9- Ninfas

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Ainda era o inicio da tarde quando chegamos ao riacho doce, território exclusivo das ninfas.
Era um lugar tranqüilo e acolhedor. Havia uma infinidade de flores cor de rosa adornando as margens do extenso rio de águas cristalinas, que serpenteava delicadamente pelo meio da floresta.
A luz do sol deixava a superfície da água brilhando, como se houvessem milhares de diminutos diamantes flutuando junto com a correnteza.
Mas não foi o esplendor do lugar que chamou a minha atenção. Meus olhos rapidamente foram atraídos para a beleza exuberante das ninfas.
Fêmeas milimetricamente perfeitas.
Elas tinham a pele negra como a noite e formas curvilíneas bastante acentuadas, os olhos eram amendoados, e os cabelos brilhantes variavam. Algumas tinham volumosos cabelos crespos emoldurando o rosto de traços firmes e delicados. Outras tinham a cabeça raspada. E outras tinham tranças, longas e muito bem feitas. Todas elas tinham o corpo parcialmente coberto por algas marinhas, que envolviam os seios e os quadris.
Elas se moviam graciosamente, apreciando a companhia umas das outras, em conversas paralelas e sorrisos afetuosos. Ela possuíam uma essência feminina e delicada, mas ao mesmo tempo, pareciam ser forte e dominantes. Algumas nadavam livremente pelo riacho, e outras descansavam sobre as margens do rio, desfrutando do calor do sol.

Kayne, Nerian e Aelle pareciam estar encantados ao observar a aglomeração de ninfas espalhadas pelo lugar. Seus olhos evidenciavam uma mistura de admiração e desejo, que eles nem se quer conseguiam disfarçar.
-Com licença moças. –Edric limpou a garganta quando nos aproximamos da margem do rio. O lobo não parecia estar impressionado com a beleza das ninfas, na verdade, Edric as olhava de maneira respeitosa.
Houve um silencio absoluto enquanto os olhares de todas as ninfas recaíram atentamente sobre nós. Elas nos observaram com curiosidade, todas de cabeça erguida, sem qualquer vestígio de espanto ou surpresa em seus rostos.
-Eu estou à procura de Calipso. –Edric continuou com a voz educada. –Ela provavelmente deve estar a minha espera nesse momento.
-De fato, eu estou. –Uma ninfa de longos e escuros cabelos crespos se levantou. Ao redor dela havia outras quatro ninfas, que apenas nos observavam com atenção, mas continuaram sentadas tranquilamente ás margens do riacho.
-Olá, Calipso. –Edric sorriu, curvando a cabeça de maneira respeitosa. Era quase palpável a aura de autoridade que emanava daquela ninfa especificamente. Calipso era uma fêmea com rosto de traços firmes. Nitidamente mais velha do que as outras. Mas de alguma forma, tão jovem quanto. Seu olhar amendoado era astuto, seu tom de voz era firme e educado, sua postura era de autoridade, e sua beleza era refinada. Provavelmente ela era a líder daquele distrito de ninfas.

-Olá, criatura rebelde. –Calipso sorriu amigavelmente para Edric, demonstrando cortesia –Havia alguns anos desde que eu não ouvia noticias suas, mas quando Priam me notificou, fiquei curiosa.
-Deve saber por que estou aqui. –Edric disse e inclinou o focinho em nossa direção, como se estivesse fazendo uma ligeira e silenciosa apresentação. –Eu reuni um membro de cada distrito envolvido nos acontecimentos passados.
-Eu vejo todos eles. –Calipso anuiu com a cabeça, observando cada um de nós de forma demorada, entretanto os seus olhos recaíram sobre mim com uma ligeira curiosidade –Priam e Tâmia ficaram em duvida sobre ela ser ou não, uma mestiça.
-Eu? –Eu murmurei encarando a ninfa.
-Ela não é uma mestiça! –Edric disse apressadamente, tentando chamar a atenção de Calipso para ele, mas a ninfa não tirou os olhos de mim.
-Essa menina não parece um lúrido, muito menos um luzido. –Calipso inclinou a cabeça –Priam mencionou sobre ela ser uma Lurz, mas também não acho que esse seja o caso.
-Com certeza eu me pareço uma lúrida. –Eu disse um pouco irritada.
-Fisicamente talvez. –Calipso estreitou os olhos escuros, com desconfiança, olhando diretamente para os meus olhos violetas –Mas a sua essência não é daqui. Você conhece os seus pais, menina?
-Não. –eu disse com a voz insegura, o que ela quis dizer com " sua essência não é daqui?"
-Eu encontrei a Eileen, na floresta das quadripetalas. –Nerian interveio, usando um tom de voz calmo –Ela estava próxima de Quartzo, possuía todos os traços de uma lúrida, os anciões deduziram que os pais dela morreram.
-Você é o atual líder de Quartzo? –Calipso olhou para Nerian.
-Sim. –Nerian respondeu com a voz firme. –Meus pais eram Claus e Sara.
-Você é menino do Claus?! –Calipso arregalou os olhos para Nerian. –Teve noticias da sua mãe nos últimos anos?
-Meus pais morreram. –Nerian se limitou a dizer.
-Por favor, Calipso. –Edric parecia preocupado –Não traga assuntos desnecessários.
-Você sabe exatamente o que esta fazendo? –Calipso se voltou para Edric, com uma expressão preocupada estampada no rosto.
-Cumprindo ordens de Lisimba. –Edric murmurou apreensivo.
-E esse luzido? –Calipso se voltou na direção de Aelle com um olhar curioso.
-Sou Aelle. –O luzido sorriu amistosamente para Calipso. –Aelle Illustratur.
-O herdeiro Illustratur?! –Calipso suspirou, balançando a cabeça de forma negativa.
-Eu tenho tudo sobre controle. –Edric disse –Vou levá-los para Atalaia, juntamente com as jóias.
-O que Lisimba está tramando fazer com essas jóias reunidas? –Calipso perguntou, fazendo com que todos nós olhássemos para Edric em expectativa.
-Consertar as coisas. –Edric abaixou o tom de voz –Eu apenas cumpro ordens, Calipso.
-Todos nós cumprimos ordens atualmente. –A ninfa comentou de forma desgostosa. –E esse é o único motivo pelo qual vou colaborar com vocês.
-E eu agradeço por isso. –O lobo disse educadamente.
-As noticias sobre a fuga de Abreacan estão se espalhando gradativamente. Há sentinelas se espalhando por todo o canto a procura dele. –Calipso comentou com um tom de voz sério –Logo Carbert inteiro estará alvoroçada.
-Exatamente por esse motivo, eu tenho pressa em recuperar estas jóias e voltar para Atalaia. –Edric disse. –Antes que vire um tumulto desnecessário.
-Mas receio que antes de lhes entregar a jóia que esta comigo, vocês terão que passar por um teste. –Calipso exalou. –Essas são as regras afinal.
-Todos eles querem testar a gente. –Kayne resmungou baixinho.
Calipso ouviu e olhou para Kayne.
-Priam entregou a jóia dele ao semi-gato. –Calipso começou a andar, com passos lentos e elegantes. Ela mantinha a cabeça erguida, e sua postura demonstrava altivez –Tâmia entregou a dela a serpente de Ardis, o que não foi uma surpresa para mim, devido a sua similitude. –Calipso se aproximou de onde estávamos e parou diante de nós, e olhou cuidadosamente entre Nerian e Aelle –A minha eu terei de entregar ao luzido ou ao lúrido excedente.
-Você é o lúrido excedente. –Aelle sussurrou baixinho para Nerian. Havia um sorriso divertido em seus lábios cor de cereja.
Nerian apenas revirou os olhos violetas e ignorou Aelle.
-Eu não faço parte dos escolhidos de Atalaia. –Nerian comentou secamente.
-Você faz parte das minhas escolhas a partir de agora lúrido. –Calipso sorriu afetuosamente –Acredito que tenha percebido que em meu território não há machos.
-Percebi. –Nerian limpou a garganta com desconforto.
-Eu não vou desafiar a Lúrida. –Calipso piscou para mim –Não tenho motivos para querer dificultar as coisas para ela em minhas terras.
-Qual é o teste? –Edric quis saber, usando um tom de voz baixo e respeitoso.
-Verdade ou conseqüência. –Calipso sorriu sugestivamente, seus olhos amendoados passearam sobre nós –Mas não hoje, pois eu sei sobre o jogo com o qual Tâmia desafiou vocês hoje pela manhã.
-Amanhã de manhã então? –Edric tentou disfarçar a insatisfação que sentiu devido á demora, mas ela tingiu seu tom de voz.
-Sim. Amanhã pela manhã. –Calipso anuiu com a cabeça –Pois está noite, seus acompanhantes precisam descansar tranquilamente, pois estão exaustos e necessitados de uma boa noite de sono.
-Graças aos céus, alguém percebeu isso. –Kayne comemorou, erguendo as mãos para o alto de um jeito engraçado.
Calipso sorriu ao observá-lo.
-Priam gostou de você. –Calipso se aproximou de Kayne, acariciando suas orelhas felpudas –Em sua mensagem, ele disse que você tem um coração ingênuo.
Kayne apenas sorriu gentilmente. Seus olhos verdes se iluminaram.

Internamente, eu também me senti agradecida por Calipso nos oferecer uma noite de descanso, pois eu estava realmente cansada desde que visitamos Priam em seu labirinto de espinhos, e logo em seguida participamos da festa de Tâmia e o jogo. Fisicamente, eu estava cansada.

-A mensagem de Tâmia mencionava sobre a determinação de Anabel –Calipso se afastou de Kayne e se aproximou da pequena Anabel. –Mencionou também sobre um tal de Cris sentir saudades.
As bochechas de Anabel coraram, e ela sorriu timidamente para a ninfa a sua frente.
-A juventude é belíssima, não é mesmo. –Calipso piscou para Anabel.
-Então amanhã bem cedo. –Edric comentou –Espero que não seja algo muito complicado.
-Isso vai depender de Aelle e Nerian. –Calipso sorriu e olhou para Nerian e Aelle.
Ambos assentiram silenciosamente para a ninfa.

-Ofereço á vocês uma cabana para pernoitar conosco. –Calipso fez sinal com a cabeça, e algumas outras ninfas se aproximaram de nós –Haverá comida e bebida enquanto estiverem aqui, e vocês serão respeitados, desde que nos respeitem também.
-Não temos a intenção de desrespeitá-las. –Edric lançou um olhar de advertência para Kayne, Nerian e Aelle. –Enquanto estivermos em seu território e muito menos depois que sairmos dele.
-Sendo assim, vocês serão bem vindos aqui. –Calipso sorriu educadamente e então ergueu a mão, gesticulando para as ninfas que se juntaram a nós. –Elas lhes guiaram até a cabana. Lá vocês poderão se lavar, comer e descansar.
-Nós agradecemos. –Edric maneou a cabeça, fazendo sinal para que seguíssemos a ninfas de Calipso.
-Vejo vocês amanhã. –Calipso se retirou, caminhando elegantemente em direção ao riacho, mas antes de entrar na água, ela olhou por sobre o ombro na direção de Edric –Me procure mais tarde, precisamos conversar em particular.

A cabana era totalmente feita de troncos de arvores e samambaias. Era ampla e simplificada, contendo apenas duas camas em seu interior. As camas em questão eram largas e com a estrutura de madeira, cobertas por samambaias, e aparentemente confortáveis.
-Podem se lavar ao lado esquerdo do riacho doce. –Uma das ninfas anunciou ao apontar para o rio –Nenhuma ninfa freqüentará esse lado do riacho, para que vocês tenham total privacidade enquanto forem nossos hospedes.
-E nenhum de nós irá para o outro lado. –Edric garantiu com veemência.
-Daqui a pouco alguém lhes trará algo para que comam e bebam. –A outra ninfa disse. Ambas eram igualmente belas.
-Nós agradecemos a hospitalidade. –Edric maneou a cabeça em agradecimento, e então as ninfas se retiraram.

Anabel e eu fomos as primeiras a ir tomar banho no riacho. Em consideração a mim, Anabel permaneceu em sua forma de garotinha, enquanto eu estava em sua companhia. Nós nos lavamos, e então voltamos para a cabana, para que Kayne, Aelle e Nerian pudessem se lavar também.

A tarde passou depressa. As ninfas nos trouxeram frutas, água, e um ensopado de peixe.
Quando anoiteceu, Edric foi ao encontro da ninfa.
Kayne e Anabel dividiram uma cama, na qual eles ligeiramente pegaram no sono.

-Eu fiquei cismado com as coisas que aquela ninfa disse. –Aelle estava escorado na entrada da cabana, observando o riacho à noite.
-Ela disse que a minha essência não é daqui. –Eu comentei pensativa, sentada no chão ao lado de fora da cabana, enquanto atirava pedrinhas no rio.
-Pra ela você não é uma lurz. –Aelle riu –Nem uma mestiça.
-Nunca achei que você fosse mestiça. –Nerian disse se aproximando e se sentando ao meu lado, em suas mãos ele trazia alguns morangos maduros.
-Mas ela tão pouco é uma lúrida. –Aelle olhou para Nerian de forma provocativa.
-Asas negras, olhos violetas... Controla o fogo violeta.–Nerian me fitou de cima a baixo –Pra mim é uma lúrida.
-E essa estrela prateada ai perto do olho dela. –Aelle questionou –Isso ai não tem nada haver com lúridos.
-Muito menos com luzidos. –Nerian deu de ombros, me oferecendo um morango.
-Eu não tenho nada de um luzido. –Peguei o morango da mão de Nerian. Ele sorriu satisfeito para mim.
-Não tem? –Aelle se agachou ao meu lado e pegou o morango da minha mão e o enfiou inteiro na boca. Era a segunda vez que ele fazia isso. –E como você explica o motivo de conseguir ouvir os meus pensamentos?
Nerian me lançou um olhar inquisidor quando colocou outro morango na minha mão.
-Do que esse luzido está falando, Eileen? –Nerian estreitou os olhos violetas para mim.
-Luzidos podem conversar mentalmente. –Eu disse, olhando para Aelle de cara feia –E quando chegamos em Impoluto eu pude ouvir enquanto eles faziam isto.
Nerian ficou em silencio, apenas me observando.
-Eu desconfiei disso em Impoluto. –Aelle sorriu o canto dos lábios –Mas ela confirmou que podia me ouvir lá na praia.
-Porque não me contou sobre isso? –Nerian parecia estar desapontado.
-Não achei que fosse algo importante. –Dei de ombros.
-Mesmo assim, eu não acho que você seja uma mestiça. –Aelle olhou para mim, seus olhos azuis brilhavam no escuro. –E quando a ninfa disse que a Eileen não tinha a essência daqui, me passou pela mente que talvez você seja de outra espécie.
-Não há outros anjos em toda a Carbert, alem de lúridos e luzidos. –Nerian interveio. –Talvez seu pai fosse um lúrido e sua mãe uma luzida.
-È algo a considerar. –Eu ponderei por um momento. –Eu nunca ouvi falar de um mestiço antes.
-Algo me diz que a resposta sobre a Eileen, tem haver com essa estrela debaixo do olho dela. –Aelle me observou com atenção.
-Bom, Edric deve saber de alguma coisa a respeito. –Eu disse me levantando, e esticando as minhas asas completamente –Caso contrario, Atalaia não teria me escolhido para recuperar essas jóias antes que o tal do Abreacan as encontrasse.
-A maneira como os guardiões falam com Edric é suspeita. –Nerian olhou para a correnteza do riacho –E quando a ninfa perguntou a Edric o que Lisimba iria fazer com as jóias, ele disse que Lisimba queria concertar as coisas.
-Consertar o que exatamente? –Eu alternei meu olhar entre Nerian e Aelle, que também pareciam pensativos sobre essa questão.
-Eu não faço idéia. –Aelle disse –Mas os guardiões parecem querer que isso aconteça.
-Eu não confio nesse lobo. –Nerian disse enquanto se levantava.
-Eu também não. –Aelle se levantou também.
-Mas no momento não podemos fazer nada a respeito. –Eu disse recolhendo as minhas asas rentes as costas.
-Apenas observar. –Nerian murmurou pensativo. Seus olhos violetas pareciam cansados.
-Eu preciso dormir. –Eu bocejei, e entrei na cabana, Nerian e Aelle vieram atrás de mim.

Olhei para as camas a minha frente, dei de ombros e deitei na cama vazia.
Aelle em seguida se jogou ao meu lado sobre as samambaias.
-Você pode ir dormir com Kayne e Anabel. –Nerian fechou a cara para o luzido ao meu lado.
-Vá você se quiser! –Aelle riu debochadamente, e se aproximou mais de mim.
Nerian olhou para mim, como se buscasse a minha opinião sobre a proximidade do luzido.
-Estamos todos cansados. –Eu me movi para que tivesse espaço para Nerian se deitar ao meu lado. –Amanhã vocês dois vão disputar pela jóia da ninfa, precisam dormir.
-Eu não me importo com a jóia, Eileen. –Nerian se aproximou, deitando-se ao meu lado. –Apenas quero poder voltar logo para Quartzo.

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⏰ Última atualização: Jul 06, 2022 ⏰

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