Capítulo 13

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Como já era quase hora do almoço, e também receando que Asas pudesse deixar uma principesca surpresa na capa do meu amigo, decidi para em uma churrascaria que surgiu de repente à direita da estrada.Já havia dois automóveis em seu estacionamento. Ao entrarmos, olhei para uma mesa à qual uma família almoçava e vi cinco crianças de olhos arregalados, estarrecidas com a roupa do Jovem Príncipe. Imediatamente, escolhi uma mesa na extremidade oposta, mas era impossível conter o alvoroço. Era como se um dos Reis Magos tivesse acabado de entrar, sem o camelo.
Perturbado com a reação das crianças, meu amigo sentou-se de costas para os comentários e dedos apontados. A tentativa do pai de acalmar as crianças, sacudindo uma coxa de frango, não se mostrou muito eficaz, já que ele tentava desvendar também o mistério de nossa colorida presença. De costas para nós, a mãe continuou a comer, sem demonstrar menor interesse, como se uma surdez seletiva lhe permitisse ignorar o tumulto das crianças. Minha conversa durante o almoço teve o propósito de fortalecer a autoestima do meu amigo, um tanto afetada pela reação a algo tão longe de seus pensamentos como sua roupa. Falei sobre a importância das diferenças e das mudanças que se processam na uniformidade, o único modo de fazer qualquer grupo evoluir.
- Se as flores não pudessem ser distinguidas por seu perfume, suas formas e suas cores, nós nunca pararíamos para admirar uma delas em particular. A diferença - acrescentei - é a primeira coisa que nos atrai E quando olhamos para determinada flor, nós a tornamos única.

Em minha mente, lamentei que as coisas que nos atraem e complementam sejam às vezes usadas para nos separar e antagonizar. Enquanto atacávamos o suculento bife com fritas e salada, contei ao Jovem Príncipe que muitos dos maiores gênios da humanidade foram marginalizados por seus conterrâneos, pois sem eles nada teria mudado. Critiquei a mediocridade daqueles que, em vez de permitir que uma fagulha criativa se transforme em fogueira, correm para apagá-la, como se fossem uma equipe de bombeiros.

- Meu caro amigo - disse eu, pousando a mão em seu ombro, você deve perdoar o fato de que a primeira reação das pessoas é julgar alguém por seu aspecto externo. Mas se tiver confiança em si mesmo e nos valores em que acredita, elas acabarão aceitando você, nem que seja para contar ao amigos que encontraram alguém muito original.

Recostando-me na cadeira, acrescentei:

- É claro que há um método mais rápido de conhecer pessoas..

- E qual seria? - perguntou o Jovem Principe, mostrando um pouco de animação.

- Fazer exatamente o contrário. Em vez de atrair a atenção delas para seu aspecto externo, para depois tentar fazer com que elas conheçam o que há por dentro, você pode tentar se misturar a elas, imitar a aparência delas, para depois se destacar por seus próprios valores, como alguém único e especial. - expliquei.

- O que você faria? - Perguntou o Jovem Principe, colocando-me na berlinda.

Pensei por alguns instantes e respondi:

- No primeiro caso, as pessoas se aproximam de você, ou mantêm a distância, assumindo atitudes positivas ou negativas a seu respeito com base apenas na aparência, sem o conhecer. A seu favor, você tem vantagem de ter atraído atenção de muita gente; e contra você, a desvantagem de que algumas delas o rejeitarão para sempre. No segundo caso, pelo contrário, você não atrairá muita atenção, e várias pessoas nem notarão sua existência. Se eu tivesse de escolher, acho que ficaria com a segunda opção. Pode ser mais lenta e tranquila, porém é mais profunda. De qualquer forma, é importante não deixar de ser você mesmo para se amoldar ao gosto dos outros.

- Você não se preocupa com a hipótese de que sua mensagem se perca, e que muita gente nem sequer saiba que você veio ao mundo? - Perguntou o Joem Principe.

Presumi que ele estivesse tentando disfarçar o medo de nunca encontrar a pessoa especial que estava procurando. Lembro-me de ter respondido que só acredito na grandeza de alguém se este indivíduo for considerado grande por aqueles que o conhecem na intimidade; pois se você de fato conseguir transmitir alguma coisa importante, mesmo que seja para um pequeno grupo de pessoas ao redor, pode ter certeza que sua luz iluminará as regiões mais sombrias, assim como a luz de uma estrela distante atravessa milhares de anos de escuridão até nos alcançar.

- Tenho certeza de que sempre encontraremos a pessoa para que estamos destinados. - disse eu enfaticamente. - Cabe a nós estarmos preparados para distingui-la das outras.

Foi assim que o Jovem Principe trocou de roupa. Quando saímos da pequena loja ao lado da churrascaria, ele estava usando jeans, camiseta, tênis e um boné virado para trás, sob o qual despontavam algumas mechas do cabelo dourado. Ninguém seria capaz de distingui-lo de centenas de milhares de outros garotos da mesma idade.

- Afinal de contas, você nasce príncipe - disse eu com um sorriso, para que ele se sentisse especial em sua primeira incursão em nosso mundo de maravilhas e misérias.

Mas ele respondeu:

- Meu reino agora só existe dentro de mim. - e se afastou correndo, chutanto uma bola que escapara ao controle de alguns garotos que brincavam na rua, perseguido por Asas, que tentava morder seus calcanhares.

Neste ponto, caro leitor, devo pedir a você e aos amigos do Pequeno Príncipe que por favor perdoem minha intervenção, pois de agora em diante será impossível reconhecê-lo à primeira vista. Mas quem mantiver os olhos de seu coração completamente abertos não terá dificuldade em reconhecê-lo.

O Retorno Do Jovem PríncipeOnde histórias criam vida. Descubra agora