Capítulo 4

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Anthony estava sentado debaixo de uma árvore na floresta de Terrasen, Marion deitada em seu colo, ambos focados em seus livros.

Eram um casal silencioso, diferente de Sam e Orion que não se calavam nem por um segundo. Mari e Thony gostavam do silêncio e apreciavam a companhia um do outro.

Mas neste dia, Mari estava inquieta.

-O que foi, bela? - Thony pergunta, fechando seu livro e encarando os olhos negros da garota.

-Estou preocupada. - ele sabia do que ela estava falando, por isso apenas esperou que Marion continuasse - O tempo está passando, Thony. Cada dia que passa minha mãe está mais perto da morte...

-Não diga isso, Mari! - a repreende - Vamos encontrar uma solução, estamos todos procurando.

-Minha mãe está envelhecendo... - Anthony viu os olhos dela marejarem - Evangeline vai envelhecer, Lysandra vai envelhecer, e nós não fizemos nada pra impedir. - Uma das mãos delicadas limpou uma lágrima que escorria por sua bochecha - É o curso natural, mas não sei se meu pai sobreviveria sem a minha mãe, não sei se eu sobrevivo...

A simples possibilidade de perder Marion fez o coração de Anthony se apertar. Ele também não queria que Elide morresse, gostava muito dela, e também de Evangeline e Lysandra. Sabia que a morte de Evangeline destruiria Kyla.

-Temos o poder da morte, Mari, talvez a gente possa atrasá-la o máximo possível.

-Não podemos atrasar o tempo, elas envelheceriam e...

-Mas atrasando a morte nós podemos conseguir mais tempo para arranjar uma solução.

-Talvez se fossemos atrás do Caldeirão...

-Não. - a interrompeu - O Caldeirão não.

Ele sabia o quanto aquilo tinha ferido sua mãe, sabia que ela tirara algo dele e não sabia se ele reagiria, o que faria, ao tê-lo, filho de Nestha Archeron, tão próximo.

Marion se levantou, deixando o livro de lado e se sentando no colo de Anthony, que segurou suas mãos e beijou o dorso de cada uma.

-Vamos encontrar um jeito. Eu prometo.

Kyla passava boa parte do tempo na biblioteca, procurando uma solução para Evangeline, Lysandra e Elide, mas a biblioteca era enorme e Kyla era uma só.

-Talvez você possa vir para Velaris, - A garota franziu as sobrancelhas e ele acrescentou - procurar algo na biblioteca com Kyla.

-E como as pessoas de Velaris se sentiriam em relação a alguém de outro mundo?

-Desde a minha madrinha eles pararam de se importar.

Um sorriso de lado surgiu em seus lábios ao lembrar de uma Rainha Valg que vivia em Velaris com o marido e os dois filhos, em breve três.

-Além do mais, - continuou - Sam e Evangeline estão sempre por lá.

-Tudo bem. - Marion respondeu - Vou com você para Velaris.

Por mais que fossem motivos sérios e preocupantes, Anthony não conseguiu conter sua animação. Marion iria para Velaris, sua parceira conheceria sua cidade.

-A biblioteca é enorme, com livros mais antigos que o seu pai.

Mari não conseguiu segurar uma risadinha, era bom vê-la sorrindo.

-Adoraria que dissesse uma coisa dessas na frente do meu pai.

-Garanto que não teria dificuldade nenhuma, afinal... - ele deixou que ela visse o sorriso convencido que curvou seus lábios - Sou filho de Cassian e Nestha Archeron, bela.

Ela riu outra vez e dessa vez ele se juntou a ela.

-É errado dizer que eu queria muito ver os dois se enfrentarem? - perguntou.

-Talvez Rhys e Lucy possam mostrar pra gente.

-Eu adoraria.

-Então está decidido.

Por alguns segundos os dois apenas se encararam. Mari suspirou e Thony notou o brilho de esperança em seus olhos.

-Elas vão ficar bem. - Ele segurou seu rosto com as duas mãos - Vamos encontrar uma saída.

E então o brilho desapareceu e um cinco de preocupação surgiu entre suas sobrancelhas.

-Vai mesmo participar do rito de sangue?

-Mari...

-Isso é horrível, Anthony! Ninguém devia passar por uma coisa dessas.

-Mas nós passamos! Sou parte illyriano, Marion, e isso é comum entre nosso povo.

O rito de sangue era o tema da discussão frequente tanto com Marion quanto com seus pais.

Nestha não queria que o filho passasse pelo banho de sangue e Cassian insistia que aquilo não era necessário, ambos preocupados com Anthony. Mas ele queria provar seu valer àquele povo, queria ser como o pai, mesmo que Cassian jamais exigisse nada do filho.

-Vou ficar bem. - disse - Orion já passou e venceu seu rito de sangue, Ben vai estar comigo também.

-Se você morrer, - a voz de Marion tornou-se áspera - vou fazer questão de garantir que esteja sofrendo onde quer que esteja.

Anthony riu, gargalhou. Adorava quando ela o ameaçava, tinha puxado isso do pai.

-Fique tranquila, bela. Não vou morrer, vamos vencer.

Anthony e Benjamin estavam treinando todos os dias para o rito, junto com os outros ou separados, com o trio illyriano ou com suas mães. Nos dias raros eles treinavam no acampamento illyriano, quase sempre alguma confusão acontecia nesses dias.

Os illyrianos não gostavam de seus pais e, consequentemente, não gostavam deles também. Anthony era filho do príncipe dos bastardos com a morte, já Benjamin era filho da rainha dos demônios com o bastardo encantador de sombras. Motivos suficientes para qualquer um ali os odiar.

Marion bufou, frustada.

-Você é um cabeça dura!

-Eu sou é? - ele deixou a malícia se enrolar em suas palavras.

-E um pervertido também!

As bochechas dela assumiram a coloração rosada que ele tanto gostava e seus dedos subiram para acariciá-las.

-Não posso evitar, bela, são as minhas origens.

Ela tentou, e falhou, segurar o riso. Já tinha visto incontáveis vezes Nestha brigar com Cassian por algo incoveniente que saía de sua boca.

Anthony celou a testa de Marion com os lábios, fechando os olhos e aproveitando de seu perfume natural. Ela tinha cheiro de bolinhos de canela, e ele amava isso.

-Não tem com o que se preocupar, - disse - vou ficar bem, todos nós vamos.

-Prometa para mim, Anthony. - sua voz saíu como um sussurro e apertou o coração do garoto.

-Eu prometo, meu amor. - ele sussurrou, se afastando para beijar as bochechas e os lábios da garota.

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