CAPÍTULO 7

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Any

Josh estava de olhos fechados e as mãos esticadas ao lado do corpo.

Pisquei uma vez, sentindo meus batimentos cardíacos desacelerarem. Perdi o controle. Odiava me sentir assim. Odiava sentir meus olhos úmidos por causa disso.

O pior dia da minha vida acontecera há muitos anos e eu já tinha superado.

Não ficava lamentando ou chorando pelos cantos. Graças a Deus, já não sentia tanto medo toda vez que algum homem cruzava meu caminho numa rua escura.

Não, eu não era assim. Eu levava uma vida normal.

Eu gostava de sexo, de carinho, de contato físico. Gostava do sexo masculino e muito. Era extrovertida, sorridente, feliz. Ser colocada de bruços era a única coisa que me tirava o chão. E eu nunca, em hipótese alguma, fazia sexo anal.

Respirei fundo mais uma vez e toquei o rosto de Josh. As pálpebras tremeram e os olhos azuis fitaram os meus.

— Desculpe — pediu pela enésima vez.

Eu recolhi minha mão trêmula e encarei a cabeceira da cama. Tinha duas opções: continuar deitada ali, entristecendo nosso dia ou voltar aos meus planos daquela manhã. Abri um sorriso receoso e me sentei na cama, recuperando meu orgulho. Josh me olhou desconfiado, como se temesse que a qualquer momento eu me desfizesse em cacos.

— Já estou bem. — Revirei meus olhos e prendi meu cabelo num rabo de cavalo frouxo. — Só acho válido avisar que, da próxima vez que você fizer isso, cortarei seu amiguinho com o facão da cozinha.

Ele segurou minha mão e a beijou. Argh! Estava parecendo um dramalhão mexicano e eu tratei de dar um tapa em seu braço.

— Pare! Seja homem! Não quero que comece a chorar. Também não quero tocar no assunto, engula as suas palavras e vamos fingir que nada aconteceu.

Josh esfregou o rosto ainda inchado do sono e puxou um travesseiro para colocar debaixo da cabeça.

— Fiquei escrevendo até quase cinco da manhã, então fale logo o que queria falar para que eu possa voltar a dormir.

E essa era a vida dele atualmente, sendo um escritor de sucesso. Podia dormir e acordar a hora que quisesse sem que ninguém ousasse reclamar. Suspirei, ansiando por uma vida boa que nem aquela. Mas a lanchonete me esperava.

Levantei da cama e peguei uma camisa amarrotada que estava no chão, jogando-a sobre a cabeça do seu dono.

— Folgado! Espero que descanse bastante, pois eu vou levá-lo para sair hoje à noite.

Josh afastou a camisa e me encarou com um sorriso preguiçoso.

— Não vou a lugar algum — declarou.

— Vai sim, senhor! Você vai vestir uma roupa que não esteja furada e vai sair comigo. Nem que eu precise arrastá-lo.

Saí do quarto dele e bati a porta com força, para deixar claro que a última palavra era a minha.

                           ⭐⭐⭐

  O borrifador que mamãe espirrou sobre o balcão alcançou meu nariz e senti pinicar. Espirrei três vezes seguidas porque odiava aquele cheiro forte de produto de limpeza e olhei feio para ela.

— Outras coisas cheiram pior que isso — disse a minha coroa, torcendo a boca.

— Como o quê? Naftalina?

Ela abriu um de seus encantadores sorrisos que fazia todos os clientes se tornarem frequentadores assíduos e afagou meu cabelo. Virei o rosto e inspirei profundamente, procurando um pouco de oxigênio que não estivesse contaminado.

— Bom dia! — o homem na minha frente nos cumprimentou e pegou a carteira. — Vou querer um expresso duplo e um croissant de queijo.

— Exatamente o que você pediu nos últimos três dias — respondi, entediada, digitando o pedido no computador. — Quanta originalidade.

— Any Gabrielly ! — mamãe me chamou pelo nome todo com uma voz inconfundível de quem queria me puxar pela orelha e dar um tapa forte na minha bunda. Ela olhou para o cliente e uniu as mãos. — Peço desculpas por minha filha e sua língua grande demais para caber na boca. O seu pedido hoje é por conta da casa.

Isso significava que sairia do meu salário. Bufei e puxei a nota fiscal. Forcei um sorriso para o cliente, que ainda me encarava e sorria de volta. Minha mãe não tinha entendido que ele só apareceu na lanchonete nos últimos dias por minha causa, não pelo expresso, muito menos pelo croissant.

Eu já tinha percebido que ele sempre pegava o pedido e se sentava na mesa mais próxima, intercalando olhares entre mim e o celular. Mas não estava interessada. Mesmo com aqueles fartos cabelos negros, um maxilar marcante e ombros largos.

Quando minha mãe se afastou para preparar o café dele, o homem apoiou os braços sobre o balcão e ofereceu o celular a mim.

— Se me der seu telefone, prometo que amanhã faço um pedido diferente.

— Que tal você amanhã fazer um pedido diferente e eu não jogar o celular na sua cabeça? — perguntei, rodando o aparelho fino nas minhas mãos.

O homem do croissant enfiou as mãos nos bolsos da calça e abriu outro sorriso. Ele estava atrapalhando a fila, que tinha aumentado desde que começamos o papo de maluco.

— Posso ficar aqui esperando — avisou, ciente de que havia outras pessoas para serem atendidas.

Bufei, mas digitei meu número naquela droga de aparelho porque não queria que minha mãe oferecesse café grátis para toda a clientela. Ele ligaria e eu não atenderia. Simples assim.

                               °°°

  Usei a hora do almoço para colocar meu plano em prática. Uma das vantagens de ter sido criada naquela região e ainda trabalhar ali, era que todos me conheciam. Por isso não tive problema algum ao adentrar o sobrado que servia de boca de fumo do bairro e procurar pelo X-Dog.

Não era esse o nome dele, claro. O latino de quase dois metros de altura e um corpo coberto de tatuagens — muitas adquiridas em algumas prisões — abriu um sorriso quando subi até o segundo andar e acenei para ele.

— Any! — O homem olhou em volta, como se verificasse que eu não flagraria nada suspeito. — O que manda?

Veja bem, eu não era louca. Estava ali porque X-Dog era um cliente assíduo da lanchonete. Meus pais sabiam muito bem qual a profissão dele e o tratavam com cordialidade porque cliente é cliente. Por isso, X-Dog sempre foi gente boa com minha família e eu tinha certeza que, justamente por causa dele, nós nunca fomos assaltados.

Além disso, ele era uma pessoa a quem devíamos um enorme respeito.

Quando eu fui violentada no cinema, o grandalhão colocou toda a gangue dele para revirar o bairro à procura do infeliz. Infelizmente, ele nunca foi encontrado.

— Oi X! — sorri, cumprimentando-o com meu punho fechado de encontro ao dele. — Tem um minutinho pra mim?

Ele me olhou da cabeça aos pés, estreitando os olhos, a cabeça inclinada para o lado.

— Não vou te vender drogas, Any.

— A única droga que consumo se chama refrigerante — esclareci, cruzando meus braços e olhando firme para o alto, onde ficavam os olhos dele. Precisava parecer uma montanha? — Quero tirar uma dúvida, só isso.

Ele coçou o queixo e me avaliou por alguns segundos. Revirei meus olhos e estalei os dedos para chamar sua atenção.

X-Dog suspirou e abriu a porta de um quarto, onde dois caras esparramados num sofá nos encararam. Quando se deram conta de que o chefe estava ali, deram um pulo e saíram para o corredor.

Sedutora amizade - ADAPTAÇÃO Beauany Onde histórias criam vida. Descubra agora