v i n t e e s e t e

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- geneticamente triste

A depressão, assim como boa parte das patologias, tem causas tanto genéticas quanto ambientais, é um combo. Levando isso em consideração, acredito que dê para afirmar que existem pessoas geneticamente mais propensas a sentir tristeza e outras com maior propensão pra alegria. Por mais que o ambiente tenha uma carga igual de importância na construção da nossa subjetividade, nossos genes afetam consideravelmente a experiência de sermos quem somos. 

Nascer é como apostar na loteria (mesmo que não tenhamos pedido por isso), nunca se sabe quais números o nosso DNA irá sequenciar pra gente. Às vezes, uma pré disposição maior pra sentir tristeza pode acabar entrando nessa equação. Acredito que esse seja o meu caso, eu sou uma das azaradas na loteria genética. A alegria, pra mim, é líquida como a água, escorre fácil, a tristeza também é líquida, mas se parece com a tinta, se fixa com maior facilidade. Desde que eu me lembro, sinto uma espécie de vazio ao qual não sei dar um nome, então vou chamar de "vazio" mesmo, aquela tristeza existencial que Heidegger costumava chamar de "angústia".

Honestamente, não sei o que fazer com isso, é um vazio transbordante que, acredito eu, não vai sair nunca, vai morrer comigo, mesmo que eu faça anos de terapia, mesmo que eu encontre o amor um dia, tenha um filho, o emprego dos sonhos, viagens internacionais e estabilidade financeira, ele vai continuar aqui.

Infelizmente, não dá pra lidar com questões complexas de forma rápida e prática, é impossível remover a angústia cirurgicamente, como se remove uma inflamação no apêndice. Estou ciente de que a única coisa que eu, e você, caro leitor; podemos fazer quanto a isso (ao longo de dolorosas sessões com o analista) é aprender a dançar com essa coisa sem sentir vontade de aniquilá-la a qualquer custo. Até porque, se matamos nossos demoniozinhos internos, estamos também matando uma parte importante da gente. Assim como o Peter Pan precisa de sua sombra, precisamos dos nossos demônios.

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