Capítulo 3

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Em seus quase 500  anos de exist... vida, vida! Não importa o que a arconte electro ou o Dotore achavam, ele era mais do que uma marionete. Ele era orgânico, logo vivo. Em fim, divagou tanto que se perdeu... ahh sim. Em toda a sua vida Scaramouche nunca encontrou alguém num nível de insanidade tão grande quanto a astróloga caloteira. Primeiro ela não fala nada com nada, depois segura a mão dele para fugirem de um "perigo", ai do nada, mais rápida que a luz ela da uma derrapada e da meia volta. E tudo isso para quê? 

 Dinheiro? Comida? Que nada, para pegar os brinquedinhos astrológicos dela. Ele nem se dignou a fazer comentários sobre isso, só a ajudou  a pegar uns cadernos e os colocar numa mochila. Enquanto ela tentava desmontar um aparato, um barulho de porta sendo chutada ecoou por toda a casa. Com seu catalizador materializado ele começou a se preparar para o combate, mas foi impedido por um toque suave em seu braço. Do nada, o mundo inteiro se transformou em água.

 Tudo a sua volta passou por ele numa velocidade acelerada, cada vez mais e mais rápida. O seu senso de direção se tornou completamente inútil e sua capacidade de enxergar se resumiu ver borrões com cores misturadas. Podia-se dizer que estava momentaneamente sem corpo também. Naquele momento ele tinha zero controle sobre o que estava acontecendo com si próprio. Nunca se sentiu tanto como um boneco como naquele momento.

 Odiou cada segundo daquilo.

 Quando o mundo voltou ao normal o cenário era outro: estava de frente para uma montanha íngreme cheia de neve e gelo. Já estivera lá uma ou duas vezes antes. Reconhecia o lago congelado e os resquícios de uma ponte rodeada por ruinas em um estado ainda mais degradado. Era a Espinha do dragão.

  Ainda não entendia muito bem o porquê de ter deixado a maga decidir para onde iriam, e muito menos o porquê de ter aceitado essa ideia louca dela ser sua companheira de fuga. Não que ela fosse atrapalhar, afinal ele sozinho dava de conta de qualquer um que se metesse no caminho deles, mas era esquisito. Seria por necessidade de ter um entretenimento regular? Ou quem sabe soli..... não isso jamais.

 Olhou para sua esquerda para reclamar da ousadia da maga mas foi impedido de sequer formular um pensamento coerente. Uma enxurrada de pensamentos, memórias, ambições, e conversas alienígenas assaltaram sua mente de uma vez só. Era o poder da gnose se conectando a Celéstia e a todos os portadores de visão electro que já existiram. No meio daquela algazarra distinguiu uma conversa - talvez milenar- de dois amantes combinando uma fuga. Depois sentiu fortemente o desejo de alguém fugir de sua família abusiva e das responsabilidades que lhe foram jogadas nas costas sem que jamais houvesse pedido...

 A avalanche mental foi rápida mas tão intensa que o fez cair de joelhos no chão e colocar as duas mãos na cabeça. Estava ofegante, nauseado, e pior : CHORANDO!!! Quis arrancar violentamente a gnose de si, e até mesmo colocou a mão em seu peito para o fazer mas se deteve. Mesmo aquilo sendo o inferno, o vazio era pior. Ele não foi feito para o vazio, ele era orgânico e tudo o que é orgânico necessita de sentimentos por piores que fossem.

 Ele finalmente estava completo de novo e jamais desistiria disso!

 Novamente sentiu o toque suave da maga só que dessa vez ao redor de si no que os humanos costumavam chamar de... como era mesmo? Abraço. Nunca tinha experimentado aquilo antes, era quentinho e fazia seu coração - sim apesar dos boatos ele tinha um, e não era a gnose- bater mais rápido. Baseado no total dessa única experiência, Scaramouche decidiu que gostava de abraços.

 Aproveitou por um tempo isso de ser abraçado até que lembrou da situação patética que se estava. Ele era a maior criação da arconte electro como poderia estar de joelhos por conta de uns meros sentimentos? Não eram nem mesmo dele! E aquela maga tinha alguma lepra no cérebro, certeza! Ela claramente achava que ele era um monstro - no que não estava tão errada assim- e cá estava ela agachada numa posição claramente desconfortável só para o abraçar...

A visita que ninguém quer ( finalizado)Onde histórias criam vida. Descubra agora