Flavia não acordou quando Emiliano sentou-se na cama. O sinal havia soado, aquele assobio da coruja-diabo, a marca de seus homens, aquele assobio que só eles sabiam imitar e reconhecer, um assobio para tremer e temer, que emanava ódio, um chamado tão obscuro como o coração do coronel que há tanto tempo havia se apagado a luz.
Levantou-se devagar e antes de sair do quarto colocou a pistola na cintura e escondeu a adaga na bota, não era tolo o bastante para sair desprevenido.
Na porta do escritório quatro homens lhe esperavam, os conhecia há tanto tempo, seus cães mais leais, os que seguiam a risca as leis dos homens do coronel "Obediência, silencio, fazer sangue e não deixar rastros" e por isso, tinham acesso a sua casa á qualquer horário.
- O que descobriram sobre o médico? - O espião que havia chego da capital sorriu ao lhe entregar um envelope. Emiliano sorriu ao analisar os arquivos, replicas de pequenas pinturas de família, certidões de óbito e uma certidão de casamento, do casamento de Lucas.
Aprenderá com o tempo, com os machucados do passado a como ferir, saberia como destruir Lucas.
- E você o que descobriu? - Perguntou ao homem designado a seguir na cidade os passos do médico.
- Ele sai da pousada e vai para o hospital senhor, não parece ter nenhum contato suspeito com os homens do porto senhor, nada com que possamos colocá-lo atrás das grades.
Emiliano gargalhou então golpeou o rosto do homem, um golpe sem retaliação, por não lhe trazer nenhuma informação útil e por um comentário estúpido que o coronel não tinha paciência para ouvir.
Se quisesse colocar Lucas na cadeia já o teria feito, tinha crédito suficiente para forjar acusações, mas ele queria mais, queria destroçar a alma de Lucas, queria um preço justo por ajudar um padre negro em uma noite fria, por ousar afrontar Emiliano na frente daquela igreja.
- Ele se encontrou com uma moça essa noite. - O homem não soube se falou por lealdade ao coronel ou por vingança pela bofetada.
- Ora ora, finalmente você disse algo significante. Conte-me mais sobre essa mulher, conte-me se ela é casada e eu contarei como será divertida a nossa vingança.
- Ela é sua filha senhor.
A sala silenciou. Até mesmo o inferno devia ter silenciado enquanto a única camada existente de bondade em Emiliano era estraçalhada.
Sua filhinha, sua menina, aquela que possuía seu sangue nas veias, uma degenerada, uma vadia nos braços daquele maldito doutor.
Por causa de Flávia não havia pego pesado com a menina a vida inteira, Fabiana cresceu tendo uma mão por cima. E quando a filha se voluntariou naquele hospital mesmo com sua desaprovação, ele acreditou que em breve sua mãe lhe arrumaria um casamento e ela desistiria daquela idiotice.
Mas o ninho de ratos havia corrompido Fabiana e agora além de acreditar em caridade, que cuidar doentes mudaria o mundo, Fabiana se tornará uma tola que também acreditava no amor.
Pior do que isso, se tornará uma vadia, que saia no meio da noite para encontrar-se com o homem que seu pai mais odiava.
Por um momento Emiliano olhou para o capanga que trouxe a noticia, que falou demais na frente de outros, que viu demais, e Emiliano enxergou Lucas.
Antes que o homem se desse conta o coronel lhe enterrou uma adaga ao peito, o homem caiu, Emiliano lhe socou o rosto, chutou e esbravejou. Então ordenou que se livrassem do corpo agora deformado por pauladas e ossos fora do lugar. Matou o homem sem remorso porque ele sabia demais.
- Livrem-se do corpo, e que se sirva de lição caso contem o que aqui viram ou ouviram.
- Sim senhor. – Consentiram os capangas com medo nos olhos e um misto de luto pelo amigo e covardia no coração, talvez pena pelo o que aconteceria com Fabiana.
Emiliano subiu as escadas com passos firmes, se Flavia ouviu o barulho dos passos ou do que havia acontecido lá em baixo fingiu dormir e não saiu do quarto, como sempre fazia.
Caminhou até o quarto de Fabiana e ela não estava lá, também sabia como puni-la.
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O nazareno
Historical FictionNão é um romance qualquer, um mistério, segredos, uma tragédia e um amor diferente de tudo que você ja viu.