HORA 8
— Quem é Daniel, Alice?
Voltei a minha realidade. Meus sentidos finalmente estão aqui e agora! É o dia do meu casamento e como posso fazer isso? Eu pensei em toda minha trajetória até aqui e ainda tive a audácia de colocar o nome do Daniel em uma conversa com a minha cunhada como se ele fosse o homem maravilhoso.
— Como andam as coisas por aqui? — Entrou na sala reservada minha sogra Elisa que caminhou em minha direção e logo me soltou um beijo nos meus cabelos já com um peteado pesado e bonito.
— Tudo como eu programei. Nada fora dos conformes. Diferente da senhora que permitiu que o tio Sousa levasse André para um bar. — Mônica pareceu esquecer o nome "Daniel" e voltou a atenção para o casório do ano como ela batizou.
— Ele já está bem dona Mônica! Já está todo empacotado pronto para o dia mais feliz de nossas vidas!
Um peso acaba de ser jogado em meus ombros quando minha sogra me olha sorrindo ao dizer estas palavras. — E você querida? Como está se sentido? A mulher mais importante do mundo? Sei que você não gosta de ser o centro das atenções, mas acredito que esse sentimento é inevitável. — Acrescentou Elisa.
— Estou nervosa! Bem nervosa. Mas Mônica tem me ajudado a me acalmar. Não sei o que seria de mim sem ela.
— Realmente ela está bem nervosa. — Disse Mônica ao levantar da cadeira da manicure e seguir para a mesinha com a garrafa de champanhe afogado em cubos de gelo. — Já confundiu o nome do André com um tal de Daniel. Acho que o nervosismo está tomando o juízo dela. — Mônica parecia não mais se importar com o nome.
— Isso é verdade.
Nessa hora o sino da pequena igreja toca. É hora de chamar os convidados do casamento a sentarem e esperar a cerimonia.
Meu coração bateu com a mesma intensidade do soar do sino. Era a hora. Era hora de ir e encontrar André no altar e fazer juras de amor na frente de todos os convidados e familiares. O problema em tudo isso era a maldita angústia de encontrar Daniel nessa mesma igreja. Uma ferida aberta. Um ponto de interrogação. Acabei percebendo horas antes do casamento que era isso mesmo que Daniel era para mim. Uma história não terminada. Mal-acabada. Como casar com o homem de seus sonhos ainda remoendo o passado com o homem que um dia você achou que seria o futuro?
— Hora de ir, Alice. Você está linda! — Dizia Mônica me estendendo a mão.
(...)
Dei os primeiros passos em direção a escada de alvenaria que leva a grande porta de madeira da igreja. Todos estavam lá dentro. Inclusive, André, que já devia estar suando de nervoso. Meu pai estava ao meu lado me ajudando a subir aquelas escadas com todo o cuidado. Parecia que a qualquer passada infalso eu poderia quebrar e colocar tudo a perder. Estava me sentindo uma boneca de porcelana com as bochechas rosadas e um laço apertado em minha cintura. Mônica já estava lá dentro com certeza com aquele sorriso largo pensando em quão maravilhosa estava a cerimonia. E Daniel? O que dizer dele? Será que ele veio? Por que ainda estou pensando nele no dia do meu casamento?
As portas de madeira trabalhada da igreja se abriram. Consigo ver de longe André. Mãos para frente segurando uma a outra. Meu coração palpitou de alegria quando vi um sorriso tímido dele estreitando os olhos ao olhar em minha direção. Ele estava tão nervoso quanto eu. Meu pai me segurou forte quando finalmente a música começou a tocar.
— Podemos ir, querida? — Perguntou ele ao me olhar carinhosamente.
— Sim, estou papai!
Demos juntos os primeiros passos. Consigo entrar na igreja. Vejo as lindas flores brancas espalhadas fazendo um caminho que me leva ao altar.
Vejo Daniel.
Ele estava ao lado de sua mãe, sentado na última fileira de bancos a direita bem na ponta.
Puxo o ar. Pois a única coisa que sinto agora é a falta de ar. Meu vestido parece apertar. Não consigo andar. Meu pai me puxa, mas não consigo dar mais passos. O mundo escurece. O buquê vai ao chão e o som parece ecoar pela igreja.
— Está tudo bem, querida? — Perguntou meu pai ao me olhar e perceber meu tombear.
Olho para Daniel que já se apoia no banco parecendo levantar. Olho para André que parece perceber que algo estar errado.
— Pai, eu não... — Antes que possa completar a frase, vou ao chão.
(...)
— Olá, Alice? Como vai? Você está linda nesse vestido. Preparada para voltar ao passado e decidir o seu futuro?
Foi questão de segundos, depois de cair ao chão, que eu ouvi uma voz rouca e perceber que pertencia a um senhor de cabelos grisalhos.
— Quem é você? O padre?
O senhor estava de joelhos ao chão, segurando uma de minhas mãos e me olhava serenamente com um sorriso nos lábios.
— Venha, levanta-se! Vou te ajudar. – Dizia o homem quando já me segurava com cuidado.
Quando finalmente levanto, percebo que estou na igreja, só que vazia.
— Onde estão os convidados? – Perguntei olhando para o senhor de cabelos grisalhos que ainda me apoiava para chegar até o banco mais próximo. Ele não me responde.
O meu vestido de casamento sumiu. Na verdade, tudo sumiu. Observo assustada.
— Quem é você? – Parei repentinamente. — Onde estar meu vestido? Onde estar o André? — Tento levantar, mas minha cabeça dói e volto a me sentar no banco.
— Alice, não fique assim!
— Quem é o senhor e onde estou? O senhor me raptou, foi isso? No dia do meu casamento?
— Alice, jamais faria isso!
— O que você fez com o meu vestido? – E os convidados? Onde estão todos? — Perguntei sem entender o que se passava. Estou ficando desesperada. Mas o homem repousou sua mão sobre meu ombro e aquilo abrandou o meu coração instantaneamente. Parecia mágica. Um estalar e estou calma.
— Não se preocupe, Alice! Você está bem!
Quando olhei para o semblante do senhor, consegui finalmente distinguir sua imagem.
— Você é o pai do André?! – Arregalei os olhos surpresa. Aquilo era impossível. — Como assim? O senhor está... — Não consegui completar o raciocínio.
— Acalme-se, por favor.
— Então, eu morri? Eu estava na igreja prestes a casar e morri? Foi isso? Você é um anjo e veio me receber?
— Alice, não, você não morreu!
— Como assim não morri? O senhor morreu, certo? E se estamos aqui conversando, isso quer dizer que morri. Ah, meu Deus! Como assim eu morri? — Seguro meu rosto com as mãos me apoiando sobre os joelhos. — Por isso minha roupa branca e as do senhor? Esse é o céu? Oh, meu Deus! — Estou novamente desesperada. Talvez até inconsolada com o acontecido.
— Eu sou um anjo, mas, digamos que você não morreu e sim, você foi abençoada. — Diz o senhor com uma voz branda que novamente como um estalar me acalma.
— Como assim abençoada?
— Deixe-me tentar explicar. Muitos têm um desejo no coração de voltar o tempo e consertar algo do passado. Digamos que foi te dada a oportunidade. Isso não é uma benção?
— Mas não tenho nada no passado que eu queira resolver. Eu estou bem. Eu fiz tudo direitinho. Só...
—Você definitivamente precisa resolver algo do seu passado. Está claro para nós dois que algo aperta esse coração quando você pensa em alguém que não se chama "André".
— Isso não é verdade. — Disse parecendo culpada.
— Vejo em seus olhos a verdade, Alice. Aceite o presente divino e encontre o caminho. Encontre o caminho de volta a André ou...
— Daniel?! — Disse em um sobressalto.
A verdade ecoou pela igreja imensa.HORA 9
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O casamento dos tempos
RomanceChegou o grande dia. Foi tudo perfeitamente cronometrado e minuciosamente pensado. Havia flores por toda a pequena igreja. Pessoas apresentáveis para a ocasião. A família ansiosa e com sorriso no rosto. Havia o noivo apaixonado. Mas também havia uma...