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SANA NÃO PRETENDIA se enfiar no meio da multidão. Queria ficar pelas sombras, esperando o momento perfeito em que Tzuyu estivesse sozinha.

Mas quando a comandante entrou no salão, Sana viu uma pessoa diferente.

Em um instante, Tzuyu não era mais a prima do rei. Não era mais a comandante do seu exército. De alguma forma, o salão a transformou em alguém menor, perdida e solitária.

Sana não se conteve.

Então, tola como era, foi direto falar com ela.
Seu corpo todo estava inquieto. Suas mãos estavam escorregadias de suor. Mas ao ouvir aquelas palavras — Você enlouqueceu? — o medo foi todo embora.

Tzuyu não ia alertá-los de que estava ali.

Por quê? O que havia mudado?

Ela deixou a dúvida para depois. Pressionando firmemente sua mão livre na cintura de Tzuyu, Sana a conduziu para o ponto mais distante do salão inutilmente grande, depois a empurrou para o meio das cortinas douradas exuberantes nas varandas.

A ladra fechou a cortina, bloqueando o campo de visão. A névoa ao redor delas era espessa.

Tzuyu virou para encará-la. Só de vê-la, o coração de Sana bateu duas vezes mais rápido.

A comandante estava com o vestido azul que ela havia deixado em seu quarto. Seu cabelo azulado tinha sido enrolado com o nó habitual, preso no lugar por uma faca. O tom do vestido combinava perfeitamente com seus olhos.

Ela matou todos — Tzuyu disse de uma vez.

Sana foi pega de surpresa. Não era o que imaginava ouvir.

Quem?
— Kor. Rain. Lila. — Tzuyu fechou as mãos ao lado do corpo, como se somente agora considerasse o significado do que dizia. — Ela executou todos eles.

Sana ainda não havia processado o fato.

A ideia de Kor e os demais estarem mortos quando estavam vivos um dia antes… não fazia sentido. E então, quando fez, ela não soube o que pensar. Odiava Kor, sem dúvida. Ela o havia esfaqueado e tacado fogo no seu barco. Mas tinha feito aquilo porque estava com raiva e cansada dos abusos, não porque quisesse matá-lo. Se pretendesse fazê-lo, teria trancafiado o homem dentro da sala em chamas.

Sana não o queria morto. Nem ele nem os outros.

Tem certeza?

Tzuyu se virou, olhando por cima da sacada para a cidade coberta pela névoa.

Não vi com meus próprios olhos — a comandante disse, abraçando o próprio corpo. — Mas foi o que ela me falou: piratas não têm direito a julgamentos.

Sana a observou, incerta do que dizer. Não estava surpresa com aquilo. Mas Tzuyu estava.

Por que está aqui? — a comandante sussurrou, sua voz soando fraca.

Sana se aproximou da balaustrada.

Sei para que Jemsin quer a sua prima.

Tzuyu se virou, com seus olhos duros como joias.

E?

Pelas marés, seria tão mais fácil se ela não fosse assim bonita.

Sana afastou o pensamento, precisava se concentrar. Estava dentro do território inimigo agora.
Precisava se manter alerta.

A imperatriz fez um acordo com ele: vai lhe dar passe livre para as águas do seu território se entregar Asha.

As sobrancelhas escuras de Tzuyu se uniram numa expressão descrente.

Tem alguma prova disso?
— Não exatamente. — Sana olhou para as botas roubadas. — Não.
Então devo confiar na sua palavra?
— Sim.
— Mas isso não faz nenhum sentido — Tzuyu murmurou, olhando para a névoa. — O que ela quer com minha prima?
— Não faço a menor ideia. Mas se a imperatriz está fazendo acordos com piratas para conseguir a namsara, não pode ser boa coisa.

Tzuyu estudou Sana por alguns segundos.

Isso significa que você não vai caçar Asha?

Sana ergueu os olhos.

O quê?
— Se a imperatriz quer minha prima — disse Tzuyu, cruzando os braços com firmeza diante do peito — e você acha que a mulher é um monstro, o certo seria você decidir não cumprir seu trato com Jemsin.

Sana se aproximou, mantendo a voz baixa para falar:

Se eu não entregar sua preciosa prima para Jemsin, eu é que serei entregue ao monstro. — Ela balançou a cabeça. — Você não entende? Leandra será tão impiedosa comigo quanto foi com Kor. Se não me matar… — Sana tocou o fuso enfiado em seu cinto roubado, pensando de repente em Day.
Na lâmina transpassada em seu peito. — Ela vai me fazer desejar estar morta.
— Entendo — disse Tzuyu, firme. — Então veio aqui para dizer que uma vilã quer minha prima, por um motivo que desconhece, mas que acha que deve ser sinistro o bastante para valer um alerta. — Os olhos de Tzuyu eram como chamas brilhantes enquanto perfuravam Sana. — Só que não vai parar de caçar Asha como se ela fosse uma presa para entregá-la a essa mesma vilã. — Seu tom de voz estava subindo.
O ar pareceu esquentar com sua raiva.
Entendi direito?

Sana olhou para ela.

Não ouviu o que eu falei? Se eu não fizer o que Jemsin quer, sou eu quem vou morrer.

Tzuyu curvou a boca em desprezo.

Talvez seja o fim que você mereça.

Sana recuou, ofendida.

Você é uma criminosa, Sana. Uma ladra. Uma pirata. Uma assassina. — Sua voz ficava mais áspera.
Onde antes havia hesitação, agora existia determinação. — O mundo precisa ser protegido de gente como você.

Sana olhou para ela.

Eu nunca matei ninguém.
— É o que você diz. — Tzuyu empinou o nariz, com os olhos brilhando. — Cadê a prova?

O que mais doía não era Tzuyu não acreditar em Sana. Era o fato de não se importar com o que ia acontecer com ela.

É claro que ela não se importa, pensou Sana, deixando a faca roubada de Tzuyu na balaustrada antes de partir.

Ninguém nunca se importou com o que acontecia com Sana.

Porque ela não importava.

the weaver of heaven - SatzuOnde histórias criam vida. Descubra agora