v i n t e e d o i s

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- Copo meio cheio, copo meio vazio

A gente costuma pensar que a vida é um eterno acúmulo de bagagens, e não paramos pra refletir no quanto a gente perde com o correr dos dias. Nos ensinam que é preciso ter sonhos, mas os perdemos à medida que eles não se concretizam em realidade, ou até se concretizam, porém não são nada daquilo que a gente esperava. Perdemos disposição e energia, perdemos libido, perdemos amigos, perdemos paixões, perdemos o emprego, os anos de vida, a paciência com coisas que antes conseguíamos tolerar facilmente, perdemos aquela coragem idiota, porém necessária, que geralmente os jovens têm. Perdemos a ausência do medo da morte, ou então, perdemos o próprio medo da morte.

A gente se prende à ilusão de que estamos sempre ganhando alguma coisa no fim das contas, e que até mesmo as derrotas podem se traduzir em vitórias, basta confiar em Deus e enxergar a luz no fim do túnel, experiências ruins servem de aprendizado e blá blá blá. Essa filosofia de "campeão", essa forçação de barra pra tentar enxergar algo positivo em tudo a qualquer custo, não nos prepara, de forma alguma, pra pancada que vem nos momentos em que a gente simplesmente perde.

Tudo isso é fruto de uma lógica capitalista que impõe um viés de produtividade até mesmo pra dor. Nem tudo na vida precisa ter serventia, muito menos a dor. É o nosso sofrimento que nos torna algo próximo de "especiais", que nos permite ser chamados de homo sapiens sapiens, nenhum outro bicho na Terra sofre como a gente. Então, pelo menos a nossa dor o capitalismo deveria ter a decência de deixar em paz. Eu, particularmente, não faço questão que a minha dor sirva pra porra nenhuma. Às vezes, a gente só precisa deitar no sofá e curtir a nossa fossa, chafurdar na merda, bem como os porcos que são criados em cativeiro e mal conseguem se mover pela falta de espaço, tendo que dormir em cima dos próprios excrementos até terminarem numa prateleira de supermercado qualquer (não foi uma boa analogia, mas pelo menos eu tentei).

No fim do dia, a gente só precisa de um tempo pra aceitar as perdas como elas são de fato: perdas. E entender que a mala não precisa estar sempre cheia, é meio inevitável que algumas peças de roupa caiam pelo caminho.

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