Capítulo Um - Rosas Têm Espinhos

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O amargor era um bom sabor, dava autenticidade às comidas e bebidas. Mas claro, só era autêntico quando não abusavam, quando abusavam... Ficava inviável de comer ou beber com aquele gosto. Assim eu sou, amarga no ponto certo, nem boa demais pra não ser passada pra trás e nem ruim demais pra não ser injusta. Porém, quando abusavam de mim... A morte era a melhor opção tendo em vista que conviver comigo era execrável. Aprendi a ser assim, infelizmente tive que mudar mas não por mim mesma e sim pelo o que eu fui forçada a passar ainda nova.

Lapa, Rio de Janeiro - Brasil (7 de janeiro de 1950)

— É uma menina! — o médico bradou alegre.

— Deixa eu ver. — disse em um misto de lágrimas e felicidade.

Ao ser entregue pra sua mãe, Luciele, a mesma teve certeza que sua filha seria a luz da sua vida. Naquela sala com pouca iluminação, às oito e cinquenta e três da manhã, ela deu a luz à Elisandra Rosa Cavalieri Oliveira, de cabelos negros e pele alva como a neve.

Lapa, Rio de Janeiro - Brasil (1966)

— Mãe, tô indo. — beijei sua testa, afável.

— Elis, não esquece sua marmita! — disse alto.

— Tá na bolsa, pode ficar tranquila que daqui a pouco eu tô em casa. — sorri — Beijos, pai! Amo vocês.

— Beijo e cuidado! — me alertou.

Aos dezesseis anos arrumei um emprego no bar do amigo do meu pai, meu padrinho de batismo. Meu pai sempre me dizia que o trabalho edificava o homem, então ele sempre zelou tanto pelos meus estudos quanto pelo meu trabalho. Inclusive, foi meu pai que me indicou pra ser balconista do bar que ficava no bairro em que eu morava: Lapa. A Lapa era um bairro na Zona Central do Rio de Janeiro, era bastante movimentada e atraía milhares de pessoas por noite de todos os cantos do Rio e até mesmo do Brasil.
O bar ficava a quase oito minutos da minha casa e eu ganhava trezentos cruzeiros por mês, pra uma jovem de dezesseis anos era bastante coisa. Dava pra eu comprar minhas roupas, sapatos, obviamente de brechós, e ainda sobrava pra eu ajudar em casa, era o trabalho perfeito.

— Boa noite, Rosa! — Tonico, meu padrinho, disse ao me ver atravessar a porta do bar.

— Rosa, não! Me chama de Elis. — ri, dando a volta no balcão — Boa noite, tio.

— Hoje o bar vai até duas da manhã, é dia de roda de samba. Mas como a senhorita estuda cedo, vai pra casa às dez, pode ser?

— Posso ir até às onze se o senhor deixar. — disse bem humorada.

— Ah, deixar eu deixo! Mas o General já deixou avisado que quer o neném dele cedo em casa. — zombou, se referindo ao meu pai que nada tinha a ver com o militarismo, apenas era muito rígido — Ó, pra começar, tem uma louça te esperando, mas só tem copo. E o fogão tá imundo, dá conta?

— Ô, se dou! — disse animada.

— Então bora que as pessoas vão começar a chegar. — bateu palma.

As noites da Lapa não tinham iguais, eram animadas e alegres independente do dia da semana. Podia ser segunda-feira que a animação não mudava e em dia de sexta-feira e sábado a animação quadriplicava! Sinceramente, eu amava aquele serviço. Era uma delícia me sentir parte de algo, o bar parava sem mim e essa sensação de utilidade me movia, me fazia sentir importante.

— Menina! — escutei me chamarem no balcão.

Estava fazendo uma porção de sardinha, mas tive que desligar o fogo e ir de encontro à pessoa que havia me chamado. A política da casa era "Atenda todos os clientes ao mesmo tempo e se não conseguir, arrume um jeito.", e assim eu fazia, servia vários ao mesmo tempo.

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