Vá embora

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Naquela manhã perdi a hora, não ouvi o despertador tocar. Me amaldiçoei o caminho todo até a escola. Eu estava furiosa comigo mesma por ter me descuidado tanto. Não posso voltar a ficar até tarde na casa da Valentina, a universidade é importante para mim e não posso me descuidar desse jeito.

Eu estava muito atrasada quando cheguei na escola, meu professor de química não me deixou entrar na sala. Ótimo mais um motivo para eu ficar furiosa, passei a noite toda terminando o projeto para poder entrega-lo, e acabei perdendo a hora.

Me deixei cair no chão e apoiei a cabeça entre as mãos enquanto tentava me acalmar.

-O que você ta fazendo aí?

Aquela voz familiar da minha melhor amiga me fez levantar a cabeça, Lucia se encontrava com um sorriso debochado no rosto.

-Smith não me deixou entrar. _disse fazendo uma cara de aborrecimento.

Ela negou com a cabeça.

-Você tem sorte, agora tem uma hora livre. Vamos tomar café?

Olhei meu relógio e comprovei que ainda era cedo. Me levantei e caminhamos até a cafeteira do campus.

Depois de pedir um generoso café da manhã, nos sentamos em uma pequena mesa para comer e bater-papo.

Lucia não parava de falar de um menino que havia conhecido no fim de semana, Jacob Reys. Ao que parece ele a convidou para sair no próximo final de semana e ela só sabe falar dele.

-Ele é tão lindo!_disse dando um trago no seu café.
-Me disseram que ele era um estúpido, mas depois do acidente que teve com os seus amigos, ele mudou completamente.

-Teve um acidente?_perguntei tentando demostrar interesse naquela conversa com a minha amiga. Eu me encontrava completamente perdida nos meus pensamentos.

-Sim, um acidente de carro. Eu escutei que um de seus amigos morreu e uma de suas amigas ficou cega. _disse Lucia demonstrando compaixão.

Senti um estranho calafrio percorrer o meu corpo.

-Q-Que? _gaguejei.

-Sim, bom... o menino que morreu se chamava Emiliano Russey e a que ficou cega se chama Valentina Carvajal.

Senti que meu estômago revirou por um instante.

-Va.. Valentina?, Valentina que? _falei tentando acalmar o tremor das minhas mãos.

-Carvajal. _repetiu.
-Por que, Juls?

Neguei com a cabeça rapidamente. Não pode ser a mesma Valentina, ou pode?. O sobrenome de Elena é "Medina". Tinha que ser outra Valentina, eu nem sei o seu sobrenome paterno... Quantas possibilidades existem de serem a mesma pessoa?.

-Por nada. _murmurei.

Aquela tarde, ao terminar as aulas eu me dirigi até a minha casa. Não consegui parar de pensar no que Lucia me contou, eu precisava perguntar a Valentina sobre o seu acidente. Eu não tinha ideia de como seria a sua reação quando eu perguntasse, mas eu precisava saber.

Entrei no banho e ao sair passei o meu perfume favorito, aquele que eu só usava para festas ou ocasiões importantes. Vesti uma blusa mais folgada, penteie os meus cabelos e passei uma leve maquiagem.

Saí da minha casa e peguei o ônibus rumo até a casa da Valentina. Ao chegar, bati na porta e Elena me recebeu.Sua expressão era de angústia, eu franzi o cenho tentando averiguar o que havia acontecido.

-Juliana! _falou preocupada.

-Oi, o que aconteceu?, Ta tudo bem? _perguntei a olhando com cautela.

Elena esfregou o rosto com angústia.

-Eu tirei o banco do lugar pra limpar e esqueci.... foi um acidente e ... _sufocou um soluço e eu esperei pela continuação.
-...ela caiu e o seu nariz sangrou, e eu....

Não pude continuar ouvindo e subi as escadas rapidamente, eu precisava ouvir o que aconteceu da boca da Valentina, precisava ter certeza de que ela estava bem. Movi a maçaneta da porta tentando abri-la mas estava trancada.

Bati na porta com desespero mas ela não abriu.

-Valentina, abre a porta!. _falei começando a me sentir mais ansiosa do que o normal.

-ME DEIXA AQUI! _gritou furiosa de dentro do quarto. _eu dei um pulo para trás ao escutá-la falar assim.

-Valentina, por favor... _eu não poderia desistir tão fácil.

Não se parecia em nada com a Valentina que havia estado comigo no dia anterior.

-POR QUE VOCÊ NÃO ENTENDE QUE QUERO QUE VOCÊ ME DEIXE AQUI?, VOCÊ JÁ ME MOSTROU O SEU PONTO, JÁ TENTOU ME AJUDAR!. SOU UMA MALDITA INÚTIL, AGORA VÁ EMBORA DAQUI!.

Meu coração começou a bater mais forte dentro do peito, Elena estava ao meu lado e a olhei.

-Você tem outra chave dessa porta? _perguntei.

Ela me olhou com dúvida mas me entregou um molho de chaves.

-É a chave prateada. _indicou.

Peguei a chave prateada e a coloquei na fechadura. Quando abri a porta precisei fecha-lá rapidamente porque um sapato saiu voando na minha direção. A batida do sapato na porta me fez voltar e dar um grito. Se eu não tivesse reagido rápido, aquele sapato teria acertado o meu rosto.

-QUAL O SEU PROBLEMA?! _GRITEI NO IMPULSO DO MOMENTO.

Ela não respondeu nada.

-Você pode tacar o que quiser, eu não vou embora! _falei enfurecida.

Entrei no quarto e outro sapato voou na minha direção, me abaixei a tempo para me esquivar dele.

-PARE DE AGIR COMO SE TIVESSE CINCO ANOS!. _gritei em sua direção.

-NINGUÉM TE PEDIU PARA ENTRAR! ME DEIXA EM PAZ DE UMA VEZ! _gritou enfurecida.

-VOCÊ É UMA IMBECIL! _gritei como se fossemos duas crianças.

O silêncio invadiu o quarto. Meu peito subia e descia no ritmo pesado da minha respiração. Eu estava furiosa, completamente e absolutamente furiosa.

-Você chamou uma cega de imbecil? _ela falou como se o fato dela ser cega fizesse com que eu me arrependesse das minhas palavras.

-Chamei de imbecil uma imbecil! _eu ri amargamente.

Pude ver o seu corpo se tensionar com a raiva que sentia, mas não me importava. Eu só tentava ajuda-la e ela se comportava como se eu fosse a culpada pelos seus problemas.

-Saía do meu quarto! _falou com a voz grave e ameaçadora.

-Quero que saiba que eu vou embora, e não vou voltar nunca mais. _falei tentando me acalmar.

-Em primeiro lugar eu nunca pedi que viesse. _falou com amargura.

-Ninguém vai conseguir te ajudar se você não mudar a sua atitude, pare de agir como vitima porque você não é. Devia agradecer por estar viva, o Emiliano Russey não teve a mesma sorte.

-O que... o que você disse? _gaguejou.

E nesse momento eu entendi o que eu havia acabado de fazer e fiquei completamente muda à olhando.

-On...onde você soube do.. do Emiliano? _falou com a voz entrecortada.

Eu não consegui responder.

Se ela pudesse me fuzilar com o olhar teria feito, tenho certeza. Tinha o rosto completamente desolado e apesar de ter o olhar fixo no nada eu podia notar a coragem em seus olhos.

-MALDIÇÃO, JULIANA ME RESPONDE! _gritou em desespero.

Ainda que eu não te veja. G!POnde histórias criam vida. Descubra agora