Capítulo 9

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Carmen

Encarava a fachada de minha casa com afinco, ponderava fortemente sobre dar meia volta e correr para onde não devia ter saído, dos braços de Jake. Contudo, eu necessitava deste lar, desta casa, mesmo que minimamente, pois havia apenas uma única pessoa ali dentro que eu amava; meu irmão.

Engoli a saliva de minha boca e movimentei minhas pernas pelo quintal bem tratado. O caminho de cimento que levava até a porta estava limpo, a frente da casa transparecia serenidade, toda em tons brancos. "Uma grande e bela mentira." Pensei comigo mesma já parada na entrada. Ninguém sabia, mas eu sabia, que ali dentro o Inferno habitava, o próprio Demônio descansava sob aquele teto bem arquitetado.

Fiquei com a mão na maçaneta dourada durante alguns segundos. "Ainda pode dar meia volta, Carmen. Você sabe que eles não se importam com você." Aquela maldita voz voltava a falar em minha mente. "Corra para sua antiga vida, se entregue àquilo que ama." Meneei a cabeça com os olhos comprimidos e forcei-me a virar maçaneta e encontrar o hall vazio.

Era tarde da noite, quase meia-noite, com certeza estariam todos dormindo. Eu costumava chegar este horário – se não mais tarde. Apenas veria Jeremy, meu irmãozinho de seis anos, o daria um beijo, o abraçaria e depois iria para meu quarto chorar torcendo para que nada ruim sucedesse em seguida.

Apertei meu casaco contra o corpo mesmo não havendo frio ali dentro, era apenas o ímpeto de se cobrir, talvez o medo de estar aqui.

Caminhei no máximo silêncio que pude, tentando não deixar que um único ruído saísse debaixo de meus pés. Estava prestes a subir as escadas quando...

– O bom filho a casa torna – ouvi aquela voz cheia de deboche.

Por instantes fiquei sem reação, apenas segurando o corrimão torcendo para que fosse imaginação minha.

– Por mais que não pareça, me importo com você – falou novamente e ao ouvir seus passos, virei-me para fitá-lo.

Lá estava James, o monstro de sete cabeças, a maldição em minha vida, o Demônio que me atormenta, o meu maior medo.

– Por mim não voltava nunca mais – rebati – E pare com isso, sei muito bem que me despreza, James.

Mesmo na quase penumbra pude ver o sorrisinho de canto.

– Por onde esteve? Ainda vendendo entorpecentes? Ou agora se prostitui? Sabe muito bem que posso lhe dar o que precisa.

– Não quero nada seu. Nada.

O homem aproximou-se mais um passo e instintivamente subi um degrau.

– Apenas quero lhe cuidar. Será que não entende?

– Não preciso ser cuidada – "não por você", pensei.

Virei-me num ato rápido subindo as escadas, sabia que teria de fugir antes que algo acontecesse. Conhecia bem o que sucedia essas conversas desconexas.

Num solavanco meu corpo foi puxado, paramos no meio da escada. Meu corpo estremeceu, a face bronzeada do homem a centímetros da minha, os olhos castanhos sorvendo minha vida, minha alma.

– Não fuja, Carmen – proferiu entredentes – Você sabe que é minha, não? Minha filhinha, para cuidar e amar.

– Me solta agora. Me solta – puxava meu braço – Eu vou gritar.

– Isso, grita, mas grita bastante. Acorda sua mãe. Acorda aquela vadia alcoólatra.

Segurei o choro e desespero em minha garganta. "Não baixe a guarda, Carmen. Não demonstre fraqueza nem medo." Juntei toda força de meu corpo em meu braço direito e dei um impulso para frente assim o empurrando. James cambaleou para trás nos degraus, o vi agarrando a parede e corrimão. Ali percebi minha chance de escapar, virei e corri corredor adentro, entrei em meu quarto e fechei a porta trancando-a.

Dangerous Girl | Jake GyllenhaalOnde histórias criam vida. Descubra agora