Cap 15 - Precisamos conversar

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     Na manhã seguinte, Louis acordou bem cedo, cerca de 6h e logo desceu. Precisava comer logo, tinha uma pessoa que precisava ver. Na cozinha, Edith cumprimentou-o, sem muitas delongas, preparando a mesa de jantar com o café da manhã do ator:
     - Muito obrigado, Edith. Mas sente, coma comigo.
     - Não será necessário, menino, eu já tomei café. Mas obrigada por convidar.
     - Só como sozinho há uns dois dias, mas parecem 20 anos...
     - Você irá - ela limpa a garganta, como um gesto de tornar a conclusão da fala menos indelicada - visitar o menino Ash hoje, certo?
     - Certamente que sim. Vou me arrumar para poder revê-lo, preciso explicar o que aconteceu e pedir desculpas.
     - Pedir desculpas? - Edith colocou uma mão na cintura - Mas o que você fez de errado?
     - Ao invés de deixar ele ficar calmo e depois falar, eu lavei minhas mãos precipitadamente. Esse descaso foi o que motivou ele a ir embora.
     - Entendi... Bem, faça o que achar melhor, querido. Agora, coma bem.
     Terminado o café, Louis subiu para se arrumar. Colocando uma camisa social e um colete por cima, calça e sapatos fechados.
      Na mansão Myles, Ash ainda estava dormindo. Iria acordar lá para as 8h, diferente de sua mãe, que parecia ser filha de vigilantes. Acordava cedo e supervisionava a casa inteira. O soar da campainha ecoou pela sala, e uma empregada atendeu:
     - Bom dia, senhor Daves!
     - Bom dia. Eu gostaria de ver o senhor Myles.
     - Ah, mil perdões, senhor, mas o patrão ainda não levantou.
     - Nossa, ele realmente não deixou de ser um tanto preguiçoso - Louis zombou, colocando as mãos em sua cintura - Sabia que ele sempre dorme demais? Sempre, sempre.
     A empregada conteve uma risada colocando a mão nos lábios. Louis continuou conversando com ela, o que chamou a atenção de Vivian. O toque daqueles saltos caros veio anunciando sua chegada. E antes que a pobre empregada pudesse retomar sua pose de funcionária, Vivian já estava em pé, atrás da moça:
     - Flora.
     - Oh, senhora! - a empregada afasta-se da porta, indo para o lado da patroa, juntando as mãos atrás das costas.
     - Já falamos sobre você recepcionar visitas, é uma tarefa da dona da casa. Você apenas recebe, pede para esperar e vai até mim ou meu filho, avisar que há alguém.
     - Sim, senhora. Eu sei disso, me perdoe.
     - Agora vá, eu mesma falo com senhor Daves.
     - Agora mesmo, senhora Myles.
     A empregada saiu, fazendo uma reverência e depois sumiu mansão a dentro. Louis, que continuava parado à porta, olhou para a mãe de Ash, esperando que ela o cumprimentasse. Vivian virou-se para o ator e, pondo sua máscara de anfitriã, disse:
     - Desculpe por isso, ela não sabe quando parar de falar, às vezes.
     - Está tudo bem - disse Louis - Fui eu que começou a conversa, eu sinto muito.
     - Não se preocupe, mas entre, por favor.
     - Obrigado, com licença.
     - Está muito formal, Louis, parece que não conheço você desde criança. - Disse Vivian.
     - Ora, tia Vivian...
     - Sem o "tia", eu ainda sou muito jovem para esse termo.
     - Tudo bem, - Louis sorriu, colocando as mãos no bolso - Vivian.
     - Melhorou. Mas diga-me, o que trouxe você aqui?
     - É... Então, eu vim ver o cabeça de tomate.
     Nesse momento, Ash acorda. Ele lava seu rosto, escova-se mas ainda não toma banho. "Primeiro, eu vou comer. Por Deus, parece que eu dormi sem jantar...", pensou. Saindo do corredor, ele ouviu a voz de Louis e sua mãe. Parou perto do corrimão para ouvi-los. Eles falavam da forma mais educada e casual possível.
     Quando Louis disse que queria ver Ash, Vivian sentou-se no sofá e tocou um sininho. Flora apareceu novamente, e a senhora disse:
     - Flora, querida, traga para mim um café. Aceita Louis?
     - Ah, sim, por favor.
     Com uma investida de gentileza, a empregada oferece biscoitos, leite ou torradas. Vivian lança uma resposta certeira "apenas o que eu pedi" e Flora se retira. Vivian circula a mesa de centro, sentando no sofá, Louis faz o mesmo. Eles ficam em silêncio, até a mocinha trazer o café.
     Vivian sopra levemente e toma um gole raso. Segurando a xícara com suas duas mãos, ela volta a falar:
     - Então, Daves. Você disse que veio ver meu filho.
     - Sim, Vivian. - Louis toma um gole do café e põe a xícara na bandeja - Acredito que seja necessário.
     - E eu posso saber o motivo?
     - Acho que pode, sim. Nós dois passamos a infância e adolescência juntos, depois ficamos afastados novamente.
     - Sim, eu sei disso.
     - Pois bem, quando ele foi morar comigo, voltamos a conviver e a nossa... Amizade, ela ficou ainda mais sólida. Enfim, acabamos por ter um desentendimento, que acredito que tenha sido o gatilho para que ele fosse embora magoado comigo.
     - Sim, ele realmente está muito zangado. Mas o que aconteceu?
     - Foi uma coisa pouco pessoal e íntima, prefiro evitar detalhes.
     - Tem a ver com mulheres?
     Louis engoliu seco, olhando para a mulher em sua frente. Como ela pode ter dado um palpite tão certeiro? Se é que foi palpite... Ash já falou com ela? Todas essas dúvidas passaram pela cabeça do ator em uma fração de segundos. Mas, sem mais nem um pingo de receio, decidiu ser completamente honesto.
     - Vivian, vou pôr as cartas na mesa com você.
     - Agradeço. Continue.
     - Essas semanas que passei com Ash foram reveladoras demais para mim.
     - Seja mais específico.
     - Nós acabamos por... Nos envolver. Intimamente falando.
     - Entendo. E então?
     - Você está de bem com isso?
     - Termine, eu falo depois.
     - Certo. Eu fui assediado por uma das minhas colegas de trabalho. - ao dizer isso, Ash suspira de surpresa. Mas, ainda descrente, volta com sua carranca - Ela tentou me beijar, e eu cheguei a agarrar a cintura dela - com essa resposta, a carranca veio de Vivian - Mas foi apenas para empurrá-la. Ela saiu do meu camarim chorando mas por eu ter rejeitado. Entretanto, Ash viu a cena, e não permitiu que eu explicasse.
     - E então - respondeu Vivian - você decidiu vir aqui para tentar conversar com ele.
     - Exato. Eu posso vê-lo?
     - Não.
     - O-o que?
     Ash ficou chocado com a resposta de sua mãe. "Como assim não? Por quê não?".
     - Você, Louis, realmente pensa que isso é uma explicação convincente?
     - Eu estou na esperança de que Ash acredite em mim. Só não entendo o motivo de eu não poder falar com ele.
     - Simples. Você fez o meu menino de sua mulher...
     - E-ele... Ele falou isso?
     - Sim. Você e ele foram um casal de sodomitas que comprometeu o meu filho a uma vergonha. Por quê ele teve que ser a mulher?
     - É com isso que está preocupada? Ele decidiu que queria assim!
     - Minha preocupação, além desta, é que, além do corpo do meu filho, você abusou do coração dele.
     - Ei, eu não abusei do corpo dele. Foi totalmente consensual! - revoltado, Louis levanta bruscamente, batendo o joelho na bandeja aonde estava seu café, quebrando a xícara - ASH?! ASH, VOCÊ ESTÁ EM CASA?
     - NÃO GRITE, VOCÊ ESTÁ EM MINHA CASA, SEU VAGABUNDO, PROMÍSCUO!
     - Não sabe o que está dizendo, Vivian!
     - Sei, sim! Você, com essa sua personalidade pervertida, corrompeu e machucou o meu amado menino. Se já não fosse suficiente você se trocar com tantas mulheres, agora homens. E inicialmente, o meu Ashton? Por quê não estragou a vida de outra pessoa?
     - Eu não estraguei a vida dele, eu estaria estragando a minha, se não viesse aqui para resolver isso!
     - Estragando? Ah, claro. E como?
     - Eu estou apaixonado pelo Ash, Vivian. Minha casa parece maior do que a cidade sem ele lá, comigo.
     - Ah, claro que sim. E só agora você se dá conta do grande homem que ele é?
     - Eu sempre soube, só não o via como agora vejo, com mais... Amor, ternura.
     - Não acredito em você.
     - Mas eu acredito!
     Ambos olharam para a escadaria, e viram Ash, agarrando o corrimão. Louis sorriu, com seus olhos brilhando, falando por si só. Ash desceu as escadas rapidamente e antes que pudesse chegar perto, Vivian gritou:
     - ASHTON, FIQUE AI MESMO!
     - Ahn? - Ash parou, confuso - O que?
     - Não chegue perto desse imundo. - disse ela, virando para Louis, concluiu - E você, saia imediatamente da minha casa!
     - Eu não vou sair daqui sem antes falar com ele! - respondeu Louis.
     - Ah, você vai sair sim. SEGURANÇAS!
     Dois homens enormes chegaram ao lado de Louis, segurando cada um, cada braço do ator. Vendo aquilo, Ash disse:
     - NÃO! Não encostem nele!
     Confusos, os homens soltaram Louis, e Vivian mandou eles segurarem o ator novamente. Nessa discussão, ela disse:
      - Eu sou a dona desta casa, pago vocês para obedecerem a mim! Então, façam o que eu falei e tirem esse homem da minha casa!
     Acatando as ordens, os dois seguranças levaram Louis para fora. Ash, revoltado, tentou correr atrás deles, mas foi impedido por sua mãe, que segurou em seu peito.
     - Mamãe, o que está fazendo? Não ouviu ele? É comigo que ele quer conversar!
     - Eu sei, mas eu não vou deixar ele envenenar sua cabeça com aquela ladainha de amor.
     - Ladainha, mãe? E se for tudo verdade? Eu preciso ouvir o que ele tem a dizer!
     - Você sabe que é tudo mentira, se não, por quê ele não quis explicar tudo antes de você ir embora da casa dele?
     - B-bem... Eu não sei, mas agora ele quer conversar.
     - Ele devia ter vindo atrás de você ontem ou sequer ter deixado você sair sem explicações. Não percebe? Ele vir só depois que você decidiu ir embora só reforça a ideia de que ele estava usando você, meu filho!
      - Mas mãe...
      - Mas nada, Ashton. Você não vai ver o Louis nunca mais!
     Confuso, sem saber que decisão tomar, a ideia de "nunca mais ver Louis" martelou muito forte na cabeça de Ash. E o que faria, se não pudesse ver ele outra vez? Continuar trabalhando muito, se envolvendo com pessoas estranhas ou se submeter a outro casamento planejado pela sua mãe? Que cor teria viver desse jeito?
      Sem ter que esperar mais, Ash segurou a mão de sua mãe, olhando bem para ela:
      - Tem razão, mamãe. Ele iria me usar.
     - Viu, só? Eu sei o que digo.
     - Sim. Mas...
     - Mas? Mas o que?
     - Mas... Se for para ser usado, que seja apenas por ele.
     - Como é que é?
     - Desculpe, mãe. - dizendo isso, Ash largou a mão de Vivian e saiu correndo.
     Lá fora, Louis gritava com os seguranças, pedindo para soltarem ele. Quando, de repente, o pianista segura o ombro de um dos seguranças e diz "soltem o rapaz".
      - Mas, senhor, a senhora Myles disse que...
     - Eu mando mais do que ela, minha mãe está gagá demais para comandar algo. Façam o que eu falei.
     Obedecendo, os seguranças largaram os braços do ator e saíram.
     Envergonhado, Ash faz uma reverência e pede desculpas por aquilo, em nome da mãe dele. Louis não diz nada, apenas alisa suas roupas e olha para o ruivo.
     - Louis, eu ouvi o que você disse para minha mãe.
     - Ouviu? Tudo?
     - Cada detalhe.
     - Até a parte em que eu falei que a Denise...
     - Literalmente, tudo o que você disse para ela.
     - Mas ainda acho que devo explicações.
     - Seja o que for que você vai dizer, eu vou ouvir. Tudo. - Aquilo fez Louis sorrir, cheio de esperança. Ash também sorriu, e olhou para o ator, atentamente.
     - Eu sei que somos diferentes, um pouco demais. Só que... eu não aguento mais, Ash. Eu sinto muito a sua falta. Minha casa ficou tão grande e vazia sem você por lá.
     - Posso entender como é isso.
     - Sem seus fios vermelhos, trazendo mais cor para qualquer ambiente. Sem a sua música, enchendo minha casa de alegria. Tudo parece cinza e tom pastel, morto, até mais frio faz.
     - Louis...
     - Por favor, me desculpe pela Denise. Você nunca deveria ter visto aquilo, foi nojento e ridículo. Você é a única pessoa que eu quero que me beije. A sua cintura é a única que eu quero apertar, e não para empurrar você, mas para trazê-lo para mais perto de mim. - Ouvir aquilo fez Ash corar seu rosto, e Louis terminou - eu quero ficar com você. Para todo o tempo que você quiser ficar comigo. De verdade.
     - O que?
     - Isso o que você ouviu.
     Ash sente o canto de seus olhos ficarem quentes, estão marejados. Louis apenas sorri e abre os braços para o ruivo, que não hesita e nem demora para abraçá-lo. Louis beija suas lágrimas, alisando os cabelos de fogo de seu amor.

 Louis beija suas lágrimas, alisando os cabelos de fogo de seu amor

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     - Volta para casa comigo, por favor. - cochichou Louis.
     - É claro que volto.

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