A tempestade que se forma no céu desta tarde fria e cinzenta de inverno, me faz recordar da fatídica noite em que meus piores pesadelos infantis tornaram-se reais.
No inverno de 1969, em meados dos meus 12 anos, uma fatalidade ceifava a vida dos meus pais, que caíram de um penhasco enquanto viajavam de carro durante uma tempestade.
Eu era filho único e minha tutela foi designada unicamente aos meus avós maternos, os quais não tinha notícias desde a primeira infância.
Eles logo tomaram providências para minha transferência a um colégio interno católico e na mesma semana do sepulto dos meus pais, fiz minhas malas para a tal mudança.
Sentado no banco de trás do Mercedes, segui a longa viagem em total silêncio, ignorando as lágrimas que se juntavam em meus olhos.
Quando finalmente chegamos, fomos recebidos imediatamente pelas freiras, que nos levaram ao escritório para meus avós assinarem as papeladas e ficarem livres de mim.
Após alguns minutos, eles já haviam partido e eu estava em meus novos aposentos, organizando minhas roupas no baú da cama, ao lado de outras onze iguaizinhas.
- Augusto? – Disse a voz tímida e baixa do colega de quarto
- Sim? – Me viro para ele, dando um sorriso amarelo.
- Prazer em conhecê-lo, sou Leonardo. Os garotos estão ansiosos para recebe-lo. – Ele estende a mão.
- Muito prazer, Leonardo – o cumprimento
- Estamos o esperando na sala de jantar – Se afasta e vira as costas.
Precisamente às 18h30, o jantar estava na mesa: ensopado de carne, pães frescos e uma deliciosa caneca de chocolate quente no final, para nos aquecer do frio que viria naquela madrugada.
Os garotos foram cativantes e atenciosos comigo, não sei se estavam compadecidos pela minha situação ou foram obrigados pelas freiras, que nos observavam com caras-feias durante todo o jantar.
Ao me deitar, senti meu corpo pesar e o cansaço me açoitar e após fechar os olhos, adormeci depressa.
Pontualmente as 6h00 fomos acordados pela irmã Matilde, supervisora da nossa turma e as 6h30 o café estava servido.
Em meio aos risos descontraídos e advertências das irmãs pela algazarra, algo me chamou atenção: Um garoto solitário, que aparentava ter por volta de sete ou oito anos de idade, estava sentado na última mesa do refeitório, um tanto desarrumado para o padrão imposto rigorosamente pelo colégio, olheiras profundas e volumosos cabelos desgrenhados, seu olhar estava imóvel e a comida em seu prato intocada.
- O que há de errado com ele? – Perguntei para Vinícius, um dos meus colegas de classe.
- Roberto? Bem...ele não está muito bem nesses últimos dias. Recebeu uma punição e voltou do quarto solitário dizendo que teve um encontro com o bicho-papão. As irmãs desconfiam que ele está possuído pelo demônio ou coisa assim.
- Punição? O que ele fez?
- Parece que estava escondendo revista em quadrinhos em seu baú e se você leu as regras, sabe que qualquer coisa considerada fora dos parâmetros da igreja é absolutamente proibida dentro do colégio.
- E por isso o trancaram sozinho em um quarto? – Incrédulo
- Ah, não é tão ruim assim! A punição se trata em dormir em um quarto sozinho e sinceramente acho melhor do que ouvir o Rubens roncando a noite toda – disse Vinicius, rindo.
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Infecção Cadavérica
TerrorUma viagem sem volta às profundezas mais obscuras da mente humana, buscando em seu âmago, o extremo da maldade e insensatez. Os temas abordados são torpes e não são indicados para pessoas sensíveis. Você tem coragem?