Eileen, O despertar de um Anjo (Em andamento)

8- Molhada

Acordei com o som das ondas do mar quebrando forte na areia. Estava tão claro, que meus olhos mal conseguiam se abrir. Minha cabeça estava latejando forte. Minha boca estava seca.
Gemi ao me sentar na esteira, sentindo a minha cabeça girar.
-Bom dia senhorita. –A voz de Kayne me cumprimentou do outro lado da tenda.
-Bom dia. –eu murmurei passando as mãos pelos meus cabelos. Eu estava um pouco nauseada.
-Nerian deixou um chá para você beber quando acordasse. –Kayne apontou para uma cumbuca ao lado da minha esteira. –Acredito que ainda esteja quente.
-Nerian... –De repente as lembranças da noite anterior invadiram a minha mente, e eu gemi de constrangimento. –Onde ele está?
-Ele, o lobo e a Anabel foram se encontrar com a tal da Tâmia. –Kayne disse e apontou para a outra extremidade da tenda, aonde Aelle dormia pesadamente envolto em um casulo das próprias asas. –Eles não conseguiram acordar o luzido.
-Sabe me dizer como está o humor de Nerian está manhã? –Eu balbuciei enquanto pegava a cumbuca de chá que ainda fumegava.
-Eu não o conheço bem, Eileen. –Kayne se levantou se espreguiçando, as orelhas felpudas estavam caídas para baixo. Ele parecia estar de ressaca também. –Mas acho que ele estava tranqüilo.
Eu me levantei também, analisando a camisa preta de Nerian que eu ainda estava usando. Ela parecia um vestido curto para mim.
-Bom, preciso recuperar a dignidade que eu perdi ontem á noite. –Eu sorri para Kayne e bebi todo o chá da cumbuca. Era amargo.
Kayne sorriu para mim e saiu da tenda.

Fechei as minhas asas como um casulo envolta do meu corpo, e tirei a camisa de Nerian e coloquei as minhas próprias roupas. Depois virei um pouco de água fria da botija, lavei o meu rosto, e alinhei os meus cabelos em um coque meio solto no alto da cabeça.

Quando recolhi minhas asas negras rentes as costas, me deparei com um par de olhos azuis sonolentos me observando.
-Como você está? –Aelle murmurou com a voz embargada. Ele continuava deitado em uma esteira do outro lado da tenda. Seus cabelos negros estavam bagunçados, e o rosto um pouco corado. Ele usava apenas a habitual calça de linho branco.
-Recuperada. –ofereci um sorriso amigável para o luzido –E você?
-Em fase de recuperação. –Ele deu de ombros se esticando para pegar uma cumbuca ao lado da esteira na qual ele estava deitado. Ao ingerir o liquido, ele fez uma careta. Eu sorri.
-Sobre ontem... –eu comentei, me sentindo um pouco estranha.
-Foi divertido. –Aelle disse piscando para mim.
Então eu apenas sorri para ele. Não havia necessidade de fazer comentários.
-Finalmente acordaram. –Edric de repente entrou na tenda –Tâmia está nos esperando do outro lado da praia.
O luzido se espreguiçou e levantou rapidamente, estendendo completamente as suas asas branco prateadas. Era difícil ignorar a perfeição daquele luzido. O espesso cabelo negro estava totalmente desalinhado, deixando-o incrivelmente atraente.
"Lúridos e luzidos não podem ficar juntos, Eileen!"
"Lúridos e luzidos são incompatíveis!"
"Esquece e ignora!"
"Finge que ele tem uma doença!"
Desviei o olhar enquanto Aelle vestia uma camisa branca. Era mais fácil assim.

-Onde está Nerian? –Eu quis saber, ao me voltar na direção de Edric.
-Ele e Anabel estão com a Tâmia. –Edric se voltou para fora da tenda e olhou o mar adiante –Kayne está indo ao encontro deles, e eu vim buscar vocês dois, na esperança de terem se recuperado dos efeitos das framboemoras que comeram ontem.
Eu e Aelle fizemos apenas uma troca de olhares silenciosos.
O lobo nos observou rapidamente e então saiu da tenda.
-Não temos tempo a perder! –ele exclamou e eu e o luzido apenas o seguimos em silencio.

O outro lado da praia era composto por rochedos enormes, que formavam piscinas naturais rasas. Havia um aglomerado de criaturas semi-aquaticas tanto dentro como fora da água. Todas com a pele incrustada de escamas fruta cor, que brilhavam colorido devido aos raios de sol do inicio da manhã. Alguns machos, e algumas fêmeas tinham cabelos coloridos, mas a maioria deles tinham o cabelo de uma tonalidade verde desbotado.

Não foi difícil identificar onde Tâmia estava. Um tremor percorreu pelo meu corpo quando eu a vi.
Ela era uma serpente enorme, com aproximadamente treze metros de comprimento, e pesava pelo menos uma tonelada. Ela tinha uma tonalidade perolada, quase cintilante na extensão da pele aveludada. Seus olhos eram grandes e amarelos. Havia uma bifurcação em sua língua que habilmente se esticava para fora da boca fechada.

Ela estava enrolada em si mesma, descansando sobre um rochedo íngreme, onde as ondas se chocavam vagarosamente. A serpente observava atentamente enquanto nós nos aproximávamos.
-Se estiverem com medo... Não demonstrem. –O lobo sibilou baixinho.

Olhei envolta a procura de Nerian, quando finalmente eu o avistei, seus olhos já estavam atentos em mim. Nerian, Kayne e Anabel, que agora era um macho robusto, estavam parados no meio de um imenso espaço circular de areia, cercado por rochedos íngremes. Nós caminhamos tranquilamente na direção deles, sob os olhares observadores de todas as criaturas semi-aquaticas.

-Dormiu bem? –Nerian perguntou quando me aproximei dele. Seus olhos violetas examinaram o meu rosto com atenção.
-Desculpe por ontem... –eu murmurei oferecendo-lhe um sorriso meia boca. Obviamente eu não entraria em detalhes sobre os acontecimentos, muito menos, faria comentários sobre as besteiras que eu havia falado enquanto a minha cabeça estava em um estado de debilidade. Conhecendo-o, eu esperava que ele fizesse o mesmo, para evitar constrangimentos.
-Não há necessidade de pedir desculpas. –Nerian segurou em minha mão, puxando-me para mais perto dele, e desviou o assunto –Essa serpente está nos observando desde quando chegamos aqui, e isso está me deixando nervoso.
-Porque estamos aqui? –Perguntei baixo, observando a serpente marinha.
-Cris disse que Tâmia gostaria de nos conhecer. –Edric respondeu a minha pergunta, se aproximando –Espero que ela apenas nos entregue a jóia que esta com ela e deixe-nos seguir viagem.
-Há algum motivo para ela querer nos manter aqui por mais tempo? –Aelle se aproximou, lançando um olhar interrogativo para o lobo negro ao nosso lado.
-Achei que você havia gostado daqui. –Edric sorriu maliciosamente –Ontem você me disse que essa praia era um paraíso.
Aelle revirou os olhos para o lobo.

-Todos já se reuniram! –Cris exclamou de repente, capturando a atenção de todos á sua volta. –Então vamos jogar!
-Jogar? –Edric pareceu confuso, e olhou para Tâmia enrolada no alto do rochedo.
A serpente então maneou a cabeça, e lentamente começou a se mover.
Houve um brilho dourado faiscando pelo seu corpo, se expandindo por toda a extensão da serpente. E de repente, em questão de segundos, a imensa serpente marinha havia se transformado em uma belíssima fêmea loira.
-Ela se parece com Anabel. –Eu murmurei para Nerian ao meu lado. –Ou pelo menos com a versão antiga dela.
-Talvez Tâmia seja o motivo de Anabel ter se transformado em um macho loiro, equivalente a ela. –Aelle se aproximou de mim e de Nerian, mas seus olhos ainda estavam em Tâmia. –Para cortejá-la.
-Shiiiiihhh! –Edric sibilou em advertência, e nós nos calamos.
Eu percebi uma rápida troca de olhares entre Anabel e Cris. Havia um ar de cumplicidade entre os dois naquele momento, mesmo que quase imperceptível.

Tâmia saltou graciosamente entre os rochedos íngremes, até pular na areia com os pés descalços, dentro do circulo no qual estávamos.
-Bom dia, estrangeiros! –Ela cumprimentou com uma voz doce, enquanto seus olhos vagavam sobre todos nós. –Três anjos, um gato, um lobo, e uma cobra inferior.
-Bom dia, Tâmia. –Edric deu um passo à frente, fazendo com que a fêmea olhasse para ele.
-Devo chamá-lo de sentinela? –Ela perguntou com desdém, ao franzir o rosto de feições harmoniosas.
-Eu agradeceria se fizesse isso. –Edric maneou a cabeça cuidadosamente.
-Para mim não faz a menor diferença. –Tâmia deu de ombros –Cris me disse que vocês vieram para resgatar a jóia que esta comigo, e eu me pergunto; o que te faz pensar que eu simplesmente a entregaria para vocês?
-Priam nos deu a dele. –Edric disse educadamente.
-Priam está velho e entediado. –Tâmia sorriu para o lobo –Aposto que ele está querendo um pouco de divertimento.
-Por favor Tâmia, coopere conosco. –Edric pediu com um tom de voz afetuoso ao olhar para a fêmea a sua frente. –Você sabe que algum dia alguém viria resgatar a jóia que ficou com você.
-Priam me mandou uma mensagem hoje pela manhã. –Tâmia sorriu e olhou na direção de Anabel –Tentando me persuadir a colaborar com a sua empreitada.
-E então... –Edric insistiu com um sorriso se estendendo em seu rosto felpudo.
-Assim como Priam, eu tenho meus próprios interesses. –Tâmia andou devagar a nossa frente, observando cada um de nós com atenção.
-Todos nós temos interesses particulares. –Edric disse com seriedade excessiva –Mas todos concordamos que um recomeço seria o mais adequado para toda a Carbert.
-Talvez sim, talvez não. –Tâmia sorriu os lábios cor de rosa –A única coisa que me incomoda atualmente é a regência de Atalaia.
-Como eu disse, todos nós temos interesses particulares. –Edric sorriu de um jeito arrogante.
-Jogue comigo, e se vocês ganharem... –Tâmia voltou à atenção dela para Edric ao passar os dedos pelo pescoço esguio e pálido, onde surgiu um colar, que sustentava apenas uma perola com cerca de dois centímetros. –Eu entrego a jóia amistosamente.
-E se perdermos? –Aelle deu um passo a frente –O que acontece se perdermos?
-Eu fico com a garota! –Tâmia apontou o dedo na minha direção, sem se quer olhar para mim. A mão de Nerian apertou mais firme na minha.
-Eu? –murmurei confusa –Porque quer ficar comigo?
Tâmia olhou para mim e sorriu com doçura.
-Caeli... –ela sibilou entre os dentes, e uma língua estreita e bifurcada escapou por entre seus lábios, como se ela estivesse saboreando o gosto do ar ao meu redor.
Eu senti um arrepio frio percorrer pela minha espinha. Tâmia sorriu ao perceber isso.
-Não precisa ficar com medo de mim, garota. –Ela disse com doçura, mas seus olhos amarelos comunicavam totalmente contrario.
-Você não pode ficar com a garota. –Edric resmungou entediado, lançando um olhar cansado para Tâmia.
-Eu estava apenas brincando. –Tâmia piscou para mim divertida e então seus olhos se voltaram para Nerian –Eu deduzo que esse lúrido seja o protetor dela.
-Eles tem um lance de fraternidade. –Aelle comentou descontraído, chamando a atenção de Tâmia para ele.
-E você deve ser o príncipe encantado. –Tâmia se aproximou de Aelle, encarando-o nos olhos azuis –Vocês luzidos e os seus olhos azuis, prontos para nos golpear sem dó e nem piedade.
-Isso foi um elogio? –Aelle arqueou as sobrancelhas e encarou Tâmia.
-Foi uma premonição. –A fêmea gargalhou com arrogância e se afastou de Aelle.
-Que tipo de jogo você está propondo exatamente? –Nerian interveio, me puxando para mais perto dele, de forma protetora.
-Molhada. –Tâmia sorriu percebendo a atitude protetora dele em relação a mim, e isso pareceu deixá-la satisfeita –Já ouviram falar?
-Molhada, tipo com água? –Kayne não pareceu gostar da idéia.
-Exatamente, gatinho. –Tâmia se aproximou de Kayne, acariciando gentilmente o seu rosto felpudo. –A intenção do jogo é molhar os adversários.
-Nós iremos formar duas equipes. –Cris se aproximou, ficando ao lado de Tâmia –A equipe de Tâmia e a de Edric.
-A idéia e eliminar jogadores. –Tâmia sorriu o canto dos lábios finos, ao gesticular as mãos fazendo surgir uma bola de água com cerca de vinte centímetros de diâmetro.
-É um jogo bem simples. –Cris sorriu criando outra bola, idêntica a de Tâmia, em suas próprias mãos.
-O que exatamente você quer dizer com "Eliminar jogadores"? –Aelle lançou um olhar desconfiado para Tâmia.
Ela sorriu, e sua língua bifurcada escapou por entre os lábios.
-Eu devoro cada um deles. –Tâmia disse maliciosamente.
Todos nós ficamos em silencio absoluto diante das palavras dela.
-Estou brincando. –Tâmia balançou a cabeça e sorriu –Obviamente nenhum de vocês me parece apetitoso.
Cris explodiu em uma gargalhada gutural. As escamas fruta cor sob sua pele brilhavam com os raios de sol.
-Não parecem mesmo. –Ele maneou a cabeça e gesticulou para nós de um jeito deliberado –Penas e pêlos são particularmente nojentos!
Edric exalou aliviado.
-Então quais são as regras desse jogo? –O lobo tentou parecer descontraído.
-Serão seis contra seis. –Cris disse de forma simpatica –Ao todo seremos doze jogadores, mas terão apenas seis bolas de água. O intuito é atingir o máximo de adversários, eliminando-os.
-Ou seja, quem estiver molhado perde, quem estiver seco, ganha? –Nerian ponderou por um momento, observando as criaturas semi aquáticas.
-Sim. –Cris estava eufórico –Desde que vocês usem apenas as bolas de água que fazem parte do jogo.
-Parece bem simples –Nerian comentou e olhou para mim.
-È muito simples. –Tâmia disse, jogando os cabelos loiros para trás da cabeça, em um movimento fluido –E muito divertido também.
-Se ganharmos á jóia é nossa? –Edric quis se certificar.
-Exatamente. –Tâmia assentiu com a cabeça.
-Estamos de acordo? –Edric passeou o olhar por sobre todos nós, buscando a nossa confirmação.
Todos nós assentimos. Na verdade não tínhamos outra alternativa, já que o motivo de nossa estadia ali na praia, era exclusivamente por causa da jóia que Tâmia guardava.
-Precisamos apenas ser ágeis então? –Aelle ergueu a mão no ar –Posso usar minhas asas, ou tenho que ficar com os pés na areia?
-Pode voar luzido. –Tâmia olhou para Aelle –Mas não pode sair do circulo, nem ultrapassar a altura dos rochedos.
-Entendido. –Aelle maneou a cabeça, seus olhos azuis analisaram a altura permitida –O espaço é bom.
-Aqui é ótimo! –Cris alargou um sorriso nos lábios –Vamos começar!

Eles dividiram estrategicamente ao meio o espaço circular em que estávamos.
Demarcando com uma linha profunda na areia limpa. Nós ficamos ao lado direito da linha, e Tâmia e sua equipe ficaram do lado esquerdo.
Flutuando sobre o meio do espaço circular, haviam seis bolas de água, teríamos que ser rápidos o bastante para conseguir pegar a maioria das bolas, e atingir as criaturas semi-aquaticas a nossa frente.
-O objetivo é não ser atingido, certo? –Aelle parecia animado.
-Certo. –Edric disse –Mas para ganhar também temos que eliminar o adversário. Ou seja, temos que pegar aquelas bolas.
-Acho que vai ser divertido. –Eu sorri olhando ao redor.
Nerian e Aelle sorriam para mim.
Anabel entretanto, parecia estar pensativo. Ora ou outra ele e Cris faziam uma troca de olhares silenciosos. Anabel apenas se posicionou atrás, na lateral esquerda e esperou que o jogo começasse.

Quando uma criatura semi-aquatica assoviou de forma estridente, anunciando o inicio do jogo, eu quase não acompanhei quando seis bolas de águas atingiram Kayne de uma vez só, deixando o semi-gato totalmente ensopado.

-O gato está fora! –Tâmia anunciou animada –Agora faltam apenas cinco.

Todos nós ficamos parados olhando para Kayne pingando água, havia sido tão rápido, que mal acompanhamos o que havia acontecido.
Eles haviam se movido tão rapidamente, que eu mal percebi quando pegaram todas aquelas bolas. Muito menos quando atingiram Kayne.
-O que foi isso? –Edric pareceu desnorteado ao lançar um olhar preocupado por sobre todas as criaturas semi aquáticas ao nosso redor.
-Sua fonte energia deve estar enfraquecendo se você não conseguiu acompanhar nossos movimentos. –Tâmia lançou um olhar malicioso na direção do lobo, e sorriu debochadamente –Edric de Atalaia.
-Vou ficar mais atento da próxima vez. –O lobo resmungou baixinho, e desviou o olhar de Tâmia.
Ela riu alto e então piscou para mim. Outro arrepiou percorreu pelo meu corpo. Se aquela serpente estivesse com a intenção de me devorar, era só arrancar as minhas asas e se livrar das penas.

-Kayne! –Edric exclamou alarmado, olhando para um semigato todo encharcado, se afastando da área circular. –Fique no sol, sobre as rochas para se secar.
-Não se preocupe, senhor Edric. –Kayne sorriu constrangido –Eu sei me cuidar.
-Eles são rápidos. –Aelle estreitou o olhar para as criaturas semi-aquaticas a nossa frente. –Mas pelo menos agora eu entendi a dinâmica do jogo.
-Prontos para a segunda rodada? –Tâmia sorriu maliciosamente para todos nós, o resto de sua equipe também sorria. Aparentemente, para eles, nós não tínhamos a menor chance de vencer.
-Precisamos de uma estratégia. –Nerian murmurou, e então olhou para Aelle que assentiu.
-Nós dois voamos e pegamos as bolas. –O luzido disse, e então se voltou para Edric. –O resto se esquiva.
-Anabel será a nossa melhor aposta aqui. –Edric maneou a cabeça apontando para o macho loiro que apenas nos observava em silencio, como se não quisesse participar.
-O que isso quer dizer? –Eu perguntei, mas de repente, houve um novo assovio estridente que se propagou pela praia, eu saltei para o ar sem pensar duas vezes.
Nerian e Aelle haviam conseguido pegar duas bolas. Mas Edric já havia sido atingido por outras quatro bolas de água.
-O sentinela está eliminado! –Cris anunciou com satisfação, e as outras criaturas semi aquáticas ao nosso redor comemoravam animadamente.
-Faltam apenas quatro deles. –Uma das criaturas semi aquáticas olhou para cima, na minha direção. Era uma fêmea com a pele incrustada. Se aquilo fosse algum indicio, eu era o próximo alvo.
-Vamos garotos! –Tâmia parecia entediada ao olhar para Nerian e Aelle, que estavam parados aleatoriamente no meio do circulo de areia –Vocês vão jogar essas bolas de água, ou vão ficar aí, apenas nos olhando?
Nerian e Aelle se olharam por alguns segundos, e então eles se aproximaram, um do outro. Eu pousei na areia vagarosamente, um pouco mais atrás.
Eles tinham duas bolas para jogar, era a chance de eliminar algum adversário. Nerian sibilou alguma coisa para Aelle que assentiu. E eu pude reparar que Cris sorriu o canto dos lábios como se tivesse ouvido o que quer Nerian havia sibilado ao luzido.
Nerian e Aelle se prepararam, de repente Aelle saltou, e Nerian se movimentou tão rapidamente, que eu mal percebi quem era o alvo deles.

Nerian atirou a bola na direção de Cris. Cris abriu as pernas em um ângulo de 180°, deslizando completamente até a areia. Rapidamente se esquivando da bola de Nerian, que se estourou ao tocar a areia.

Aelle rodopiou no ar, e atirou a bola que estava em sua mão na direção de outra criatura semi aquática, mas para a minha surpresa a criatura não fez menção de se mover, ela apenas esticou o braço incrustado, por onde a bola de Aelle deslizou rapidamente sem estourar, saltando novamente para o ar. E quando percebi, eu estava com o rosto todo molhado.

-A lúrida está eliminada! –Tâmia cantarolou piscando para mim. –Faltam apenas três.
Eu saí do círculo de areia e caminhei até onde Kayne e Edric estavam, encostados em um rochedo íngreme.
-A bola não estoura quando toca a superfície da pele deles. –Comentei torcendo o meu cabelo.
-Nós não vamos conseguir essa jóia, Sr Edric. –Kayne balançou a cabeça negativamente, enquanto esfregava uma manta escura envolta do pescoço felpudo.
-Mas nós precisamos dela. –Edric rosnou nervoso, ao olhar para Tâmia, que comemorava animadamente junto com as criaturas semi-aquaticas.

Quando as seis bolas de água surgiram flutuantes no meio do circulo, Nerian inesperadamente ergueu as mãos pedindo para que todos esperassem.
-Preciso de tempo1 –Nerian gritou de repente.
-Vão desistir? –Cris perguntou, havia uma pontada de decepção em sua voz.
-Não. –Nerian sorriu sem humor e apontou a mão para o lobo ao meu lado, fazendo sinal para que Edric fosse até ele.
-O sentinela já foi eliminado. –Tâmia avisou –Ele não pode voltar a jogar.
-Eu preciso de um interprete. –Nerian disse simplesmente –E alguns minutos com a minha equipe, antes de voltarmos a jogar.
-Não há como vocês vencerem de qualquer forma.–Tâmia deu de ombros afastando-se.
Edric caminhou até perto do circulo, mas não entrou. Observei quando Nerian fez menção para que Aelle e Anabel se juntassem a eles. Eles conversaram por longos minutos, até que se separaram novamente. Edric continuou próximo ao circulo.
Anabel se transformou em sua forma de serpente branca, ocupando quase todo o circulo de areia.
-Acho que Nerian elaborou uma estratégia. –Eu sorri para Kayne, que estava atento a movimentação dentro do circulo.
-Espero que sim, estou ansioso para ir embora dessa praia. –O semi gato resmungou ainda esfregando a manta sobre o seu pêlo parcialmente molhado.

-Ora, ora... –Tâmia sorriu o canto da boca, e olhou atentamente para a extensão longínqua de Anabel. –Você até que é bonitinha.
Anabel deixou sua língua escapar por entre os lábios fechados, sem tirar os olhos dourados de cima de Tâmia.
-Eliminem os anjos! –Cris deu o comando, ao receber um olhar sugestivo de Tâmia.

Anabel movimentou-se vagarosamente, embolando-se de tal maneira que seu corpo parecia ter formado um casulo envolta dela mesma. Nerian e Aelle recolherem as asas rente as costas, e se esconderam atrás de Anabel.

-Eles vão usá-la como escudo? –Kayne ficou confuso.
-É o que parece... –eu murmurei quase que para mim mesma, olhando a maneira como Anabel parecia ter criado um esconderijo por baixo das voltas que seu corpo formava.

Quando o assovio estridente de uma criatura semi aquática soou alto pela praia, a equipe de Tâmia pegou todas as bolas de água. Entretanto, Nerian, Aelle e Anabel não se moveram um centímetro sequer de suas posições.
Anabel parecia prestes a dar o bote, a maneira como sua língua bifurcada entrava e saia de sua boca, dizia que ela estava atenta e preparada. Seus olhos dourados não oscilavam enquanto ela olhava para cada criatura semi aquática a sua frente. Era quase uma afronta implícita.
-Esperem! –Tâmia levantou a mão para o alto, e então nenhuma bola de agia foi arremessada.

Nerian e Aelle estavam escondidos atrás de Anabel.

-Vão ficar escondidos? –Tâmia cantarolou andando de um lado para o outro, observando Anabel. Nenhuma das criaturas semi aquáticas se moveu, como se esperassem uma ordem para poder fazer isso.
-Estamos esperando vocês atirarem as bolas. –Aelle gritou provocativamente de trás de Anabel.

Eu reparei quando Cris olhou para Tâmia, esperando apenas a ordem de ataque. Tamia maneou a cabeça para Cris, que fez sinal para o resto de sua equipe, e de repente todas as bolas de água seguiram na direção de Anabel.

Anabel se movimentou tão depressa que eu mal pude acompanhar, ela levantou a cabeça, e rastejou pela areia tirando a proteção de Nerian e Aelle que saltaram rapidamente para o alto. Anabel, fez uma espiral fechada com o próprio corpo, e acolheu todas as bolas que atiraram nela, fundindo-as sem estourar.
A praia ficou em total silencio.
-A água não estoura quando toca a pele de cobra de Anabel. –Kayne sorriu alegremente.

Anabel agora possuía uma bola de água com aproximadamente cento e vinte centímetros de diâmetro.
-Oh, ela criou uma bola maior... que fofo! –Tâmia zombou, seus olhar amarelo estava atento –Esse era o plano de vocês?!
Todas as criaturas semi aquáticas da praia riram.
-Esse não parece ser um bom plano. –Kayne bufou desanimado ao meu lado.
-Realmente não parece ser. –Eu murmurei. –Mas o que eles querem fazer com aquela bola?

Antes que Kayne pudesse dizer alguma coisa, Anabel se movimentou, e a bola de cento e vinte centímetros deslizou rapidamente pela extensão do seu corpo, rolando rapidamente em direção a ponta da calda dela. Anabel movimentou a calda lançando a bola para o alto, onde Nerian esperava com uma adaga na mão.
Quando a bola atingiu a ponta da adaga de Nerian, a bola de água explodiu, e então Aelle movimentou as asas com rapidez, para que a água fosse soprada por sobre a equipe de Tâmia.
As cinco criaturas semi aquáticas ao redor de Tâmia correram para protegê-la, formando uma espécie de casulo sobre ela.
Todos ficaram molhados.

Nerian e Aelle pousaram no chão, cumprimentando Anabel.

Quando as criaturas semi-aquaticas se afastaram de Tâmia, todos estavam molhados, exceto ela.
-Cinco criaturas semi-aquaticas eliminadas de uma vez só! –Edric cantarolou animadamente ao olhar para Tâmia –Acho que igualamos nossas chances.

Enquanto sua equipe se retirava do circulo, Tâmia sorriu para Edric.
-Tenho que admitir... –Ela se aproximou batendo palmas vagarosas –Seus anjos são inteligentes.
-Não se esqueça da minha serpente. –Edric ergueu a cabeça apontando o focinho para Anabel –Foi ela quem fez todo o trabalho árduo.
-Sim, de fato. –Tâmia deu de ombros, e se afastou.

Houve outro assovio, e surgiram apenas duas bolas de água flutuantes no meio do circulo de areia.

Tâmia rapidamente pegou as duas, e atirou contra Aelle e Nerian. Eliminando-os.
-Os dois anjos estão fora! –Tâmia avisou com seriedade –Agora somos apenas eu e a cobra inferior.
-Boa sorte Anabel. –Aelle passou por Anabel, oferecendo-lhe um sorriso encorajador.
Nerian e Aelle saíram do círculo de areia e vieram se juntar a mim e Kayne.
-Anabel é a nossa ultima chance de ganhar esse jogo. –Kayne jogou uma manta para que Aelle se secasse.
-Edric confia nela. –Nerian comentou enquanto se escorava contra a rocha íngreme, ficando de frente para o sol –Nós devemos confiar nela também.

Houve outro assovio estridente, e então Tâmia se transformou em serpente também. No meio do circulo surgiu uma única e imensa bola de água flutuante. As duas serpente apenas se olharam, movendo-se vagarosamente, sem se quer se aproximar da bola flutuante de aproximadamente noventa centímetros de diâmetro.

-Eu não vou conseguir dormir por um longo tempo depois de observar essas duas serpentes juntas. –Kayne murmurou baixinho, o pêlo de seu corpo se arrepiou.
-Porque será que Anabel mudou de forma ontem á noite? –Aelle jogou a pergunta no ar, ainda olhando para as duas serpentes que se moviam vagarosamente.
-Cris é a resposta. –Kayne disse, ainda sem tirar os olhos das serpentes.
-Eu reparei que eles ficaram um bom tempo juntos ontem. –Aelle sorriu.
-Vocês dois poderiam parar de falar da vida dos outros. –Nerian murmurou, pegando uma manta para se secar.
Kayne e Aelle deram de ombros, mas ficaram em silencio.
Anabel serpenteava de um lado, enquanto Tâmia serpenteava do outro, ambas se encaravam, pareciam estar se avaliando, entretanto nenhuma das duas serpentes se aproximava da bola de água que flutuava entre elas.

Então, houve outro assovio estridente, e Tâmia se ergueu, jogando o corpo comprido para laçar a bola de água, no entanto, Anabel se ergueu também e se lançou contra Tâmia. Embolando-se uma na outra.

Ambas as serpentes circundaram a pequena bola com seus corpos, enroscando-se uma na outra, no centro do circulo de areia.
Um calafrio percorreu por todo o meu corpo. Elas eram serpentes enormes prestes a se estrangularem até a morte.
Elas iam se esgueirando, espremendo uma a outra envolta daquela bola.
-Eu não sei como aquela bola não estourou ainda. –murmurei baixo, sem poder tirar meus olhos das duas serpentes.
-Se estourar vira empate. –Nerian comentou –E nenhuma das duas quer isso.

De repente, elas se separaram, e ambas pularam na areia, serpenteando para longe da bola. Tâmia rapidamente voltou a sua forma de fêmea loira, firmando os pés descalços na areia.
-Vamos ver do que você é capaz, Anabel! –Tâmia gritou eufórica com um enorme sorriso nos lábios.
Anabel então brilhou timidamente, transformando-se na gentil garotinha de cabelos cacheados.
Havia um sorriso no rosto de Anabel, quando ela percebeu que Tâmia estava se divertindo.
Tâmia gesticulou as mãos no ar e então aquela imensa bola de água se transformou em várias bolas flutuantes entre elas. Tâmia agarrou uma delas e atirou com força na direção da pequena Anabel, que se esquivou majestosamente.
-Acho que precisamos de uma torcida aqui. –Edric gritou, fazendo sinal para que nós nos aproximássemos de onde ele estava.

Tâmia começou a atirar as bolas sem intervalo na pequena Anabel, que se esquivava das bolas com maestria. Sua testa estava escorrendo suor, e seus cabelos dourados já lhe grudavam pelo rosto molhado.
-Anabel! Anabel! Anabel! –Kayne começou a pular entusiasmado quando chegamos perto de Edric.

Quando restou apenas uma única bola de água flutuante na frente de Tâmia, ela a agarrou e encarou Anabel.
-Fim de jogo garotinha. –Tâmia arfava, mas o sorriso satisfeito era evidente em seus lábios cor de rosa.
Anabel parou de se mover e encarou Tâmia, enquanto seus pequenos pés se firmavam na areia.
Tâmia sorriu antes de rodopiar o corpo e atirar a bola na direção de Anabel.
Anabel ficou parada onde estava, com os olhos fixos na bola que girava rapidamente em sua direção. De repente a pequena Anabel se agachou e em um movimento fluido estendeu os braços, e inesperadamente, agarrou a bola de água entre as mãos sem que ela estourasse.
-Anabeeeeeeeel! –Kayne e Aelle surtaram de empolgação.
Tâmia ficou imóvel, e então jogou os braços para o alto, sorrindo para Anabel.
Era um gesto de rendição.

Anabel correu depressa, e quando chegou à linha que dividia o circulo, ela girou o corpo e atirou a bola contra Tâmia, que apenas fechou os olhos e esperou que a bola a atingisse. A bola estourou contra o peito de Tâmia, encharcando-a imediatamente.

-Anabel! Anabel! Anabel! –Kayne e Aelle pulavam perto dos rochedos íngremes.
-Nós ganhamos! –Edric exalou aliviado.

Anabel e Tâmia apenas se olhavam amistosamente durante alguns instantes. Nenhuma delas se moveu.

-Tâmia se deu por vencida. –comentei com Nerian ao meu lado.
-Anabel mereceu a rendição dela. –Nerian disse, seus olhos violetas se voltaram para mim –Não houve trapaça.
-Finalmente vamos embora dessa praia! –Kayne gritava eufórico se agarrando nos braço do luzido.
Edric gargalhou alto.

-A pérola é sua Anabel. –Tâmia se aproximou de Anabel, colocando o colar envolta de seu pequeno pescoço.
Anabel apenas anuiu com a cabeça em agradecimento.
-Eu agradeço Tâmia por colaborar conosco –Edric se voltou para Tâmia.
-Não me agradeça. –Tâmia deu de ombros –Agradeça a Anabel e ao Cris, que me fizeram mudar de idéia.
-Mas e o jogo? –Edric estreitou os olhos.
-Assim como Priam, eu estou ficando velha e entediada. –Tâmia sorriu o canto da boca –Agora saiam da minha praia, antes que eu mude de idéia.