3.1 Megumi

908 126 104
                                    

Eu estou surtando.

Completamente e absolutamente pirado.

Odeio me sentir assim, como se meus sentimentos fossem controversos e confusos, mas nesse momento eles realmente estão desse exato jeito.

Não por alguma coisa, mas por alguém.

Yuuji Itadori me dá vontade de o socar. Quero tirar aquela porra daquele sorrisinho de canto na marra, quebrar seus dentes com um martelo.

Ele é sempre tão convencido, sempre tão bom em tudo. É cansativo pra caralho.

É por isso que agora me encontro basicamente espancando as cordas de minha guitarra. Ou tocando o mais agressivamente o possível.

Tocar sempre foi minha maneira de me expressar. Meu refúgio de todos os dias mais tristes e confusos. É quase uma terapia se você ver em termos psicológicos, pois o jeito que me acalma e me faz reorganizar meus pensamentos é apenas incrível.

Exceto que hoje mal funciona, pois 20% da minha cabeça pensa em como eu detesto me sentir inferior e os outros 80% pensam em como aquela camisa idiota ficava ridiculamente boa em seu corpo. Não que eu estivesse reparando. Eu não reparo em Yuuji. Eu mal sei algo sobre ele.

Desisto de destruir minha guitarra depois de umas boas tentativas e sento no chão, caderno de letras aberto em minha frente e um copo de água em minha mão. Deixo minha guitarra de lado e procuro trabalhar em alguma das letras que ainda precisa de ajustes e acordes extras. Também não consigo.

Isso se torna frustrante. Quero apenas gritar e botar a música mais alta do mundo em headphones e tentar não ouvir meus pensamentos. Não quando todos me levam a alguém que eu definitivamente não quero pensar.

Qual é, eu o odeio. O que está acontecendo agora?

Ok, não odeio odeio. Mas teve aquilo da sétima série...

Enfim. Não sou uma pessoa que perde a calma assim. Eu costumo ser agressivo, não confuso. Essa troca de personalidades me faz mal de estômago e não consigo assimilar o que mudou entre aquele jogo estúpido de basquete e agora. Provavelmente nada. Eu sempre estou surtando internamente, o que torna tudo um pouco mais engraçado.

Me levanto do chão, admitindo minha derrota iminente. Não queria acabar assim mas eu poderia fazer outras coisas. Tipo assar cookies. Eu definitivamente gostaria de alguns cookies.

Fico um tempo ainda parado em frente ao meu instrumento antes de só realmente desistir e ir para a cozinha, onde encontro meu pai.

Veja só, meu pai biológico mesmo, Toji Fushiguro era um homem complicado. Tinha quase uns dois metros de altura e duas vezes (ou três) o meu peso corporal em puros músculos. E ele quase nunca estava em casa, mas hoje estava, o que deveria ser a coisa mais rara do ano, depois de Yuuji ter tocado bateria depois de uns bons anos. Foda-se Yuuji.

– E aí, pai?

– Fala. To aqui assaltando a geladeira – ele aponta para o eletrônico aberto em sua frente – Vai fazer o que?

– Cookies. Geto vai passar aqui hoje?

Eu não suportava Suguru. Ele e seu filho (ou filha, depende do dia) estavam sempre bagunçando minha vida, se intrometendo em minha casa e rindo alto com meu pai. As vezes achava que apenas eu os via sendo chatos e me questionava se havia enlouquecido de vez. Mas não era o caso. Eles eram realmente insuportáveis. E passavam aqui religiosamente todo dia em que meu pai estava.

– Hm, não sei – pegou uma fruta da geladeira e se virou para mim. Sua regata deveria ser PP, pois estava exageradamente mostrando seus braços e peitoral – Por que?

– Quero saber se preciso me trancar no quarto ou não.

Alcanço o açúcar mascavo no alto da despensa e reúno o resto dos ingredientes na cozinha.

– Ei, filho, o que aconteceu? – papai fala, mudando de assunto.

– Nada, por que?

– Você só assa cookies quando fica depressivo. Você assa uma quantidade anormal de cookies.

– Ótimo, diz isso pra minha terapeuta – tentei brincar, mas meu pai estreitou seus olhos e me falou que não cairia nessa. Saco – Não é nada dessa vez. Eu só tô pensando demais.

– Ok então... Mas se precisar eu tô aqui. Ou não hoje, pelo menos. Vou sair rapidinho agora de noite.

Rapidinho quer dizer ficar fora a noite toda.

Suspiro sentindo meus pulmões quase se tocarem de tanto ar que botei neles. A fraca tensão se esvai e finjo um sorriso nada convincente para o mostrar que tudo bem por mim, mesmo não estando.

– Trabalho de novo? – indago meio desanimado, colocando os ingredientes num bowl.

– O de sempre.

Assinto.

Minha vida toda tem sido assim. Meu pai é "presente", o que significa que ele está lá para mim quando o convém. O problema é que nunca convém, o que torna situações como essa de agora tão pouco frequentes que me sinto até receoso toda vez que vou falar com ele.

Não o culpo 100%. Ele é militar de uma patente alta e forças especiais, o que o torna requisitado. Especialmente em noites. Todas elas. Ou a maioria, já perdi minhas contas nesse ponto.

Isso me deixava triste enquanto eu crescia. Lembro-me de minha mãe me beijando os cabelos e falando que logo logo ele estaria de volta. Bem, ele voltou. Ela não. Meio irônico, pois ela sempre esteve lá, e agora só quem está é meu pai, e ele trabalha meio período em minha vida.

Afasto esses pensamentos intrusivos e foco em medir direito o tanto de farinha que eu precisava colocar.

Ele dá um rápido beijo na minha cabeça por trás e vai para a sala, me deixando sozinho.

Termino a massa, mas tenho a impressão que eles ficariam amargos no final. Talvez fosse só meu paladar falando mais alto, também. Não importa muito.

Os botei no fogão e fiquei no Twitter esperando os quinze minutos habituais.

Mas, não me foquei na rede social. Minha mente trabalhava à cem por hora e meus pensamentos fluíam como uma fonte.

Penso sobre como me sinto sozinho em dias assim, onde inevitavelmente eu acabo sem ninguém em casa, nenhuma mini companhia.

Com o tempo eu aprendi a parar de reclamar das coisas que aconteciam comigo. Não por não me incomodarem mais, mas porque ninguém muda, nunca. Reclamar é apenas uma perca de tempo que te leva a ficar estressado por coisas que não são mutáveis. Isso me poupou tempo, mas qualquer coisa seria melhor do que a sensação de amargor no fundo do estômago, te dizendo que você poderia ter se revoltado.

Decido ignorar tudo o que penso nesse momento. Pego os cookies e provo um ainda quente. Delicioso. Me pergunto se em algum dia vou me cansar da sensação terna deles, do amargor do café que boto na massa e do doce dos trilhões de açúcar que nela leva.

Por um momento, me permito me distanciar de tudo enquanto suspiro mordendo outro pedaço que derrete em minha boca. Como só um.

Não dura muito, mas é o suficiente para me fazer voltar à música.

E dessa vez, quase faço meus dedos sangrarem ao apertar as cordas com toda a minha força.

~
oii, um mini pov do megumi dessa vez

tava pensando em intercalar as vezes ao longo da história pq eles pensam bem diferentes e eu quero mostrar isso, mas se vcs não gostarem eu não faço não!

enf, até próx semana!

Uncover • ItafushiOnde histórias criam vida. Descubra agora