Alice
Raku se foi, deixando-me totalmente confusa, sem entender suas palavras enigmáticas. "Você não percebe nada", ele disse, como se eu, uma garota de 12 anos, fosse capaz de decifrar esse quebra-cabeça! Revirei mentalmente as palavras dele, tentando encontrar algum sentido oculto, mas a frustração só aumentava.
— Ah, que raiva! — exclamei em frustração, tentando dissipar a confusão que tomava conta de mim. Meus pensamentos eram um emaranhado de perguntas sem respostas. O que ele queria dizer? Por que sempre tenho que lidar com esses mistérios?
Enquanto eu tentava processar a partida abrupta de Raku, percebi a aproximação de alguém. Desesperadamente, busquei disfarçar a devastação estampada em meu rosto e conter as lágrimas que ameaçavam transbordar sem motivo aparente.
— Alice! — A voz de Aoi ecoou.
Aoi? Ai, não! Se ele me encontrar assim, estou ferrada.
— Ah, você está aqui! Onde diabos você se meteu? Procurei por você por toda Tóquio, morrendo de preocupação. — Aoi resmungou, expressando uma preocupação genuína. Abaixei minha cabeça, evitando seu olhar.
— Desculpe. — Sussurrei, mantendo em segredo a confusão que dominava meu interior. Não quero que ele saiba, mas... estou completamente perdida.
— O que está acontecendo, maninha? — Aoi perguntou, preocupado.
— Nada. — Respondi friamente, lutando para conter as lágrimas que insistiam em escapar. Meu coração martelava no peito, e eu me sentia como uma peça solta num quebra-cabeça, sem encaixe.
— Isso tem a ver com o Raku, não é? — Aoi falou, sentando-se ao meu lado. Como ele sempre consegue perceber as coisas tão rápido?
— Tem! — Exclamei com uma tonalidade mais alta, a frustração borbulhando em cada palavra.
— Vamos para casa. Você me conta o que aconteceu no caminho. — Aoi disse, segurando minha mão e me ajudando a levantar. Não hesitei, segurando firme como se ele fosse o único porto seguro naquele momento turbulento.
Caminhamos em direção à casa. Aoi empurrava minha bicicleta com uma mão, enquanto a outra repousava sobre meus ombros. Eu me esforçava ao máximo para conter as lágrimas, mas ainda assim sentia cada gota escorrendo silenciosamente de meus olhos.
— Não quer me contar o que aconteceu agora? — Aoi perguntou, olhando para mim.
— Você está indo para o lado errado! Deveria ter virado duas esquinas atrás. Vamos virar na próxima. — Tentei desviar o assunto, disfarçando minha tristeza. Não queria despejar meus sentimentos nele, mas a simples presença dele já era reconfortante.
— O quê? Sério? Eu jurava que estava indo pelo caminho certo. Droga! — Aoi exclamou, perplexo. Ri brevemente, mas logo retornei ao meu estado melancólico. Continuamos a caminhar, a "próxima" esquina parecendo se distanciar cada vez mais.
— Não sei o que aconteceu entre você e o Raku, mas estou impressionado. — Aoi disse, surpreendendo-me.
— Como assim? — Perguntei, confusa, enquanto me afundava em pensamentos confusos.
— Eu também costumava vir para trás do templo quando nossos pais brigavam. Fico feliz que tenha encontrado meu antigo refúgio! — Aoi disse, sorrindo para mim. No entanto, sua expressão mudou rapidamente, e eu o encarava, tentando recordar como descobri aquele lugar até que a memória veio como um clarão.
Aoi olhou para mim com um misto de compreensão e surpresa. Suas palavras pareciam escolhidas com cuidado.
— Sabe, Alice, uma vez, quando eu estava indo para o templo depois de brigar com nossos pais, você me seguiu. Você achou esse lugar antes de mim. — Aoi revelou, e eu ergui as sobrancelhas em surpresa.
Minha mente retrocedeu, e lentamente as peças começaram a se encaixar. Lembrei-me daquele dia, as lágrimas silenciosas de Aoi, a tristeza que compartilhávamos mesmo sem trocar uma única palavra. Seguir Aoi até o templo foi como encontrar um refúgio onde a dor podia ser compartilhada em silêncio.
— Ah, é verdade... Eu me lembro. Foi aqui que eu te encontrei, não é? — murmurei, os olhos fixos no caminho à nossa frente. Aoi assentiu, sorrindo levemente.
Enquanto caminhávamos, uma conexão silenciosa se formava entre nós. O templo era mais do que um esconderijo; era um santuário para almas perdidas como nós.
— Às vezes, a solidão nos guia para onde mais precisamos estar. — Aoi comentou, como se lesse meus pensamentos. Sorri, sentindo uma compreensão mútua se aprofundar entre irmãos.
Fomos andando até em casa. Passamos por vários lugares, mas Aoi não parecia muito feliz. Ele estava calado e tenso, como se estivesse se preparando para algo.
Chegamos em casa. Entrei primeiro. Aoi estava guardando a bike. Nossos pais estavam sentados na sala, assistindo à televisão. Passei direto, sem dar bola para eles. Fui subindo a escada, mas parei quando ouvi a voz do meu pai.
— Onde você estava? — ele perguntou, se levantando e olhando fixamente para Aoi, que não estava com a cara nada boa.
— Fui ao cinema com a Alice e a Rin. Por quê? — Aoi respondeu, entrando e fechando a porta atrás de si.
— EU NÃO MANDEI VOCÊ VIR PARA CÁ PARA FICAR VADIANDO! QUE ISSO NÃO SE REPITA! — meu pai gritou, apontando o dedo para ele.
— E NÃO IRÁ! NÃO VIM PARA CÁ PARA TER QUE ATURAR SUAS INCOMPREENSÕES E MUITO MENOS PARA OBRIGAR MINHA MÃE A FICAR JUNTO DE VOCÊ, PARA SUA PRÓPRIA COMODIDADE. VOCÊ NÃO PARA PARA PENSAR QUE SEU EGOÍSMO ACABA MACHUCANDO E INCOMODANDO A VIDA DAS PESSOAS À SUA VOLTA? SE NÃO PERCEBEU, PERCEBA AGORA! — Aoi retrucou, encarando o meu pai nos olhos. Ele estava vermelho de raiva e de dor. Eu podia sentir que aquilo era um desabafo de muitos anos de sofrimento nesta casa.
— E NÃO SE PREOCUPE! COMO JÁ HAVIA DITO, VOU EMBORA O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL DESTA CASA! E VOCÊ JÁ SABE O QUE VOU LEVAR JUNTO! — Aoi completou, se referindo a mim.
Aoi saiu de lá em direção à escada, antes mesmo que meu pai pudesse falar alguma coisa. Não que eu achasse que ele iria falar alguma coisa depois dessas poucas e boas que ouviu. Ele ficou parado, sem reação, enquanto minha mãe tentava acalmá-lo.
Aoi começou a subir as escadas até que me viu. Fez sinal para eu subir também. Obedeci e fui andando em direção ao meu quarto. Não fiquei pasma com aquilo, muito menos assustada. Na verdade, estava demorando para os ataques de raiva do meu pai acontecerem.
Cheguei até a porta do meu quarto, permaneci parada em frente a ela até a chegada de Aoi. Abri, entrei e joguei minha mochila em um canto qualquer. Aoi entrou e logo fechou a porta.
Peguei uma toalha e estava indo em direção à porta, quando Aoi me puxou.
— Onde vai? — ele me perguntou, com uma expressão preocupada no rosto.
— Banhar, é claro! — falei, me virando para ele.
— Espera um pouco, só até eles saírem da sala. — ele falou, se sentando na minha cama.
— Já é quase uma da manhã, provavelmente eles já foram cada um para os seus respectivos quartos. Mas já que é um pedido seu, eu espero... — falei, rindo, o que fez ele rir de volta. Coloquei minha toalha na "cama dele" e me sentei ao seu lado. Estava ficando com sono e deitei, deixando meus pés para fora da cama. O silêncio estava me matando.
— Aoi... — falei, mas fui interrompida por ele.
— Sabe que dia é hoje? — ele me perguntou, esperando uma resposta com um sorriso lindo. Bem, eu não entendi a reação dele, mas respondi.
— Dia 14... Por quê? — respondi, logo fazendo a pergunta mais óbvia.
— Precisamos ir embora, próximo mês. Vou ligar para os meninos e resolver tudo. — ele falou
VOCÊ ESTÁ LENDO
Foi tudo culpa sua
Non-Fiction1 Temp - Em "Foi tudo culpa sua", embarque comigo nesta jornada tumultuada, onde a busca por uma nova vida desafia minha coragem de abandonar o passado. Descubra como a esperança surge das cinzas da adversidade, mesmo que isso signifique abrir mão...