Um novo recomeço

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Sol, calor, uma floresta exuberante, pássaros e animais exóticos... 

Provavelmente você deve estar pensando que esta deve ser a definição perfeita das férias de verão. 

Para mim... é só um pesadelo do qual eu gostaria de acordar o mais rápido possível.

Seis dias dentro de um carro, com minha família barulhenta e dormindo em hotéis baratos tinham minado completamente meu bom humor – ou o pouco que eu tinha. 

- Lucas, largue isso! – Mamãe gritou para meu irmão mais novo, de 5 anos. O menino sorriu de forma diabólica e eu me encolhi por dentro quando ele desafiadoramente balançou um taco de beisebol na pequena mão.

Lara, sua gêmea, cantarolava do meu outro lado. Vestia uma fantasia completa de princesa, e exalava um ar fofinho, totalmente contrária à energia caótica do meu outro irmão, que usava aquela máscara de Jack, o estripador.

- Leo – Mamãe virou os olhos para mim, desesperada. – Faz alguma coisa. 

- Eu não queria nem estar aqui – Resmunguei, aguentando Lucas batendo o taco na minha perna. 

- Mas já está – Meu pai quase cuspiu, me encarando pelo espelho. – Então é melhor não responder sua mãe assim de novo. 

Engoli em seco, olhando para o outro lado. 

Minha relação com meus pais é... complicada.

Veja bem... eu sou gay. E meus pais não aceitam isso.

E eles acham que fazer uma viagem em família, de São Paulo até Manaus, é uma boa alternativa para me curar desse mal, ou me fazer esquecê-lo.

Fechei os olhos, enquanto o caos reinava dentro do carro. O oco no meu peito não me deixava ter nenhuma reação. Aquele lugar cheio de cores, risada e amores... aquele lugar que foi silenciado a força quando me obrigaram a ficar em casa, a desistir do meu namorado e dos meus amigos, da escola de artes...

Ficar no quarto durante dois meses me deixou à beira do pânico, chorando todos os dias enquanto via a vida acontecer do lado de fora do apartamento. 

Preso como um cachorrinho malcriado.

E em dois meses eu só pensava: o que eu fiz de errado?

***

A floresta nos cercava de todos os lados, do mais profundo verde. Fazia um calor insuportável, que me deixava com a camisa pregada no corpo, mas me recusei a tirar o moletom pesado, ou o boné. 

Nos últimos dias, eu só queria me encolher dentro de mim mesmo. Sumir. Não ser notado por ninguém. 

- Você vai passar mal com isso – Mamãe passou a mão carinhosamente em minhas costas. 

Olhei em seus olhos bondosos. Bondosos até demais, que não ousaram retrucar meu pai quando ele me chamou de abominação ou quando ele me espancou até que eu desmaiasse.

- Não me importo – Me afastei dela, pendurando a mochila no ombro. Não era mágoa... era o nada. O nada que preenchia meu peito e que não me deixava sentir alguma coisa. 

Encarei a floresta a minha frente quando começamos a caminhar na direção dela. O guia, de alguma tribo nativa dali, foi na frente, contando histórias do lugar. 

- A floresta é cheia de mistérios – Ele gesticulou na direção das árvores frondosas, o canto dos pássaros nos acompanhando. –Cheia de histórias e seres fantásticos. Essa parte da floresta em especial tem um guardião...

- Não quero ouvir sobre fantasia – Meu pai cortou o homem, severo, tenso. – Isso não existe. Nos explique sobre a fauna e a flora.

O homem encarou meu pai longamente. Algo em seus olhos brilhou, como se fosse detentor de uma grande e velha sabedoria. Do fundo da caravana, com os gêmeos gritando e rodopiando pelas pernas de todo mundo, e mamãe apontando encantada para uma flor lilás, eu fui o único que viu quando o homem...

Melhor verão de nossas vidas | Livros de contosOnde histórias criam vida. Descubra agora