20. Dissecção aórtica

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Não há muito tempo livre quando se cursa medicina em umas das melhores universidades do mundo. Um estudante é minado com tantas disciplinas, tarefas, aulas práticas e inúmeras responsabilidades que mal tem tempo de existir. Ainda assim, a combinação entre vinte mil jovens estudantes numa diferente e empolgante fase de suas vidas, hormônios à flor da pele, a vontade de conhecer pessoas e viver novas experiências, resulta em energia suficiente para festas, bebidas e muita diversão.

Durante seu tempo em Cambridge, principalmente nos primeiros semestres, Niall aproveitou ao máximo as oportunidades que teve. Ainda aprendendo a lidar com a quantidade de álcool que seu corpo aguentava antes de apagar, ele saiu carregado de muitas festas no campus, quase sempre por Harry, seu colega de quarto e melhor amigo para toda a vida, que geralmente se mantinha dentro do limite, pelo bem dos dois.

Agora, médicos graduados, fazendo especialização no programa de residência cirúrgica mais concorrido de Londres, é difícil acreditar que pela primeira vez os papéis se inverteriam.

"Harry, pelo amor de todos os deuses deste universo, levanta a porra dos braços." Niall pede mais uma vez, não mais tão paciente. Ele ainda está ofegante por conta dos três andares que teve de subir, praticamente arrastando um Harry muito bêbado escada acima.

Harry apenas abre e fecha as pálpebras lentamente, piscando com a claridade da lâmpada fluorescente, olhando em volta do banheiro, sem nenhum indicativo de que obedecerá o comando.

"Vamos lá, companheiro, senão vou te colocar debaixo do chuveiro com roupa e tudo." Ele tenta de novo, Harry resmunga mas finalmente ergue os braços acima da cabeça, tentando se manter de pé quando seu quadril tomba para a esquerda. "Ótimo, só tenta não cair, por favor."

Niall luta para passar a gola e as mangas compridas do suéter de lã pelos membros enfraquecidos e a cabeça dele que pende de um lado para outro, sem sustentação. Tirar os jeans foi ainda mais complicado. Harry continua balbuciando palavras incoerentes quando é posicionado embaixo do chuveiro, seus olhos permanecem mais tempo fechados do que abertos a essa altura.

A expressão amarga de Harry após a conversa com Louis foi o primeiro sinal de alerta de que havia algo fora do lugar, o segundo e definitivo, foi quando ele sentou no balcão e pediu uma dose dupla de whisky depois da outra, não importando o quanto seus amigos tentassem animá-lo ou fazê-lo participar da noite de comemoração, nada o tirou de seus próprios pensamentos. Não foi difícil para Niall deduzir qual o problema, e agora, amparando seu melhor amigo alcoolizado ao extremo, ele só consegue se sentir muito culpado por ter compartilhado com Harry o que descobriu assim que, inadvertidamente, clicou no botão de acesso ao prontuário Tomlinson, Louis William no sistema da obstetrícia.

De acordo com as anotações do Dr. Malik, a concepção aconteceu em dezembro, e não há uma maneira no mundo dele não lembrar desta data específica, uma vez que Gemma o importunou por dias para que ele não deixasse Harry esquecer do jantar em família que aconteceria na casa de Anne em Holmes Chapel. Niall entende agora que ela estava apenas ansiosa, mas na época foi unicamente irritante, seu histórico de mensagens com Gemma ainda tem uma longa sequência de 'Por favor, não deixe o Harry esquecer do jantar na casa da mamãe, domingo, 16 de dezembro!!!'. Na semana anterior, ela o ligou no meio da noite para que ele a confirmasse que o irmão havia fixado um calendário na porta da geladeira com o data destacada em um círculo vermelho e um lembrete do compromisso escrito logo abaixo, do jeitinho que havia pedido. A anotação ainda está lá, com imãs coloridos ao redor, presa entre contas e escalas de plantões. Quando Niall teve de entrar no quarto para acordar Harry naquela manhã do dia dezesseis, Louis estava espalhado na cama ao lado dele.

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