Capítulo 03| O terror

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Leia ouvindo | De toda cor - Renato Luciano

Otto Alencar

Minha caminhada demorou mais que o normal. Chego em casa quando o sol já estava de saída dando espaço para a lua brilhar aquela noite atrás das nuvens escuras. Mesmo não chovendo ou trovejando permanecia o clima frio. Após meu banho me reúno com meus pais na sala para assistir televisão.

Mais uma vez eu estava ouvindo minha mãe e meu pai com comentários preconceituosos enquanto passava uma reportagem sobre um casal homoafetivo que havia sido espancados até a morte.

- Eu acho bem feito para esses nojentos, só assim para se colocarem em seu lugar, e começar à agir como homem de verdade, e não como essas bixinhas que ficam transando com outras bixinhas. - Dizia meu padrasto enquanto negava com a cabeça o que se passava na televisão.

- Não acredito no que estou ouvindo, olha independente de qualquer coisa, independente do que eles sejam do que fazem, ninguém, absolutamente ninguém pode tirar a vida de outra pessoa, principalmente por motivos que não condiz nada com o ato. - Levanto em protesto, o que deixa meus pais um pouco assustados com minha reação. - Estou indo para o meu quarto.

Todos os meus medos começaram à ser engatilhados de uma vez só vindo como facas em meu corpo, ali estava eu deitado em posição fatal com um grito preso na garganta enquanto minhas lágrimas escorriam pelo rosto.

"Passarinho de toda cor, gente de toda cor, amarelo rosa e azul. Me aceita como eu sou." - Meu celular tocava em volume ambiente aquela música que me representa muito.

Leonam Rodrigues

Leia ouvindo| Amor de Titanic - Sabrina Lopes

Estávamos indo passar o aniversário de Lucas na casa de sua mãe. Havíamos deixado tudo pronto na noite passada: malas, documentos e aquilo que se definia como o essencial, pois iríamos ficar quatro dias fora da cidade.

Colocamos nosso cachorrinho no banco de trás do carro para viajar conosco, já que era apenas uma hora e meia de viagem. Saímos ao amanhecer com Lucas dirigindo o carro enquanto eu observava a paisagem. As nuvens bastante escura anunciava que em breve a chuva viria.

- Sabe, às vezes eu me pergunto por que você gosta tanto de ir para casa de sua mãe, sendo que, à maioria dos seus familiares te desprezam por você ser gay. - Começo uma conversa que eu sabia que incomodava ele, mas também me incomodava, pois o modo que ele e até mesmo eu, éramos tratados por todos os familiares deles deixava a casa de sua mãe à desejar.

- Não começa com esse assunto Leonam, por favor. - Lucas pede já fechando à cara e aumentando o volume do som, sinal de que eu havia tocado em um local onde eu sabia que doía no mesmo.

- É sempre à mesma coisa, quando começo à falar sobre seus parentes você fecha sua cara, nunca escuta as verdades que eu digo, ou se finge, você sabe que eles só querem te fazer mal e você continua indo lá. - Quando percebo por mim já havia falado mais do que eu deveria.

- Eu não fico me metendo em sua vida familiar Leonam, não falo de absolutamente nenhum parente seu já para evitar esses tipos de conversa, aí vem você e joga essas coisas que sabe que me abala na minha cara. Então por favor só te peço que fique na sua, e deixa minha vida com minha família que eu resolvo, mal pegamos a estrada e você vem querendo caçar confusão comigo. - Quando menos percebo já estávamos com os ânimos alterados, ele já andava mais rápido com o carro cortando aquela chuva que ia caindo na pista.

- Ok, eu vou ficar na minha por agora, mas se eu escutar algo que eu não goste, alguma piadinha que seja, eu não vou deixar barato para ninguém não viu? Não sou nem obrigado. - Falo por fim virando para a janela ouvindo Lucas bufar de raiva.

- Mas que saco, por que você não fica quieto e deixa a viagem seguir, pelo menos no meu aniversário?

Foi tudo muito rápido. O barulho da buzina, o carro rolando a estrada, o precipício, a água escorrendo pelo lado de fora. Me recordo do último verso da música que tocava na rádio, enquanto minha visão ia ficando turva.

"Esse amor é semelhante ao Titanic, enquanto eu me afundo eu vou deixando você livre"

Lucas havia morrido na hora do acidente. E o que ficou foi apenas eu acabado por dentro e por fora, um carro com a lataria toda deformada. Nossa cachorrinha não havia resistido ao acidente, e o pior de tudo foi não ter me despedido dele da forma que deveria ser. Ele morreu e estávamos brigados. Tudo por minha culpa.

Acordo assustado, minha respiração estava acelerada e lágrimas escorriam com uma forte intensidade pelos meus olhos. Lá fora chovia novamente, era exatamente 02:30 AM.

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