O PRIMEIRO ASSASSINATO

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O viajante já estava há uma semana embarcado no El Majestuoso, depois que se acostumara ao balanço do galeão os enjôos diminuíram. Ele passava os dias ajudando os marujos em seus afazeres, afinal estava disfarçado como um deles e precisava agir como tal, e as noites bebendo e tentando conversar com eles ou apenas admirando o mar e o céu noturno, a vida de marujo não era tão ruim como parecia.

Atravessavam o Estreito de Gibraltar, já quase no Mar Mediterrâneo, quando ele notou uma agitação diferente no convés do navio, perguntou a um colega o que estava acontecendo, mas este falou tão rápido que ele só entendeu algumas palavras, uma delas significava piratas e o fez correr pelo navio até que, na proa, o viu, outro galeão idêntico ao El Majestuoso vinha rapidamente de encontro a este.

O viajante ia se juntar aos marujos no porão do navio quando, ainda no convés, esbarrou no imediato, haviam ficado amigos, ele era um dos poucos ali que falava português, e ele resolveu perguntar - lhe:

- Como sabem que são piratas?

- Vistes alguma indicação do país ao qual ele pertence?

- Não.

- Significa que ele não pertence a país nenhum, toda embarcação que navega icógnita é de piratas.

- E o que vamos fazer?

Não houve tempo para o imediato responder, o El Majestuoso guinou para bombordo de repente, desequilibrando os dois, passando ao lado do galeão pirata, tão próximo que o casco das duas embarcações se arranharam produzindo um guincho ensurdecedor. Os piratas aproveitaram a proximidade dos galeões e atiraram, uma chuva de balas caiu no convés espanhol, em meio ao gritos dos atingidos o viajante foi jogado ao chão pelo imediato que gritava para todos se protegerem.

Logo em seguida foi a vez dos seus colegas atiraram nos piratas, o viajante ainda deitado no convés fechou os olhos e começou a rezar para que aquilo fosse um pesadelo quando alguém lhe ordenou:

- Levanta marujo antes que sejas pisoteado, vá lá para baixo!

Era o imediato, apontava para a escada, e ele correu para lá meio abaixado, desceu alguns degraus e ficou a observar, escondido, o tiroteio acima. Através de tábuas os piratas atravessaram para o galeão espanhol, dando início a uma luta corpo a corpo. Alguém havia deixado uma arma caída na escada, o viajante apanhou - a e atirou na direção de um dos piratas, errou, mas o distraiu o suficiente para que seu colega o atingisse na cabeça com um pedaço de pau qualquer.

O viajante atirou outras vezes até não ter mais balas na arma, acertou um pirata nas costas, outro na perna e um colega seu no braço, nenhum deles sobreviveu. Um outro pirata foi em direção ao som dos disparos, mas foi derrubado antes que chegasse à escada e ao viajante, este jogou a arma longe, desceu ainda mais e correu para o porão, escondendo - se lá com outros marujos amedrontados.

O El Majestuoso navegava mais rápido do que o galeão pirata e os poucos que conseguiram atravessar foram derrotados pelos marujos do galeão espanhol. Deixados para trás os piratas ainda tentaram dar a volta para segui - los, mas isso lhe custou demasiado tempo, o galeão espanhol já estava muito na frente, dentro do Mar Mediterrâneo com uma grande quantidade de portos onde poderia atracar, acabaram por desistir deles e seguir outro curso.

No convés do galeão espanhol os marujos pulavam e gritavam comemorando sua vitória, chutavam os piratas caídos que ainda gemiam. Abaixo deles, o viajante tremia e respirava com dificuldade, um dos companheiro de viagem lhe perguntou se estava bem, mas ele só conseguiu afirmar com a cabeça. Dias antes o imediato havia insistido em lhe ensinar a atirar, mas ele nunca imaginara que fosse precisar usar uma arma, muito menos que seria capaz disso.

O viajante nunca havia matado ninguém e, mesmo sabendo que não tivera escolha, desejava não tê - lo feito, de repente sentiu - se enjoado e vomitou, depois chorou em silêncio, queria que aquele galeão atracasse em algum porto logo, queria sair dali, queria esquecer tudo, mesmo sabendo que aquele momento o assombraria por muito tempo.

As histórias do viajanteOnde histórias criam vida. Descubra agora