aqui no píer te esperando ontem à noite, passei mal e caí no mar. Eu teria morrido afogada, mas ele me viu caindo e pulou para me salvar.

Wes olhou de mim para o homem que mantinha refém.

– Isso é verdade? – perguntou para ele. Loran assentiu com dificuldade, e então disse em sua respiração frenética:

– Sim, eu a tirei da água!

– E por quê?

– Porque eu não podia deixar uma moça morrer! – o marinheiro retrucou, assustado e aborrecido ao mesmo tempo.

Wes mordeu o lábio e incidiu a faca. Gritei. Esta, porém, fincou-se na madeira do chão a poucos centímetros da cabeça de Loran.

Meus pulmões não aguentavam tanta pressão. Achei que eu ia desmaiar de novo.

– Da próxima vez acerto o alvo. Só não te mato hoje, pois era minha responsabilidade protegê-la ontem. Eu que a fiz estar aqui sozinha.

Wes, assim, saiu de cima de Loran e chegou perto de mim. Segurou meu braço com mais força, imagino, do que gostaria de pôr no gesto, e disse:

– Casa comigo, Agnes? Estou loucamente apaixonado por você e não posso suportar a vida agora, sozinho naquela fortaleza. Sou o herdeiro da fortuna do meu pai e preciso de uma esposa.

Pisquei ainda mais rapidamente do que antes. Meus olhos ardiam e ainda assim não lacrimejavam. Eu me sentia seca, mais seca do que nunca, e parecia que meu coração estava murchando também. Engoli em seco, totalmente em seco, e fiz esforço para manter o contato visual naquele homem que tanto desejei, e agora não queria mais. Eu o achava bonito? Antes de Loran, aparentemente eu não conhecia a beleza...

– Tudo bem. Eu aceito – as palavras rasgaram tudo em meu interior. Ele sorriu satisfeito e soltou meu braço. Senti o local onde sua mão tinha apertado latejar. Esse não era o pedido de casamento com o qual eu havia sonhado. Mas o que eram meus sonhos antigos, afinal? Um bando de baboseiras.

– Vejo você mais tarde, Agnes, minha futura esposa – ele apreciou as palavras. Seus olhos cintilavam. – Estarei em sua casa antes do anoitecer. Teremos um jantar de celebração.

Assenti quase imperceptivelmente e o observei ir embora. Fechei os olhos para aliviá-los da dor, e aí olhei para Loran, que estava se levantando. Agachei-me perto dele.

– Me desculpa, Loran! Eu nem sei o que dizer... aquilo foi horrível...

– Por que não me disse que estava comprometida com aquele homem? – ele estava chateado. Meu coração se encolheu até virar uma uva passa.

– Eu gostaria de não estar, foi um erro terrível! Mas é tarde demais... não podia recusar a proposta dele ou você correria risco de vida. Você ouviu o que ele disse. Da próxima vez não te pouparia.

– Bem que você me avisou que teria que partir... – Ele parecia muito abatido e decepcionado. Odiei ver aquela expressão em seu rosto. – Tem razão, com isso não posso lidar. Você não quer que eu o mate, quer? Da próxima vez posso não perder.

– Não! Não haverá próxima vez – eu disse com convicção, embora me doesse profundamente. – Não posso deixar que o mate. Eu fiz isso, a culpa é toda minha. Não posso deixar que o machuque... Nem posso arriscar que você saia machucado.

Loran se levantou e sacudiu as roupas.

– Então acho que esse é o fim para nós, Agnes.

Levantei-me também, angustiada como nunca.

– Loran...eu...

– Sei que tem sentimentos por mim, eu também tenho por você, como nunca tive por ninguém, mas temos que parar. É assim que deve ser. Se você não quer que eu o tire do caminho, não o farei, é uma decisão sua. E também não quero que ele a castigue por me ver. Sei que ele é o tipo de homem que faria isso.

Fechei os olhos para aliviar a dor neles, mas a dor por dentro de mim era maior... Senti que estava chorando; contudo, mais uma vez, nenhuma lágrima desceu.

– Siga seu destino, Agnes. Eu vou seguir o meu, no mar, onde sempre foi.

– Talvez meu destino seja no mar também – eu disse em voz baixa.

– Você não deve fugir daquele homem – aconselhou Loran, mais frio do que em qualquer momento desde que nos conhecemos. – Arque com as consequências de sua escolha e fique em paz. Espero que tenha uma boa vida.

– Nunca vai ser boa sem você – eu disse, porque sabia daquilo. Pela primeira vez minha intuição parecia estar funcionando direito. A Agnes inocente caía no mundo real.

– Adeus, Agnes. Por favor, não me procure.

Estendi a mão para o rosto dele. Loran se esquivou.

– Não faça isso. Ele pode ainda estar observando.

Abaixei a mão, frustrada.

– Para onde você vai?

– Para longe. Está na hora de partir mesmo.

– Vai sair de Rasminn? – Nãããoo, por favor...

– Talvez, em alguns dias. Se eu não me afastar de vez, isso não vai funcionar.

Olhei para baixo, para as botas molhadas dele, e me lembrei de todos os detalhes da nossa noite no barco. O dia mais perfeito da minha vida, e não por causa de Wes, jamais por causa dele. Percebi que até os meus sintomas de sereia pareciam insignificantes perto da magia que havia acontecido naquela noite... apenas algumas horas atrás. Parecia um infinito.

Ele tocou meu queixo com o polegar rapidamente.

– Cuide-se – foram suas últimas palavras.

E saiu andando. Olhei atordoada para o espaço onde ele deveria estar, onde deveria me dar um beijo e dizer que acharíamos uma solução. Mas eu tinha lhe dito que não queria uma solução. Eu era uma idiota e deveria suportar o peso dos meus atos. Eu não merecia um final feliz.

Vendo-o se afastar, senti uma força me devastar novamente, mais forte do que nunca. Desabei de joelhos, encolhendo-me, e desta vez ele não voltou para me resgatar. Não era doença ou magia obscura, apenas minha profunda desilusão.

Continua...

Nota da Autora: Muito obrigada por ler, e não se esqueça de adicionar à sua biblioteca! Se gostou, não deixe de escrever um comentário e apertar a estrelinha no topo para dar suporte à história e sua autora. Sinta-se livre também para divulgar a seus amigos e especular... 

O Lado Escuro do MarOnde histórias criam vida. Descubra agora