Capítulo 9

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Não a vi na terça-feira. Ela não apareceu em seu armário nem na aula de Artes. Os cretinos, eu mesma deveria tê-los denunciado. A ausência dela me preocupava. E se ela nunca mais voltasse? E se eu nunca mais a visse? Naquela noite, folheei a lista telefônica procurando por "Maximoff". Havia dúzias. Nomes demais para que eu pudesse ligar. E o que eu diria? "A Wan mora aí?" E se a resposta fosse "sim"? E se ela atendesse?

"Por favor", eu diria. "Não vá embora. Volte e se submeta a mais agressões e assédios.

Deus, e se ela se sentisse assim? Se estivesse se sentindo ameaçada? Fiquei acordada a noite inteira obcecada por isso. Por ela. Devo ter cochilado em algum momento, pois acordei com Mamãe chacoalhando meu ombro.

— Nat? Você vai se atrasar — ela disse. — O despertador não tocou?

Droga. Tinha esquecido de acertar o despertador.

A professora Arbuthnot parou no meio da frase quando me infiltrei na sala, quinze minutos atrasada. Mas eu tinha que ir me sentar ali, não é? Para ficar bem visível.

— Você está atrasada, Natasha. — Ela me fez parar no meio do caminho.

Às vezes, precisamos dizer o óbvio. Virei-me para ela e sorri, dizendo:

— Desculpe, sra. Arbuthnot. Houve uma emergência na minha família esta manhã. Mas meu pai vai sobreviver. Os paramédicos conseguiram reverter a parada cardíaca a tempo.

Isso fez com que ela calasse a boca. Todos se calaram. Para as pessoas que encontrei no caminho até minha carteira, sussurrei "nããão". Balancei a cabeça. E elas sufocaram o riso.

Arbuthnot murmurou um pedido de desculpas. Ao me acomodar na carteira, notei que ela parecia um pouco deslocada agora. Ótimo. Apenas fiz minha parte para inibir o abuso logo na fonte.

— Hã, cada um de vocês vai fazer uma descrição de Beowulf — Arbuthnot disse, perdendo-se em uma pilha de livros em sua mesa. — Concentrem-se no que acreditam ser os traços de personalidade mais marcantes dele. Analisem como e por que esses traços são importantes para seu desenvolvimento como guerreiro.

O rapaz à minha frente levantou a mão.

— Sim, Stephen — Arbuthnot falou, recompondo a postura.

— Podemos usar o fato de que Wulfie é gay?

Minha espinha congelou. As pessoas entortaram as cabeças embasbacadas na direção de Stephen. E se viraram de novo para acompanhar a reação de Arbuthnot.

Ela disse:

— E como foi que chegou a essa conclusão?

— A cena com ele e seus homens alegres, jogando água uns nos outros. Pra mim, parece bem fresco. — Ele gesticulou, quebrando um pulso.

Todos riram.

O rosto de Arbuthnot ficou roxo.

— Saia desta sala imediatamente — ela rosnou, apontando para a porta.

— Por quê? Eu só estava dizendo...

— Fora! — Ela gritou.

Stephen murmurou um palavrão, depois afastou a carteira e recolheu seus livros. Saiu desfilando e rebolando por todo o caminho. Os assobios o acompanharam até a porta.

Em qualquer outro momento, eu o teria achado ligeiramente divertido. Hoje, eu só queria ficar de pé e gritar: "O que é isso? Semana Nacional de Homofobia Prática?". Mas eu não podia. Não conseguia convencer meus músculos a se moverem. Não conseguia sair da minha carteira. Não conseguia me pôr a fazer o que sabia ser o certo.

Don't tell our secret (Wantasha)Onde histórias criam vida. Descubra agora