O gosto da liberdade

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— O sultão está morto! — O grito agudo da governanta chegou a mim trazendo uma mistura de alívio, medo e liberdade. Eu sou Verônica, umas das inúmeras mulheres casadas com Henry, sou sua sultana e sua assassina, e ele foi meu sonho, minha prisão e minha liberdade.

Quando conheci meu marido, um brasileiro que trouxesse consigo a cultura de seu pai, eu tinha 20 anos de idade, muito nova, inconsequente e apenas querendo uma vida de luxúria sem trabalhar, naquela época não sabia o quanto toda minha mordomia me custaria caro, eu perdi minha liberdade e fui aprisionada pelo dinheiro, quando me casei com Henry, mesmo sem saber entreguei–o a chave da minha gaiola. E já estava fechada lá dentro.

Durantes os três anos seguintes eu me afundei em amargura dentro de uma casa luxuosa mas sem felicidade, sem amor, sem carinho, tinha imaginado uma vida que não era real, ali, entre inúmeras mulheres eu não era mais que nada, tanto para o sultão que me procurou pouquíssimas vezes, o que na verdade era um grande alívio já que nunca quis seu toque, seus beijos e muito menos seu corpo no meu, tanto para minhas companheiras, que eram egoístas, debochadas e preocupadas apenas com seu ouro ou qualquer outra coisa sem valor real, as vezes invejava–as, pois elas eram completadas, preenchidas e não vazias como eu. Pelo menos até Jade.

Jade era a mulher mais linda que já tinha posto meus olhos, tão diferente de mim, mas tão perdida quanto eu mesma. Ela era brasileira como eu, mas era ruiva, com a pele bronzeada tão diferente da minha que parecia tão pálida, e ela irradiava luz, luz solar, parecia ter cheiro de mar e me trazia o sentimento de uma brisa de verão. O amor da minha vida.

Depois que ela chegou nos tornamos amigas e tudo ganhou um sentido novo, Jade me contou sua história, que era filha única e tinha aceito a proposta do sultão para dar uma vida melhor aos pais, foi ali que me prometi cuidar dela e nunca deixar que ninguém a machucasse, eu seria seu anjo da guarda e ela minha salvação. Conquistei seu coração pouco tempo depois.

Nos apaixonarmos foi fácil, foi novo, foi mágico, ama–la preencheu buracos que nem sabia ter, ela me fazia transbordar, mas manter aquele relacionamento escondido não era tão fácil, o sultão não percebia, pois eram muitas esposas, mas seus guardas sim e a ordem era de matar qualquer uma que traísse Henry, então era preciso se esconder em todos os cantos se não quiséssemos ser pegas. Passamos dois anos assim, até eu me cansar daquela vida e decidir me livrar do sultão, não desistiria de Jade, nem de sua felicidade, ela era preciosa demais para ser perdida.

Fiquei alguns meses apenas escutando atrás de portas, as vezes me demorando mais do que devia em certos cômodos e embebedando guardas não confiáveis afim de obter o mínimo de informações relevantes possíveis e obtive sucesso. Um dos empregados mais próximos do sultão queria vingança pois muitos anos antes ele tinha assassinado seus pais, eu não procurei saber o porquê Henry matou os pais daquele empregado, apenas encarreguei Rodrigo de me conseguir um veneno quase insípido e inodoro. Arsênico, um veneno sem chances de ser identificado. Com tantas pessoas juntas identificar o real assassino do sultão seria impossível.

Após ter o veneno em mãos passei a colocá-lo discretamente nas bebidas e comidas de Henry, sem nunca ser percebida, dias depois ele veio a óbito, era hora de colocar a segunda parte do plano em ação. Éramos ricas e poderíamos fugir enquanto o velório estivesse acontecendo, nós iríamos para área litorânea, era verão e nós amávamos o Brasil demais para sair daqui, além do mais se por acaso do destino descobrissem que eu tinha matado o sultão era improvável pensarem que ainda continuamos aqui.

(っ.❛ ᴗ ❛.)っ

Sinto o sol quente em meu rosto, a brisa gostosa do mar, os grãos de areia abaixo dos pés, fecho meus olhos e inspiro profundamente absorvendo tudo que posso, sinto o peito apertando e os olhos cheios de água e aperto a mão de Jade, a anos não me sentia tão bem, a anos não via o mar, não sentia a água salgada em meus dedos, a tempos que a liberdade não cantava para mim, mas hoje ela me abraça e eu a agarro de volta, com força, energia e a determinação de nunca mais deixa–la ir.

Seco minhas lágrimas e olho para Jade, que como eu está emocionada, é um novo início pra nós duas e estamos juntas, viva e felizes mesmo após tudo que passamos, mas esse é um momento muito especial para lembrar do passado então lhe dou um sorriso e corro para água com ela em meu encalço. O mergulho é cheio de sensações a muito não sentidas, eu me sinto como uma criança que acabou de ganhar um doce, esse é o gosto de se transbordar. Sorrio.

Corro na praia atrás de Jade e a agarro pela cintura enquanto rimos, antes de pegar a bola colorida a poucos metros da gente e correr como se não houvesse amanhã, mas me canso rápido e Jade me alcança rapidamente, me jogo na areia e ela se senta ao meu lado, ali, debaixo do sol ela fica mais linda do que já é, ela nasceu pra isso, estar ao sol, correr, e então em algum ponto se perder e se transformar em uma loba, correndo sem direção com os pelos se balançando ao vento. Essa era Jade. Ela era tudo, fogo e água, frio e calor, talvez por isso tenhamos no conectado tanto, Jade me fazia esquecer de quem era, me tirava da zona de conforto já conhecida, acredito que todo mundo deveria ter alguém como essa mulher ao lado, mesmo que não durasse a vida inteira.

Agora é verão, mas mesmo que fosse inverno, outono ou primavera continuaria sendo verão, porque essa estação é Jade, está dentro dela, calor, brisa, diversão e tudo que possamos considerar “Verão”.

Puxo Jade para mim e beijo seus lábios delicadamente, lembro que um dia me perguntaram o que era o início, o meio e o fim, hoje eu sei a resposta, é o amor da minha vida.

— Eu te amo — Jade disse ao encostar sua testa a minha.

— Eu também te amo — Respondi antes de soltar um riso bobo.

Se existe algum Deus do Verão ou se a própria estação for um Deus, tenho um pedido, quero ficar pra sempre aqui. Por favor, nos eternize.

Escrito por: Stéfani Soares

Escrito por: Stéfani Soares

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