Era quase meia noite, eu encarava o teto ouvindo a chuva cair decidindo se deveria ou não descer para buscar um copo d'água ou só beber da pia mesmo por preguiça.
Decido levantar, meu celular toca. Não atendo pois é quase meia noite, quem liga essa hora? Mas insiste, então vejo que é Feco. Desligo novamente, se for importante ele fala amanhã pessoalmente no colégio.
Vou até a cozinha beber água e ver se sobrou um pedaço do pudim que Odete serviu na sobremesa.
Feco insiste na ligação e eu atendo.
- Eu estou aqui, abre a porta por favor - ele disse.
- Aqui? Como assim? - nessa hora me sobe a raiva e a vontade de jogar na cara dele que ele ficou dias me ignorando e agora ele aparece assim do nada, que tipo de comportamento abusivo é esse, sem contar que ele continuou saindo com a Mari mesmo depois dela ter supostamente me drogado e nem me pediu desculpas. Então percebi que ele estava chorando.
- Estou na sua porta, abre, por favor - ele soluçou.
Fui até a porta e abri, ele estava encharcado, usava roupa de corrida e parecia desmoronado. Fiz sinal para ele entrar e fechei a porta, ele me abraçou logo em seguida muito forte e continuou chorando.
- Ei, o que aconteceu, Felipe? Por que você está assim? - esfreguei minhas mãos em suas costas.
Ele não respondeu, acho que nem conseguia formar palavras.
- Vem, vamos te secar e tomar uma água.
Levei ele para meu quarto, embrulhei em uma toalha e voltei para buscar água.
- Você precisa tirar essa roupa molhada - disse depois de entregar a água para ele - Vou pegar algo.
- Está tudo bem, Miguel? O que aconteceu? - Tio Ricardo bateu na porta.
- Está sim- respondi abrindo a porta - Meu amigo não está legal, tudo bem ele ficar aqui?
- É segunda, vocês tem aula amanhã.
- Tio, ele não parece bem emocionalmente, por favor, juro que não vai trazer problemas.
Ele suspirou, passou a mão na cabeça e disse: - Tudo bem, desde que amanhã cedo ele vá para o colégio e o senhor também. Não fiquem acordados até tarde.
Eu agradeci e fechei a porta, me virei e peguei um dos meus pijamas e entreguei para Feco.
- Se troca no banheiro ali e vamos conversar, ok?
Ele acenou com a cabeça. Seus olhos estavam inchados e vermelhos, seu olhar era apavorado.
- Eu fiz uma merda gigante - ele disse voltando do banheiro e desabando em mim.
- Ei, calma, seja lá o que for vamos arrumar, ok? - guiei ele até a cama - Deita e me conta o que aconteceu.
Ele deitou e me puxou para deitar com ele.
- Desculpa causar isso na sua noite, é que eu não sabia para onde ir e só pensava em você - ele suspirou - É a Mari, ela tá gravida.
Aquilo abriu um buraco enorme dentro de mim e ficou ecoando por um tempo.
- Gravida? - perguntei novamente vendo se fazia sentido.
- Sim, ela está gravida e eu não sei o que fazer, eu não quero isso - ele voltou à chorar.
- Seus pais já sabem? - perguntei.
- Sim, ela contou no domingo passado.
- Por isso vocês sumiram?
- Naquele domingo ela contou no jantar com nossos pais presentes, queria aproveitar que minha mãe estava ali e meu avô também, o que é raro. Quis tirar uns dias pra refletir tudo isso e me isolei na casa da praia com os meninos e ela, queria levar você mas ela não deixou, disse que não gosta de como eu trato você.
- Como você me trata? E agora? Por isso você estava me ignorando?
- Eu estava muito confuso com tudo, saí pra correr, não quero deixar minha vida, essa gravidez sela meu destino e os negócios das nossas famílias, vai ser pra sempre, sabe? - ele começou respirar muito rápido.
- Ei, calma, calma. Você não precisa ficar com ela só por isso.
- Só por isso? É um bebê, são os negócios da minha família, é um legado, como minha mãe diz, eu não estou pronto para isso. Eu não quero esse destino.
- Eu realmente não tenho palavras pra isso, vocês não estavam usando proteção e tal?
- Sim, sempre usei com esse medo, ela tava tomando pílula até onde sei, mas a gente nem conversa mais tanto. Sei lá, é tudo muito mecânico para continuarmos juntos, como se fosse uma obrigação - ele deitou um pouco mais perto de mim.
- Eu não fazia ideia que vocês estavam assim.
- Pois é, nossos pais estão todos felizes, meu avô veio me dizer que eu preciso pedir ela em casamento, eu tenho só dezesseis, sabe? Não tô pronto para isso - ele chorou mais um pouco.
Eu abracei ele e fiquei ali um tempinho enquanto ele chorava.
- Eu ia terminar com ela - ele murmurou.
- An?
- Eu ia terminar com ela aquele dia por causa das coisas que ela faz, quando ela contou isso, depois nós discutimos e ela disse que me ama, e que não eram os planos dela, mas parece que era sim. Eu não a amo. Eu nem se quer gosto mais dela - ele ficou quietinho e eu achei que ele tinha dormido mas ele disse: - eu gosto mesmo de você, desde o primeiro momento, não sei o que estou fazendo, nem sei se você gosta de mim, você é meio lerdo, mas eu gosto de você. E logo logo todos meus seguidores, amigos e familiares vão saber que eu vou ser pai e casar com uma menina que não amo.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Oceano
Teen FictionMiguel se sente perdido e solitário após se adaptar a uma nova rotina, pelo fato de sua avó estar em estado terminal eles tiveram que se mudar para casa do seu tio na capital, onde ele vai começar uma nova vida em um novo colégio, com novos amigos e...