Meu pai me puxa pelo cabelo. Meu couro cabeludo arde no mesmo instante e meu cérebro bateu no crânio repetidas vezes, a vertigem atingiu meus olhos. Meus pensamentos não eram mais conexos, eu estava mais concentrado em segurar as lágrimas.
Me recuso a chorar na frente dele. Eu posso chorar por qualquer coisa, com qualquer pessoa, menos meu pai. Não, com ele eu tenho que ser forte, porque se eu desabar, ele vai saber. Meu pai vai saber como mexer com a minha cabeça.
Podia ser coisa da minha cabeça, mas eu estava escutando passos. Talvez fosse a minha mãe, com aqueles olhos assustados e a boca aberta, como se fosse ela quem estava sentindo dor. Como se fosse ela que estivesse sentindo a sensação do próprio coração se destruindo. Como se fosse ela que estivesse sentindo as mãos de quem deveria te proteger, fazendo exatamente o contrário.
"É para o seu bem, Evan", a voz do meu pai pareceu tremer através dos meus músculos, como um terremoto. Apertei os olhos com mais força. Queria bater em algo, até destruir as minhas mãos. Não chore, é pro seu próprio bem.
Se é pro meu próprio bem, não tem porque eu chorar. Se é para eu aprender algo, não tem porque reclamar da dor. O que eu fiz dessa vez? Reprovei de ano, de novo? Não fui tão bom quanto meu irmão?
Eu queria poder abrir a boca e dizer, "por que você não pode me dizer? Por que você tem que me bater? Eu faria qualquer coisa, pra aprender algo que você quer me ensinar. Eu faria tudo-" mas só o pensamento de dizer isso me fazia morder a língua.
Eu podia ter feito tantas coisas. Eu sempre faço algo. Meu pai não me ama sem motivo. Eu devia me esforçar mais, senão minha mãe vai deixar de me amar também.
Meu pai me arrastou até a portinha que ficava escondida atrás de um armário de pratos. Ele empurrou o armário com a mão livre e encarou a parede por algum tempo. Meu estômago parecia estar comendo os outros órgãos de nervosismo. A paralisia dele só me deixava mais ansioso ainda, porque, com a visão borrada que eu estava tendo da boca contorcida do meu pai, eu soube que ele estava naquele momento de reflexão; como se estivesse sendo obrigado a fazer isso, e aquilo mexia com os meus nervos.
Mas, de repente, como se um estalo estivesse ativado os sentidos dele, o aperto que tinha afrouxado um pouco, voltou a puxar meu cabelo.
Eu sabia o que estava por vir, já conseguia sentir o cheiro de mofo e de como o ar de lá entrava nos meus pulmões, pesado e abafado..
Ele abriu a porta e me arrastou, dessa vez pela gola da camisa. Mesmo que apertasse minha garganta, era melhor do que puxar meu cabelo.
Não resisti. Não movi um músculo. Me deixei ser trancado nesse lugar, de novo, e vou deixar mais uma vez, no futuro. E mais uma, e mais uma, e mais...
Meu pai me larga no tapete, que levanta pó quase na mesma hora. Minha garganta seca, meus olhos ardem e meu cérebro inteiro balança como uma gosma. Ele não deve saber que eu tenho alergia. Não deve saber que tem ratos aqui embaixo. Se soubesse, não faria isso.
Ele não faria isso.
Então meu pai me olha da escada. Meu coração é perfurado como se alguém tivesse enfiado uma faca em mim e girado. De novo, ele está com aqueles olhos culpados, como se isso realmente fosse pro meu próprio bem. Ele me olha como se pedisse que eu considerasse a opção de perdoar ele um dia. De que um dia eu vou entender tudo, entender os motivos dele, entender a dor dele.
A porta se fecha, e leva com ela a luz do lado de fora. Escuto o estrondo do armário estar sendo empurrado para frente da portinha. Então tudo fica um breu, tão silencioso que eu sinto e escuto o meu coração, a adrenalina no meu corpo aquecendo meus membros, mesmo que esse lugar fosse frio.
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SONHO DOURADO [⚣]
Mystery / Thriller(CONCLUÍDA) 10/04/2023 ×DEGUSTAÇÃO× 10 primeiros capítulos + extras A HISTÓRIA COMPLETA ESTÁ DISPONÍVEL NA AMAZON! É meados dos anos 2010 e Evan Shiravari ainda não consegue controlar sua impulsividade. Após uma briga entre um par de amigos, Evan f...