IV Brecha

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TW: muito sangue e mutilação.

Rebekah

Quando Rebekah abre a porta, uma luz branca toma conta de todo o espaço, a proibindo de ver o que tem lá dentro. Com coragem, porém, ela dá alguns passos para o lugar e toda uma quantidade significativa de coisas acontece: a porta desaparece, tal qual o quarto onde ela estava presa; as roupas sujas de Rebekah são substituídas por um vestido branco de cauda longa; e em seus cabelos, agora soltos, aparece uma coroa de flores.

Depois de perceber tudo isso, a vampira dá uma olhada em volta e percebe o ambiente: aparenta ser um jardim tropical; com coqueiros espalhados e flores bonitas enfeitando o chão. Não parece nada mal, e isso a deixa desconfiada. Seu coração fica ainda mais apertado quando, de repente, uma música começa a ecoar pelo jardim - o som reconhecível da marcha nupcial. O que mais ela quer? Cansada, Rebekah segue, com passos lentos, a música.

Ela não precisa caminhar muito para chegar ao lugar donde o som ecoa, e se esconde atrás de um coqueiro que fica logo em frente ao tapete vermelho da cerimônia, um pouco distante. É um casamento, claro, e os noivos já estão de mãos dadas em frente ao padre, escutando a autoridade. As cadeiras brancas dos convidados estão todas preenchidas e o ambiente não podia ser mais perfeitos; há uma imensidade de flores amarelas espalhadas pelo lugar e o céu está limpíssimo, do mais brilhante e aconchegante azul. Por um momento, Rebekah até se deixa levar pelo amor que a cena transborda, contrariando os seus próprios instintos que a pedem para manter-se alerta em relação aos planos de Janina.

— Nós estamos aqui reunidos, — o homem religioso começa — diante de Deus e dos anjos, para celebrar a união de duas almas gêmeas.

Rebekah franze as sobrancelhas.

— Porque o amor, — ele continua — nesse mundo bonito, mas repleto de pecadores e das mais malditas tentações, tem de ser celebrado; esse dia e lugar belíssimos estão aqui, agora, porque deve-se comemorar a capacidade humana e unicamente humana de amar.

Rebekah escuta com calma, sem se deixar levar por aquilo que é dito. Ela sabe que a bruxa quer mexer com ela e não deixará isso acontecer fácil. E por isso ela revira os olhos a cada frase, com um sorriso irônico no rosto. Como Janina é fraca.

— Todos os prazeres relacionados à felicidade proporcionada pela união romântica estão guardados exclusivamente para as espécies puras e repletas, desde sua criação, de amor. E é por isso, meus caros, que uma aberração qualquer, ainda mais com sede de sangue, nunca será contemplada pela paz do amor, por mais que a anseie com todo o seu ser e amaldiçoada alma e que perca sua frágil sanidade para tal.

Ao terminar de escutar a fala do padre, Rebekah sequer tem tempo de ter alguma reação. Seu esconderijo, de um instante para o outro, não está mais na sua frente, como se nunca tivesse existido ali, e o homem e os noivos a encaram diretamente - não que ela precisasse disso para compreender o contexto daquela fala infeliz. O céu, que tão azul e límpido há poucos segundos, toma uma coloração acinzentada e vermelha e, ao se dar conta, o olfato da vampira também é preenchido por um odor muito bem conhecido; aquele que faz as veias de seus olhos saltarem e se sobressaírem à pele. Rebekah direciona seu olhar aos convidados novamente e surpreendentemente se assusta ao vê-los todos mortos, como se assassinados por uma fera cruel, jogados e banhados com o próprio sangue; uns com os pescoços cortados e outros com as tripas arrancadas de si.

A tentação é grande e Rebekah se odeia por isso; por estar há tanto tempo sem se alimentar e por ter a necessidade de se alimentar disso em primeiro lugar. Mas ela sabe se controlar, mesmo que preenchida por um ódio tão cruel que chega a se transformar em lágrimas. Dessa forma, ela percebe que padre e noivos ainda a encaram.

— Monstro. — eles pronunciam em uníssono.

— Culpada. — a noiva diz, com desprezo.

— Nunca vai encontrar paz no amor. — diz o noivo.

— Ela sequer sabe o que é amar. Ela é um... Ela é um demônio.

As palavras finalmente chegam ao coração de Rebekah. Seria inevitável, de qualquer jeito, mas isso faz a vampira explodir todo o seu sofrimento para fora de si e projetá-lo naquele mundo-ilusão. Rebekah grita. Como se estivesse jogando toda a dor fora, do fundo de seu coração e pegando atalho pelos seus pulmões. E o mundo inteiro escuta. E quando ela termina, percebe que o mundo inteiro ignorou, de novo.

E então só resta enxugar as lágrimas e correr para uma floresta próxima, o mais rápido que consegue.

Rebekah, ao correr sem rumo e com o emocional debilitado, acaba esquecendo de se atentar às irregularidades do terreno e, num passo em falso qualquer, cai de uma elevação de terra e rola pelo chão, até que é interrompida por uma pedra grande que a...

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Rebekah, ao correr sem rumo e com o emocional debilitado, acaba esquecendo de se atentar às irregularidades do terreno e, num passo em falso qualquer, cai de uma elevação de terra e rola pelo chão, até que é interrompida por uma pedra grande que acerta em cheio sua barriga e para o movimento instantaneamente.

A vampira, ainda deitada no chão, leva a mão até o local dolorido da barriga. Seus olhos estão firmemente cerrados e as coisas que escutou há poucos minutos se transparecem nas lágrimas que são derramadas. Porém, depois de alguns segundos nesse estado, a loira respira fundo e se levanta. Então nota: ela foi parar na beira de um riacho, próximo à cachoeira. Aparentemente sozinha. E, como se tivesse recebido dos céus um momento de pausa em descanso, Rebekah sorri com a cena que presencia; a queda d'água e a água corrente, a brisa calma soprando, as flores e a grama verde... Tudo perfeitamente belo. Sequer parece uma ilusão; está mais para um defeito no mundo infernal criado por Janina.

As lágrimas de Rebekah cessam em um instante. Então, sem pensar duas vezes, a mulher retira a coroa de flores de sua cabeça, colocando-a em cima da mesma pedra grande que impediu-a de rolar até a água. E, com roupa e tudo, a vampira se debruça sobre as águas do riacho, mergulhando e limpando sua alma, renovando suas energias.

É uma sensação muito boa. E, como uma criança animada com a imensidão das belezas da natureza presentes diante de si, a vampira decide passar por baixo da queda d'água - o que a revela algo ainda mais imenso e bonito: uma gruta escondida pela água, um lugar espaçoso e, ao possuir muitas irregularidades e pedras de todos os tamanhos, muito intrigante. Ela entra no lugar e, devagar, caminha calmamente, desviando-se de pedras e irregularidades. Tudo muito belo.

De repente, é em meio àquele tesouro escondido pela cachoeira que, misteriosamente, Rebekah é surpreendida pelo ecoar de uma voz muito querida pela caverna.

— Olá? — é a voz de Marcel.

Assustada, Rebekah olha em volta e checa todos os cantos da gruta, porém não encontra ninguém. Mas ela tema a certeza que ouviu a voz de Marcel. Assim, ela vocifera:

— Marcel? É você?

Um minuto. E nada. A voz que escutou não retorna e, por um momento, Rebekah cogita estar perdendo a sanidade, mas esse pensamento logo é levado embora quando a vampira é surpreendida por um ruído baixo vindo da parede esquerda da gruta. Ela se aproxima dali e percebe que há uma palavra se formando, sendo magicamente riscada na pedra que forma a gruta.

Não é possível!

Continua!

Por Todos Os Mundos | marbekahOnde histórias criam vida. Descubra agora