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TZUYU NÃO ESTAVA ACOSTUMADA a ser confinada a lugares pequenos. O armário a sufocava. O próprio navio era como uma jaula da qual não podia escapar.

Como Sana aguentava viver a bordo daquelas coisas? A comandante estava acostumada a correr pelas trilhas através da Fenda com Asha. A perambular pelo palácio e pela cidade. A treinar com seus soldats.
Por toda a sua vida, Tzuyu precisara se mover e se manter forte, para sua própria sobrevivência.
Ficar confinada a deixava nervosa.

Então, aproveitando que Sana dormia, ela fazia flexões, concentrada. Enquanto seu torso subia e descia, com seus músculos ardendo devido ao esforço, ela pensou num plano.

Podia sentir pena daquela garota, com suas mãos trancadas em algemas corrosivas, mas tratava-se de uma criminosa. No dia anterior ela tinha instruído os homens de Jemsin a torturá-la para obter informações. Assim que soubesse onde a namsara estava, Sana ia calá-la e levá-la até Jemsin. Tzuyu  não podia deixar aquilo acontecer. O mais seguro era entregar Sana à imperatriz, que decidiria o que fazer com ela.
Kor estava prestes a fazer aquilo. Era do interesse de Tzuyu , portanto, escapar assim que possível, deixando a Dançarina da Morte com os piratas.
Mas, embora seus propósitos pudessem estar temporariamente alinhados com os de Kor, Tzuyu tinha visto seu olhar cruel. E ele não hesitaria em exercitar aquela crueldade em Sana na próxima vez que a tivesse só para si. A comandante podia até querer ver a ladra trancafiada, mas não desejava que fosse ferida. Escapar seria deixá-la completamente à mercê de Kor.
E ainda havia a questão daquelas estranhas algemas. E se Kor não entregasse Sana a tempo e ela perdesse as mãos?

Tzuyu estava em um dilema.

No final das contas, decidiu levar Sana consigo. Tinha visto mapas das ilhas da Estrela quando a imperatriz convidara Dax para visitá-la. Depois que conseguisse se orientar, ela iria até a capital, entregaria Sana e encontraria Asha.
Tudo o que precisava fazer era se manter alerta e viva. Seguiria o jogo. Seria uma prisioneira boa e obediente. Assim que a oportunidade de escapar surgisse, aproveitaria.

Sana acordou, endireitando-se num sobressalto e quebrando a concentração de Tzuyu. A comandante caiu no chão e respirou fundo enquanto seus músculos relaxavam.

Você ouviu isso?

Tzuyu observou Sana do chão, deitada com a bochecha quente pressionada contra as tábuas de madeira.

O quê?
— Espíritos do mar. Estão cantando.
— Sana levantou e começou a andar de um lado para o outro. — Droga.

Tzuyu levantou, observando-a. Tentando ouvir o que a outra ouvia. Mas os únicos sons que havia eram os uivos do vento e os rangidos do navio.

Com os punhos unidos, Sana bateu na porta, gritando para alguém abri-la. Quando ninguém veio, ela gritou mais.

Escutem, seus idiotas! Ele está nos levando diretamente para o cemitério de navios! Me deixem sair!

Ao entender que ninguém responderia, ela começou a chutar a porta com força.

Finalmente, alguém abriu. O próprio Kor estava de pé na entrada.
Sana se encolheu, com as bochechas rosadas e a respiração pesada. Tzuyu ficou de pé atrás dela.

Aquela terra diretamente à frente é a ilha das Sombras — Sana disse a ele. — É conhecida por seu cemitério de navios. Parece ser um atalho para Eixo, mas na verdade…
— Você é uma ladra, não uma maruja — ele disse, rosnando. — Deixe a navegação comigo.
— Tem espíritos à frente, esperando por idiotas como você!

Os olhos dele se estreitaram quase até fechar.

Espíritos do mar não existem. São histórias criadas por marujos delirando por causa do escorbuto. E quem disse que estou levando você para Eixo?

the weaver of heaven - SatzuOnde histórias criam vida. Descubra agora