Capítulo I

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     As ruas estavam vazias, como sempre. A cidade de Cameron perdeu sua alma...

É de lembrar, com pesar, que aquela já foi a cidade mais exuberante de toda a Terra Verde, costumava-se a ouvir de regalo, os melhores risos e coros de espontaneidade, mas agora, naquela nova época, tudo que se pudia ouvir não ía além de bocejos melancólicos e suspiros de desamparo. E agora que a terra já nem terra cheirava, os ventos sopravam forte por aquelas ruelas com grande vigor, porque as pessoas por lá já não ocupavam seus lugares no mundo, haviam desistido de si mesmas, vivendo como moribundos atirados a depressão sistémica.

Numa das esquinas do Centro de Cameron, ouvia-se alguém... Alguém que pelo que parecia, vinha para mudar o clima por aquelas bandas, não, não era um louco na esquina, nem estava ele na esquina, havia um bar ali, era noite.

Se pela manhã às ruas eram sombrias, imagina como eram a noite! Nem fantasmas passeavam por elas.

- O senhor não parece ser daqui... - expôs a inquietação o homem que se chamava Bennie, o balconista daquele pequeno bar da esquina.

- Porquê? Todo mundo de Cameron bebe em seu bar por acaso? - Perguntou transbordando cortesia o tipo estranho que falava sempre com um sorriso firme, de quem não esforça o humor, sua postura era mesmo legítima, falava calmo como respirava, era alto, como um pé de goiabeira, mas não exatamente, vestia como os cowboys, bem... quase, era forte, como os galãs, seu chapéu estava no balcão porque era ele um cavalheiro, e é esta uma tradição desses últimos. E não, não estava armado.

- Não há muitos sorrisos por aqui... ainda mais de um homem constituído como tu...

- É uma observação muito superficial de sua parte, não acha? Os constituídos também vivem em cidades inertes...

- Você não percebeu, aqui não há pessoas... - falava o balconista, apoiado ao balcão e encostando seu queixo de homem gordo em direção ao tipo estranho. - todo mundo por aqui é um fardo ambulante, você pode sentir a energia negativa à milhas, eles literalmente perambulam... - O homem do outro lado do balcão, que era o único cliente não via o que falar, provavelmente pensava "que balconista estranho e sombrio"... Bom. Sombrios, é o que mais havia naquela cidade. - E quem és afinal? O que lhe tras aqui?! - suas inquietações ainda estavam em pé.

- Sou Silver Meyer...

- Meyer?! - Estranhou o balconista - como Beyson Meyer de Culigan?

- exatamente, você conheceu ele?

- Claro, como eu não ia conhecer o homem que tanto fez por essas terras sem esperança? Ele era um homem forte e indestrutível, tinha um corpo robusto, como o teu, seu olhar era vivo, tinha princípios enraizados no coração, como um implante, um homem totalmente tradicional e ético, em fim, Beyson era uma lenda viva! - falava com paixão, suas lembranças foram tão difusas em sua medula, que o corpo todo se arrepiou, até pegou em seus toalhetes e começou a limpar o balcão com prazer.

- Pelos vistos conheceu bem meu pai...

- Foi seu pai!

- Sim. - Respondeu com um sorriso orgulhoso.

- Oooooooh, não pode seeeer... É verdade?! - reparou-lhe ainda uns segundos e prosseguiu. - É uma honra ter um sangue Meyer por aqui, uma grande honra, aliás! - Sua admiração vigorava no semblante.

- Mas não me disse, afinal, porquê está aqui? Culigan é o melhor lugar para se estar hoje em dia, porquê viria cá um Culigano?.

- Estou em uma missão, uma daquelas que se você sai dizendo por aí, você pode morrer por duas vias: pela boca contando ou com uma espada no pescoço depois de contar.

- Parece ser mesmo algo importante, são poucas as coisas que levariam um homem como tu até uma cidade como esta e à esta hora. Até lembra seu pai em suas grandes missões, todo cheio de charme e poderio, com sua espada as costas. - Suspirou ainda. - E esta missão...?

- O que tem?

- Onde lhe levará? Não me diga que seu destino final é por aqui mesmo! Seu pai explorava selvas perigosas, ia para os grandes montes e bosques... - Falava ainda quando Silver interveio.

- Vou para Malaya.

- Malaya?! Você está doido! - Diz-se por aí que ninguém volta depois de pisar as florestas de Malaya, muitos são os que por lá sucumbiram na expectativa de encontrar tesouros e fósseis valiosos, Bennie não podia acreditar no que ouvia... e continuou.

- Faz anos que ninguém vai para lá. Você não ouviu as histórias? Aquele lugar é de loucos, afinal o que te levaria para um lugar daqueles! - Não compreendia, em sua idade de senhor, é sempre melhor cogitar algo que traduza segurança, e essa parece ser uma conversa de mal gosto, como aquelas comidas fora do prazo.

- Como eu disse, é melhor o senhor não saber, para não acabar morto. - A conversa continuou, mas em outros rumos até que Silver decidiu se ausentar do local. Ele se instalaria em alguma pensão e seguiria viagem no dia seguinte.

A Grande Investida - by Zenildo Brocca (Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora