3 - Te vejo por aí?

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Estávamos parados na frente da sala de música na qual eu e Ashton estaríamos responsáveis a limpar. Donovan estava parado ao meu lado, verificando algo no celular. Assim que terminou, vira o rosto para mim e sorri levemente, de um jeito que fazia as rugas do seu rosto parecerem ondas.

"Pronto?"

Simplesmente dou de ombros.

Donovan empurra a porta da sala e vejo as costas do meu companheiro de detenção. Ele estava sentado na cadeira em frente ao piano, com a sua usual jaqueta de couro e concentrado demais no que estava fazendo. Eu o observo por tempo o suficiente para que, de repente, ele tenha virado o rosto para mim e seus olhos claros me encarassem.

Por alguns segundos, espero que seu rosto repentinamente brilhe em reconhecimento com o nosso breve encontro na festa da fogueira. Mas nada acontece. Ele apenas me olha dos pés à cabeça, devagar, parando no meu rosto por um tempo para entortar a cabeça e levantar uma sobrancelha.

Meu estômago embrulha.

"Oi", é tudo o que ele diz e mesmo assim consigo sentir as pontas dos meus dedos formigando. "Te vi na festa."

"É," rio de um jeito constrangido, o que fez a situação parecer mais vergonhosa ainda. "Oi."

Um tapa forte nas minhas costas me tira daquele... Daquela... Dos olhos dele. Ashton desvia a atenção para Donovan mas, dessa vez, franze as sobrancelhas. "Que bom que vocês já se conheciam", o diretor sorriu para mim. "Vocês irão limpar aqui hoje. Daqui algumas horas eu volto para verificar o trabalho e liberar vocês."

Balanço a cabeça, observando quando Ashton soltou um 'tsc' estalado com a língua, virando-se para o piano mais uma vez.

Tomando a breve distração dele como uma brecha, Donovan puxa-me pelo cotovelo e diz, num tom três vezes mais sério: "Não brigue com ele."

"Não vou."

Donovan me olha como se não acreditasse, o que quase me irrita. Não gosto da sua desconfiança. Sei que já causei muitos problemas e que não mereço um voto de confiança, mas estou disposto a tentar e, de qualquer forma, não ser levado a sério nunca é divertido.

Muito contrário do que o homem à minha frente provavelmente estava pensando, eu, na verdade, queria muito estranhamente causar uma boa impressão em Ashton.

Donovan assente na minha direção, soltando meu braço. Ele vai até a porta e me olha uma última vez antes de sair, balançando a cabeça como se dissesse 'estou contando com você'.

Assim que ficamos só nós, o silêncio é perturbador. Encaro meus pés por alguns segundos e não sei o que fazer com o resto do meu corpo, então fico me balançando de leve para frente e para trás, apertando os nós dos meus dedos enquanto meus olhos teimavam contra a minha vontade e encaravam obsessivamente a nuca de Ashton.

Meu corpo congela quando ele vira ligeiramente o rosto para o lado, de modo que seu nariz reto brilha com os raios que escapam pelas cortinas finas. "Está curioso ou você gosta de olhar para as pessoas desse jeito?"

Um raio parece ter levantado cada pelo dos meus braços. Me atrevo a dar um passo na sua direção, para perto do piano. Com a minha proximidade, ele arruma a postura e o escuto raspando a garganta. "Curioso." Respondo.

"Que pirralho curioso você é."

Os cantos dos meus lábios sobem. "Pirralho?" É um apelido idiota, mas por algum motivo, torce meu estômago. De um jeito bom. Eu acho. "Achei que você tinha dezenove anos. Sou só um ano mais novo que você, praticamente."

"Eu sei."

E isso é tudo. Quero lhe perguntar como sabe disso, porque me ajudou naquele dia, porque vendeu maconha. É estranho o fato de eu querer conversar, sobre qualquer coisa. Minha língua coça para que eu faça isso, para que comece a tagarelar como normalmente eu faria, mas ele é intimidante. E isso me faz apertar as pulseiras de couro com mais força ainda.

SONHO DOURADO [⚣]Onde histórias criam vida. Descubra agora