ATENÇÃO: Este conto de verão pode apresentar gatilhos para bullying, gordofobia e abuso de menores. Além disso, a história conta com a presença de assassinatos e distúrbios psíquicos.
02 de fevereiro de 1989, Maragogi, — AL.
Quando os alunos do último ano do Beltamiro Abreu de Sá, — colégio requintado de Alagoas, — chegaram à pequena cidade litorânea de Maragogi, nem imaginavam que aquele seria o pior verão das suas vidas.
O sol alto, radiante e quente despertava a sensação térmica de 40 graus Celsius, e fazia o suor escorrer pelos corpos bronzeados dos banhistas. A maré, por incrível que pareça, nunca esteve mais branda, ela precedia a inevitável hecatombe que viria a seguir. Os biquínis de cores extravagantes e profundamente cavados marcavam o final da década de oitenta e início dos anos noventa, e vestiam a maioria das garotas naquela praia paradisíaca. O ar era menos poluído do que na capital, Maceió. Por conseguinte, Elisângela sentia a brisa estonteante penetrar suas narinas enquanto ajeitava os seios no maiô apertado, tentando chamar a atenção de Benedito, que, por sua vez, usava pequenos crustáceos para torturar Rafael, o menor entre os rapazes da turma, que estava enterrado quase completamente na areia, salvo pela cabeça e pés, — estes eram alvos dos beliscões de Benedito, Vicente e Alceu.
Alberto, o professor de Educação Física, responsável por cuidar dos adolescentes na viagem de conclusão do colegial, estava ocupado demais com os dedos engordurados, saboreando uma tigela de camarão frito para notar seus alunos praticando bullying explicitamente. Já Maria Teodora encarava o professor desqualificado e o filho trombadinha do deputado estadual Felismino Itabuna, com os punhos cerrados, irada com a situação que se repetia por mais um ano.
Para Teodora, era inacreditável o que faziam com Rafael. O bolsista não tinha um segundo de paz, nem na escola, nem na viagem. Benedito Itabuna fazia questão de infernizar o menino de dezesseis anos até o seu limite. E ela, a filha do prefeito da capital, questionavase como namorou alguém igual a Benedito durante o ginásio. Mas deveria se segurar, manter as aparências, não deixar transparecer seu ódio pelos colegas de classe, falsos, mimados e sem nenhum escrúpulo.
O resto do dia ensolarado de verão seguiu tranquilo para os ricos estudantes nordestinos. Vilani tentou um topless lá pelas quatro da tarde, mas foi impedida pelo gêmeo feroz, José Eduardo. Gabriela e Cristina até suspenderam a partida de futebol de areia para rir da aventureira sendo repreendida pelo irmão, enquanto Rita de Cássia observava de longe, sentada sozinha na varanda da casa de praia, bebendo a quinta caipirinha do dia, com medo de tirar a canga e ser alvo das piadas de mau gosto dos “amigos”, por conta do seu corpo robusto, cheio de curvas, algumas estrias e celulites.
A noite não demorou a se anunciar. Logo a luz da lua refletiu no mar cristalino e nas grandes palmeiras que cercavam a pousada Dona Efigênia: um lugar bonito, todo em madeira de boa qualidade e móveis de palha feitos à mão. No centro da clareira, os adolescentes estavam reunidos ao redor de uma fogueira, com música alta, bebidas e drogas psicoativas. A maconha era a mais leve entre a vasta quantidade de fármacos ilícitos que Vicente arrumou com o primo da polícia federal. E, apesar de ainda não saberem, este seria um dos últimos momentos de todos com vida.
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Melhor verão de nossas vidas | Livros de contos
القصة القصيرةVerão (s.m.) É a estação mais quente do ano e quando os dias são mais longos. Quando podemos nos apaixonar da forma ardente que o clima pede. Quando oportunidades se abrem. É quando tudo pode acontecer... Este livro contém contos de diversos autores...