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4 de agosto de 1986

Acordei com o barulho do despertador corroendo pelo meu quarto. Me levantei com pressa e com raiva, quase caindo da cama. Não acredito que já era segunda-feira de novo.

Saí de casa com a mochila nas costas e tentando colocar meus tênis enquanto andava. Incrível como eu faço tudo correndo antes de sair e mesmo assim consigo me atrasar.

Eu moro com meu pai em uma pequena casa, mas ele está sempre trabalhando, então parece até que eu moro sozinha. Eu não me importo. Nossa relação é ótima. Sei que ele faz isso pra conseguir uma vida melhor para mim e também sei que o salário dele não é dos melhores.

Minha mãe veio a falecer quando eu nasci. Nós não falamos dela aqui em casa. Talvez porque isso desperta lembranças que não fazem bem ao meu pai. Eu nunca me importei tanto em não falar sobre ela. Acabei me acostumando com o tempo.

Fui andando até a escola em passos rápidos. Em meus fones, tocava "Babooshka" da Kate Bush. Eu não consigo escutar essa música sem fazer alguma atuação, então as pessoas na rua me olhavam como se eu fosse maluca.

Eu vestia um jeans rasgado nos joelhos junto com um blusão preto de alguma banda. Acho que eu não tenho um estilo exato. Visto de tudo um pouco e meu guarda-roupa é uma bagunça.

Chegando na escola, fui direto ao meu armário pegar alguns livros. Graças ao meu bom senhor, o sinal ainda não havia tocado. Os alunos ainda conversavam e riam pelos corredores.

Fui surpreendida por uma pessoa chegando do meu lado e fechando a porta do meu armário me dando um leve susto. Me virei tentando manter a calma para ver quem ousava me interromper enquanto eu estava quase atrasada.

- Oi Becky. Como vai seu dia? 

- Oi Eddie. Péssimo, mas obrigada por perguntar. - Respondi abrindo meu armário novamente.

Eddie Munson é um garoto irritante e esquisito que ama me perturbar todos os dias. Todos os dias. Ele parece uma assombração. Não me deixa em paz nem por alguns minutos.

- Por nada. Posso te perguntar mais uma coisa?

- Não.

- Tá bom. Eu vou ser bem direto contigo. Preciso da sua ajuda.

- Não vai ter. Procura outra pessoa.

- É sério, gatinha.

Em um movimento rápido, o prendi na parede e o olhei de forma ameaçadora. Ele se assustou por um segundo, mas pareceu se divertir com a situação. Que idiota.

- Me chamou do que?

- Gatinha.

- Não me chama assim nunca mais. Entendeu?

- Entendi, gatinha. Seu armário ainda está brilhante, não é? - Riu.

Revirei meus olhos e o soltei. Por mais que eu tentasse, Eddie não iria parar. Ainda mais se eu demonstrasse não gostar disso. Peguei o resto de minhas coisas e saí dali, mas o garoto ainda andava atrás de mim.

- O que você quer, hein?

- Preciso do dever de matemática.

- Já disse pra procurar outra pessoa. Veio pedir pra mim por quê?

- Porque você é a melhor garota em matemática que eu conheço.

Parei de andar e me virei para ele, respirando fundo. Ele parou também, esperando minha resposta.

- Então procure um garoto.

O sinal tocou e eu saí dali pisando fundo. Percebi que ele revirou os olhos e foi na direção contrária da minha. Eu simplesmente odeio muito esse cara.

Fui até minha sala e me sentei na última cadeira do lado da parede. Ali era o lugar perfeito para ficar a aula toda desenhando e rabiscando o caderno sem ninguém perceber.

Sejamos sinceros: Eddie Munson é o tipo de cara que tem um parafuso a menos. Ele tem um grupo de RPG na escola, o Hellfire Club. Só por ele ter esse clubinho, ele acha que pode fazer qualquer coisa, mas está totalmente enganado.

Semana passada, ele jogou glíter rosa no meu armário. Isso porque ele sabe o quanto eu odeio rosa e coisas frufrus. Daí hoje ele ainda pergunta se meu armário está brilhante. Ele era um demônio disfarçado de rockeiro.

Me perdi tanto nos meus pensamentos que quando olhei para o papel que eu desenhava... O desenho era daquele garoto. O sinal tocou e eu amassei a folha, jogando no lixo logo em seguida.

O restante das aulas foram normais. Entediantes, mas normais. Eu me saio bem nas matérias da escola. Minha menor nota em toda minha vida foi um 7 e isso virou motivo de fofoca em todo o ensino médio.

Finalmente chegou o intervalo e eu me sentei sozinha em uma das mesas do refeitório. Eu não tenho muitos amigos. Não aquele tipo de amigo que você quer se encontrar com ele todo dia. Mas não estou reclamando. Eu até gosto disso.

Abri meus cadernos e fui fazer alguns deveres de casa enquanto comia um sanduíche de pasta de amendoim. Tive a impressão de que alguém me observava, então olhei em volta procurando o sujeito. Até que meus olhos se encontraram com os de Eddie que estava sentado em algumas mesas de distância.

O garoto sorriu para mim e subiu em cima da mesa, chamando a atenção de várias pessoas. Previsível. Começou a falar sobre as pessoas de algumas mesas, humilhando quem gostava de bandas, ciências, festas ou basquete. Ele fez uma careta para o capitão do time de basquete, tirando uma risada minha. Até que ele percebeu isso e voltou seu olhar para mim.

- Já imaginou ser boa em matemática e não querer compartilhar seu conhecimento com sua pessoa favorita?

Ele gritou enquanto olhava para mim. Automaticamente, meu sorriso saiu do rosto e eu o olhei com ironia, mostrando o dedo do meio. Pude ouvir ele rindo.

- Você podia ter pensado nisso antes de fazer meu armário se tornar a terra dos unicórnios. - Gritei de volta.

O garoto se ajoelhou ainda em cima da mesa e juntou suas mãos fingindo implorar pela minha ajuda.

- Por favor, rainha Becky Moore! Me ajude com meu dever de casa. Você é minha única salvação!

Arqueei minhas sobrancelhas e ri. Ver ele naquela situação com certeza é muito mais divertido do que terminar meu dever. Então, levantei minhas mãos em rendição.

- Só se você me pagar um chocolate.

O garoto deu um sorriso de orelha à orelha, desceu da mesa e correu em minha direção. Quando chegou perto de mim, estendeu sua mão com um sorriso travesso.

- Trato feito, então?

- Trato feito.

Ignorei sua mão estendida e voltei a fazer meus deveres. Eu não confio no Eddie. Provavelmente, tem um aparelho de dar choque caso apertem a mão dele. Ele só riu e saiu contente dali.

The Annoying Freak MunsonOnde histórias criam vida. Descubra agora