Capítulo 4

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Como eu tinha encorajado o jovem a formular perguntas, nada impediria que ele continuasse a fazer isso até o final da viagem. Decidi então que, como a estreada era linda e monótona, aquela conversa singular poderia ser uma fonte de entretenimento se, em vez de considerar as perguntas uma espécie de interrogatório,eu conseguisse transformá - las em um divertido jogo intelectual.

Curiosamente, essa mudança de percepção fez minha fadiga desaparecer como que por mágica, e me vi esperto e alerta, disposto a deixar minha imaginação perambular à vontade.

- Você disse - prosseguiu o jovem, recostando-se no assento - que só a chave não é suficiente, que temos de encontrar o método correto para usá-la. Como vou descobrir esse método?

- Sim realmente - comecei, com renovada energia, enfatizando minhas palavras com um gesto de mão. - O melhor método ou sistema para resolver um problema é não considerá-lo um problema, apenas uma dificuldade ou um desafio Claro que o obstáculo continua o mesmo, mas agora é visto com uma conotação positiva. Você deve agradecer à Providência por encontrar dificuldades de vez enquanto.

- Agradecer pelas dificuldades? - perguntou o jovem incrédulo.

- Sim, pois isso lhe permite crescer e galgar o caminho da perfeição. Se os obstáculos em nossa vida forem vistos sob essa luz favorável, você perderá menos tempo reclamando deles e levará uma vida mais plena.

Como o jovem estava prestando atenção, prossegui.

- Outra coisa que você pode fazer, quando encontrar a dificuldade, é reconhecer que ela existe e observá-la sob diferentes ângulos; ou então dividi-la em partes menores, em dificuldades menores.

 O jovem assentiu pensativamente e disse:

- Eu fui obrigado a solucionar em partes uma grande dificuldade.

- Que dificuldade?

- Seria impossível chegar à Terra de uma vez só...

Achei difícil manter a boca fechada enquanto ele continuava:

- Foi por isso que tive de dividir a distância e fazer sete paradas em sete asteroides.

Concluí que, mesmo que tivesse perdido o juízo, aquele garoto demonstrava uma imaginação fértil.

Após um momento de silêncio, durante o qual apareceu perdido em lembranças, ele disse:

- Em minhas viagens, encontrei alguém que tinha um problema sem solução.

- Ah, é? - comentei distraidamente.

- Era um homem que bebia para esquecer.

- Para esquecer o quê?

- Que estava cheio de vergonha e sentimentos de culpa.

- Por quê? -perguntei.

- Porque bebia - respondeu o jovem, fechando aquele intrigante círculo.

- O sentimento de culpa - disse eu - nos paralisa e nos impede de resolver muitos problemas. Assumir a responsabilidade o faz desaparecer e nos permite agir de forma mais positiva, compensando ou reparando o prejuízo causado. Ou simplesmente seguindo em frente, sem repetir o comportamento que provocou o sentimento de culpa.

- Mas se você fez alguma coisa errada - retrucou ele - como pode evitar o sentimento de culpa?

- O sentimento de culpa não ajudou o seu bêbado. É uma punição inútil, que esgota as forças dele. O homem só continua se punindo porque parou de amar a si mesmo. Você não lhe perguntou por que ele começou a beber, em primeiro lugar?

O Retorno Do Jovem PríncipeOnde histórias criam vida. Descubra agora