Ato IX

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Como conseguimos sair da sala e chegar ao meu quarto é um mistério inexplicável. Talvez depois o senhor Vinho possa nos dar o mesmo tipo de explicação que a dona Tequi sempre tenta dar quando algum casal se questiona ao acordar casado em Vegas.

Só sei que muito prontamente meu corpo foi meio que flutuando para a minha cama aconchegante, sendo devidamente espremido por outro corpo muito quente e másculo, que não perdeu tempo em mostrar que suas mãos eram tão hábeis quanto seus pés.

Claro que, no surto espontâneo do momento e também na hora que o pé dele, calçado com uma bota medonha e máscula, bateu inadvertidamente em um dos meus pés machucados, eu dei um grito que não pôde ser afogado pela boca suculenta de Josh.

Era uma merda. Digo, gritar enquanto você está sendo beijada. Não para mim. Devia ser uma merda maior para o cara em questão, que recebeu todo o grito acústico dentro da sua cavidade oral.

— Aaaaaaaaaiiiiiii!

Graças ao bom Deus, Josh parou imediatamente para averiguar o motivo de tamanho alvoroço da minha parte.

— O que houve? Eu te machuquei? — perguntou preocupado.

— Seu pé, ou melhor, seu sapato filho da puta machucou meu pé... — choraminguei, e vou culpar o vinho de novo, porque normalmente eu não era assim. Ou seja, eu não sou um bebê chorão e catarrento que resmunga por qualquer coisa. Haja vista eu aguentar um treino frenético que colocou meus pés naquele estado calamitoso. O que nos levou àquele momento vexaminoso, onde toooooodo casal que se preza, na face da Terra, deveria já estar na terceira base, provavelmente, chegando ao momento final e derradeiro, se o momento do arroubo fosse urgente, como parecia até momentos atrás. Mas eu estava curtindo o clímax glamouroso?

Claro que não.

Parei tudo em prol da dor aguda e excruciante que estava sentindo naquele momento, tudo por causa de um esbarrão não intencional.

Merda.

Tanto tempo para estar nos braços de Josh Beauchamp e aquilo tinha que acontecer.

Minha vida era um espetáculo de tragédia grega. Cheia de episódios sórdidos de micos nunca antes imaginados pelo homem.

— Acho que a sua bota acabou de arrancar o que restava de pele lascada do meu pé — gemi novamente. — Mas tudo bem... eu vou apenas respirar fundo. Você fica aí, quietinho, sem fazer absolutamente nada. Em algum momento, tenho certeza de que vou sentir alívio. Talvez daqui a três semanas — brinquei e ouvi seu riso suave.

Muito surreal. Josh Beauchamp sendo carinhoso.

Josh Beauchamp sendo fofo.

Josh Beauchamp sendo romântico e galante.

Josh Beauchamp se declarando e me agarrando na sequência.

E agora, Josh Beauchamp rindo.

Meu mundo estava louco. Ou eu estava no buraco do coelho da Alice. Era um coelho, certo?

Eu tenho certeza de que havia um gato safado e alguns objetos alucinógenos naquele conto de Lewis Carroll...

— Meu Deus, me perdoe, Gaby. Deixe-me ver. — Ele tentou se levantar, mas enlacei seu pescoço, mantendo seu corpo ali, exatamente onde estava.

— Não. Tudo bem. Respire comigo, Josh.

Sua testa encostou à minha, e eu já disse o tanto que achava aquele gesto super fofo nos livros de romance que eu lia? Não? Estou dizendo agora. Eu acho extremamente fofo. Um gesto tão simples, mas tão carregado de significado. Onde palavras não podiam ser ditas, mas o simples ato de estar perto, respirando o mesmo ar, fosse mais do que suficiente.

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