"NÃO FALE SOBRE MORTE NA MESA"

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Ela fechou seu armário e olhou para mim - Você tem que parar de fazer isso, Melissa!- Minha melhor amiga no mundo, Sarah, estava tentando me convencer a parar de me cortar.
-Eu tentei. Várias vezes. Mas é mais forte do que eu. Você sabe que minha vida em casa é uma merda!
-Sim... Mas você poderia ter me dito! Eu tive que descobrir por uma foto, como todo mundo. Eu não me senti como se eu fosse sua melhor amiga!
-Sinto muito, Sarah. Eu só não queria falar sobre isso. Como estamos fazendo agora. Eu estou muito bem fingindo que estou bem. - Fechei meu armário e continuei - e além do mais, você iria saber quando eu estivesse morta. Sinta-se feliz que você sabe enquanto eu estou viva.
-Então você pretende mesmo me abandonar? - Ela disse com uma cara de brava, que eu sabia ser falsa.
-Quão egoísta é você? Você não quer me deixar morrer, porque você precisa de mim?
-Quão egoísta é VOCÊ? Você quer me abandonar porque você tem problemas em casa.- ela fez uma careta dizendo "empatamos". - Nós duas somos egoístas e é por isso que nós nos damos bem. Mas eu não posso fazer nada sem você. Não me deixa. Por Favor. - Ela olhou para mim com os olhos de um filhotinho.
-Você está certa. Você não pode fazer nada sem mim. - Eu ri e abracei-a. - Eu não posso viver assim, Sarah. É demais para aguentar.
-Eu sei ... Só ... diz adeus quando você sentir que é o seu dia? - Ela estava quase chorando. Ela não queria que eu fosse. Ela não concordava com isso. Mas mesmo assim ela ficou ao meu lado. E ela sabia que isso iria me fazer pensar cem vezes antes de me matar. Vadia.
-É claro que eu vou dizer adeus . - Estávamos abraçando novamente quando Peyton, minha paixão faz 6 anos, veio em minha direção. Ontem, ele nem sabia da minha existência. Mas foi só Jenna enviar uma foto dos meus cortes, pra escola inteira na verdade, que ele descobriu que eu existia.
-Oi, Melissa . - Disse ele sorrindo - Eu vi as imagens que Jenna enviou. Isso foi muito rude da parte dela. - Disse ele, com aquela cara de pena que eu odeio, a razão pela qual eu não contei a ninguém .
-Obrigado por dizer isso, Peyton . - Controle-se. Controle-se. Não chore. Controle-se, Melissa .
-Se você precisar de alguma coisa , eu estou aqui para você. Eu sei que nós não falamos muito, mas eu gosto muito de você e eu sou um pouco tímido... - disse ele com um sorriso, automaticamente eu sorri de volta - se há alguma coisa em que eu possa ajudá-la...
-Obrigado , Peyton . É muito fofo de sua parte. - sorri.
A escola passou rápido quanto um raio.Tão rápido que eu não pude contar os segundos.
Era hora de voltar para o lar doce lar. Se é que eu posso chamar aquilo de "lar". Aquele lugar não parecia um lar.
Meu pai nos deixou para ficar com outra pessoa, mas ele ainda é a melhor pessoa desta família. Minha mãe está sempre muito doente para falar comigo , mas cura tão rápido pra sua amiga ou para o trabalho, e tudo que nós falamos é como eu "sou uma pessoa inútil e estúpida e que não consegue fazer nada". Meu irmão é muito ocupado jogando videogames e dormindo e dizendo que eu sou um idiota estúpida. Isso não é um lar. Não para mim.
Quando cheguei em casa, minha mãe estava com a amiga dela, sentada à mesa, comendo o que parecia ser frango frito. Sentei-me e me servi.
Quando estava comendo, minha mãe me abordou. - Como foi na escola, amorzinho? - ela falou, com a voz mais doce do mundo. Me deu vontade de vomitar.
-Foi bem. - é claro que eu menti. Não iria contar pra ela que fui zoada o dia inteiro por causa dos meus cortes. Assim que respondi ela voltou a falar com a amiga dela sobre trabalho, e fingir que eu n existo.
Mas de repente uma pergunta brotou na minha mente e eu não consegui me segurar. - Mãe? - ela olhou pra mim, depois de alguns segundos e murmurou um "pois não".
-Mãe, você sentiria minha falta se eu morresse amanhã?
-NÃO FALE SOBRE MORTE NA MESA! - levei isso como um não bem merecido. - Mas é claro que iria sentir saudades! Que ideia é essa? - Ela me olhou com desaprovação.
-Nada. Tenho que fazer dever de casa. - como havia acabado, já ia levantando, mas minha mãe pigarreou.
-Moça. Aonde pensa que vai? E a louça? Quem você acha que vai lavar? Eu? Com minha coluna e meu estômago doendo tanto? Eu trabalhei hoje o dia inteiro. Vá lavar. E alimente seus bichos. Ah! E arrume seu quarto e por favor limpe meu banheiro. Seu quarto está uma bagunça e você ainda bagunçou o meu banheiro. E acorde seu irmão pra levar o lixo pra fora.
Revirei os olhos e murmurei algo, que eu acho que soou como "é pra já, mãe".
-EI! Não revire os olhos pra mim! Você não tem nenhum respeito pela sua mãe, né?! Eu tive um dia difícil no trabalho e ainda estou passando mal! Agora, vá fazer o que eu mandei. - ela falou severamente.
Respirei fundo. Gostaria de não respirar de modo algum. Todo dia é a mesma coisa.
"Faz isso"; "faz aquilo"; "eu to passando mal"; "você não me respeita"; Mas ela nunca pergunta como eu estou. Como eu estou me sentindo. Se eu to passando mal ou não. Se meus cortes estão doendo ou não (ah, verdade, ela não sabe sobre meus cortes).
Então eu simplesmente faço o que ela manda. Todo dia. E nunca é bom o suficiente, pois se eu esqueço de fazer um ou dois dias, isso é motivo pra eu ser uma inútil. Se eu faço cinco minutos mais tarde, é motivo pra ela ter que fazer tudo sozinha. Se eu respondo um pouco mais grossa, pois ela está sendo ridícula, é motivo pra dizer que eu não respeito-a.
E é aí que a faca vira a minha melhor amiga, e minha única saída.

(Não) Me Salve!Onde histórias criam vida. Descubra agora