- Você não se lembra de mim, Laura? -perguntou olhando fixamente em meus olhos. Fiz um esforço pra tentar lembrar daquele garoto, mas só consegui ver imagens embaçadas
Eu estava muito vermelha. olhei pro Alexander procurando uma explicação. Em vão.
- Que bagunça é essa!? -berrou o diretor que vinha muito irritado por causa da baderna causada. Ele nos mandou para nossas devidas salas.
No intervalo da primeira aula, me aproximei lentamente do Alexander, que estava respondendo seu dever de matemática com um rosto muito sério.
- Aquele cara...é mesmo irmão do Ezequiel? Minhas lembranças estão distorcidas, por isso não tenho certeza, e nem posso confirmar que o conheço... Mas você parece conhecê-lo, então... -sussurrei pra não incomodar demais; ele se virou em minha direção com um rosto assustado, como se algum estranho o ameaçasse. Paralisei.
- Ahh... É só você, Laura... Você quer saber do Elios, não é?
"Ele não ouviu nada do que eu disse?"
- Ele é o irmão gêmeo do Zezé. Mas não são idênticos. Não tem como confundi-los de jeito nenhum. -falou me prensando contra sua banca e sussurrando no meu ouvido, me fazendo arrepiar. Ele estava muito estranho... Pus minha mão em seu ombro, tentando não causar a impressão errada para os outros da sala.
- Mas ei... por que o Ezequiel faltou hoje?
Ele deu uma risada, se afastando e olhando pra janela.
- Ele tá gripado. Ontem, quando ele e eu quase brigamos na sua casa, a Mei jogou um copo de água gelada na gente. Ele fica doente fácil.
Estava meio envergonhada. Sentia culpa, de algum modo. Por isso todos estavam quietos quando desci com o saxofone! Então, nesse meu cérebro perturbado, ocorreu uma ideia. Depois do colégio, eu fui numa farmácia, comprar xaropes e panos termais pra febre e gripes.
Eu lembrava onde era o condomínio do Ezequiel. Era apenas uma esquina antes da minha. subi as escadas para a porta com número 30. Era o último quarto de todo o condomínio. Toquei a capaínha, e ouvi passos lentos.
- Quem é?
Me arrepiei toda. estava nervosa.
- So-sou eu! A Laura!
- O que você quer?
Me assustei com o tom da voz, e com a pergunta. Era mesmo o Ezequiel?
- Bem...eu queria fazer uma visita! Podia não ser mal educado e abrir a porta?
...
A porta abriu. ele estava com o cabelo bagunçado e com um olhar cansado.
- Então, você tá mesmo gripado...-falei adimirando o novo estilo do Ezequiel. Sério... só posso ser maluca.
Ele coçou os olhos e me viu com atenção.
- Estou. E eu não quero que você pegue, por isso, vá pra casa!
Apertei a sacola com os remédios atrás de mim e mordi os lábios inferiores. Como ele podia dizer isso? Estava tentando ajudar...
Ele olhou ao redor, e depois olhou pra minhas mãos, que estavam para trás.
- Escuta...-falou coçando sua nuca com o cabelo bagunçado nos olhos. -por que não entra? Toma uma água...sei lá.
Baixei a cabeça, em sinal de respeito, e adentrei olhando ao redor. Era tão grande, mas tão quieto...
- Cadê seus pais?
- Eu moro sozinho.
- Como é!? -me zanguei virando para olhá-lo - Se não tem ninguém, como você espera melhorar?
Ele levantou o rosto significativamente com seus olhos altos e sem vida me avistando, como um falcão a espreita. Obviamente, eu o estava irritando.
Fiquei embaraçada com a situação. Me senti menor do que já sou, afinal, eu estava na casa dele.
- Olha...eu trouxe uns comprimidos de gripe pra você... -falei mostrando a sacola, olhando pro chão, sem coragem de levantar o rosto. Me virei lentamente e avistei uma porta.
-Sua cozinha é ali, certo?
- Ei espera... -falou me seguindo. Coloquei um avental que havia achado em algum lugar.
- COM LINCENÇA!! -gritei.
Abri a geladeira na tora e peguei alguns ingredientes. Meia hora depois, fui ao seu encontro com uma tigela grande.
- Já que você não sabe se cuidar, eu vou fazer isso!
Sentei ao seu lado com a tigela de sopa de legumes que eu mesma tinha feito. Ele estava deitado no sofá olhando pro teto. Toquei seu pescoço pra ter certeza de que não estava morto.
- Toma. Você precisa tomar. -falei, estendendo a colher e a tigela pra ele. Ele virou o rosto em minha direção.
- Meus braços estão muito pesados.
Recuou seu rosto. Eu fiquei encarando a sopa.
- E agora...você precisa comer algo...
- Talvez...-sussurrou- Talvez, você possa me dar na boca.
Fiquei vermelha com a sujestão. Ele estava com o rosto virado pra mim, e me encarava como nunca ninguem havia me encarado antes. Como se esperasse algo de mim... Segurei a colher com a mão direita. Tentei erguê-la, mas a colher parecia ter uns duzentos quilos. Seu cabelo bagunçado cobria um pouco de sua testa, seus olhos agora pareciam compreensivos e sua boca estava entreaberta. foi a primeira vez que eu sentira algo do gênero. Meu coração parecia um trem, de tão forte e rapido que pulsava. Minhas mãos e meus lábios tremiam, como se eu fosse ser atacada por uma fera a qualquer momento. Se bem que esse podia ser o caso.
- Ué? Está vermelha! -falou colocando sua mão infervecente em meu rosto gélido, me fazendo arrepiar dos pés a cabeça. Ele continuava a falar algo, mas meus pensamentos estavam longe. Foi então que eu notei minha situação. Eu já tinha visto isso num filme: A mocinha leva remédios para o mocinho doente, mas ele mora sozinho. Ela faz comida e cuida dele. Durante esse momento, pinta um clima e eles acabam ficando juntos pelo resto da noite. Eu estava em perigo se isso acontesse comigo. Como eu pensava... Eu era burra demais!
-...Será que pegou minha gripe...? -ouvi Ezequiel falando, trazendo-me a realidade. Peguei a colher e a tigela com rigidez, fechei os olhos, e intupi a boca dele com a minha sopa, ignorando completamente o que ele reclamava. Apenas o alimentei e fui embora nas pressas. Me arrependi depois, quando cheguei em casa. Ainda estava preocupada. Ele tomaria os remédios? Depois de um banho relaxante, me deitei pra pensar melhor. Pensei tanto, tanto, tanto... que acabei adormecendo com seu nome em meus lábios.
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Laura Saraiva
RandomLaura é uma adolescente normal de 15 anos que perde sua família, após um crime gravíssimo cometido pelo seu irmão mais velho. Agora ela mora com seu primo e vai ao colégio normalmente, porém, ela se esconde do assassino que anseia terminar seu traba...