Capítulo XIX - Fim do reinado

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A rua das orquídeas estava fria com a chegada do inverno. Gato aguardava seus donos na janela da sala. Seus olhos perspicazes perceberam a chegada de seu dono e do homem que conheceu no Havanna. O felino correu para a portinhola digital para recebê-los. Não via Patrícia há muitas horas. Já estava preocupado.

Fabian passou por ele com um olhar perdido. Estranho. Não era do feitio dele não lhe fazer um cafuné ao chegar. O Purificador com ele pegou Gato no colo e o levou para dentro e pediu para a casa trancar todas as portas e janelas. O bichano sentiu arrepios quando sentiu ondas eletromagnéticas mais intensas por todo o local. Tudo estava muito esquisito.

A amiga do seu dono desceu correndo as escadas e o encontrou deitado com as pernas encolhidas no sofá. Quando ela sentou ao seu lado, com os olhos vermelhos, o garoto também começou a chorar. Eles se abraçaram. Gato subiu no sofá para se enrodilhar entres eles. Não estava entendendo o motivo daquilo, mas queria estar perto. Sentiu a mão de Ioana o agarrando e abraçando Fabian, agora sentado e agarrado ao pescoço da moça. As vezes eles pareciam estar sem ar de tanto chorar. O dono soluçava. Isso quebrava o coraçãozinho do felino.

Com uma mão, a atleta chamou seu professor, que abraçou a todos com seus braços musculosos. Uma aura de angústia e acalento pousou sobre os quatro. Mas só quando alguém disse "Eu não posso acreditar que ela se foi" que Gato percebeu o que ocorria.

Sua dona morrera.

Ele sabia que a casa estava trancada, mas saiu do aconchego de todos e pôs-se a arranhar a portinhola para sair. Precisava de ar fresco. Como ninguém atendeu seu pedido, correu para o andar de cima, no quarto de Patrícia. Se enrodilhou na cama dela, aspirou todo o cheiro que estava ali, nas cobertas, no travesseiro. Seus olhinhos marejaram de lágrimas.

Na sala de convenções do Palazzo di Ferro, a Mama estava em uma reunião com a ONU. Haviam uma mesa circular e enormes placas de vidro com hologramas dos membros do conselho ao redor dela. A líder da igreja sentava a frente de todos e ao lado de sua cadeira, estava Amora, fazendo anotações em seu Note.

- Um surrrt sem prrrecedentes, mais de trrrês mil morrrts, os cidadãos correndo como loucos, como se estivessem... - o Presidente da Organização nem terminou a frase.

- Termine a frase. "Drogados como os Antigos", você ia dizer. Agora, o que você pensa sobre isso, Claude? - Cornélia chamava o nome antiquado do homem para afrontá-lo. Seus cabelos loiros e ondulados davam-lhe um ar angelical diferente da expressão que ostentava no rosto.

- Eu.. eu não acusei ninguém... de nada! - a voz de Claude falhou. Sua imagem holográfica deu um glitch como se a tecnologia soubesse do erro que cometera a pouco.

- É melhor mesmo. Minha missão como "papisa" é desfazer os erros que vocês cometeram, não repetí-los - ela recostou-se e prosseguiu - De acordo com a necrópole, estamos trabalhando com a hipótese de envenenamento por substâncias alucinógenas...

- Logo, alguém está drogando a população. Tudo está muito claro. E você além de não parecer preocupada, ainda não achou o culpado - disse uma mulher de pele bronzeada - A morte súbita de três Purificadores, suicídio de uma ex-Purificadora, um "surto de epifanias" e agora essa situação de calamidade. Não me parece estar fazendo um bom trabalho, Cornélia.

As madeixas da Mulher sagrada praticamente eriçaram de ódio. Seus olhos arregalaram e sobrancelhas arquearam.

- Esperanza, o PIB de Elisia subiu 4% só nesse trimestre, muito mais que qualquer outro país, e é deprimente para vocês, visto que aqui é uma cidade-estado. Eu posso largar todos os patrocinadores que outros trezentos estarão na minha porta pedindo para apoiar a Igreja. E, comparado ao seu país, com os embates entre esquerda e direita em pleno século XXV, como está Pymindero esse semestre? - sua voz, como uma faca afiada, cortou a expressão prepotente de Esperanza instantâneamente.

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