Capítulo 1

428 63 10
                                    

A figura pálida e cansada no espelho me encarou de volta zombando de mim. Quilos de maquiagem cobriam perfeitamente as olheiras de mais uma noite mal dormida. O que eu podia dizer? Brigite era muito boa com maquiagens, ela dizia que era um dom. Nesse caso, eu tinha que concordar, nem eu teria feito melhor.

Respirei fundo e liguei a torneira. Um fio de água escapou antes que eu enfiasse a mão, levemente trêmula debaixo, molhando o pulso e a ponta dos dedos. Levei a mão à nuca e massageei a área bem devagar. A sensação refrescante era reconfortante, e, embora não fosse me servir de muita coisa, já era um alento.

Três batidas na porta e eu estava de volta ao mundo real. Encarei meu rosto novamente no espelho, me sentindo mais recomposta, ao menos tentei me convencer de que estava. Uma mentira, mas era melhor do que nada.

— Nora! — Era minha assistente pessoal Brigite, Bri para os íntimos. Uma sugestão de Nicol, quando ela mesma não dispensava a ajuda de uma assistente, para auxiliá-la nos afazeres reais que demandavam tanto trabalho. Eu concordava, embora tivesse tacitamente tentado recusar quando minha irmã tinha praticamente me empurrado Brigite. Eu teria discutido, porém, precisei admitir que Brigite oferecia muito mais que uma assistente eficiente. — Você está bem? — Havia um leve tom de preocupação em sua voz.

— Estou... — respondi de imediato tentando soar o mais natural possível. Umedeci os lábios secos, os olhos indo direto para o reflexo no espelho mais uma vez. Precisava retocar o batom. Olhei ao redor, procurando por minha bolsa, mas não estava com ela. Lógico, estava com a Bri. — Um minuto... — Corri para a porta e lá estava Brigite me esperando, lábios apertados em uma linha fina, cenho franzido e os olhos curiosos me analisando de cima abaixo, antes de voltar a me encarar.

— Você saiu de repente, as pessoas começaram a perguntar... — Ela parou, o olhos cravados no meu rosto em uma análise silenciosa. — Está se sentindo bem?

— Estou. — Virei e fui para a parte comum do banheiro, passando pelo divã no centro, indo até os enormes espelhos de bordas douradas sobre as pias, do outro lado. — Pode me passar o batom, por favor?

— Claro. — Pelo reflexo eu a vi equilibrar o tablet em uma mão enquanto se encaminhava na minha direção com a bolsa estendida. — Você está pálida. Comeu algo que não fez bem?

Minha resposta foi um sorriso sem graça antes de abrir a bolsa e pegar o bendito batom e me virar de novo para o espelho.

— Com certeza foi alguma coisa naquele buffet. — Pelo espelho eu a vi torcer o nariz. — Não toquei nos camarões se quer saber. Um evento chique desses eles tinham que tomar mais cuidado, sinceramente...

— Eles fazem gordas doações, não estão nem aí para o que a gente come. — Devolvi o batom para a bolsa carteira e me voltei para Brigite parada atrás de mim. Braços na frente do corpo segurando o tablet, enquanto que com os olhos ela continuava me observando, como se procurasse por alguma coisa errada. — Como estou? — Resolvi perguntar.

— Está com a cara de que vai arrancar alguns milhões dessas pessoas. — Ela deixou uma risada baixa escapar.

A porta do banheiro foi aberta de repente, vozes ecoaram pelo banheiro e duas mulheres vestidas elegantemente entraram, e ao perceberem nossa presença se calaram.

— Vamos voltar. — Dei uma última ajeitada na roupa e respirei fundo tentando acalmar as batidas do meu coração. Estava voltando pra lá, para o meio deles.

— Tem certeza?

Fiz que sim com a cabeça apertando a bolsa entre as mãos com força. Assim eu as manteria ocupadas.

Meu conto de fadas secreto (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora