Parte Sete

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Para White, aquele seria o começo de uma época confusa em sua vida.

—Então você vai colocar uma parte do meu corpo celestial em um corpo humano novo, enquanto o resto de meu espírito estará em sono profundo?

Gumpa piscou algumas vezes voltando a prestar atenção no mais novo, o pequeno Deus encarava o corpo que se assemelhava de mais com sua feição divina, deitado em uma câmara de gelo, ainda dormindo, como se estivesse dentro do útero da mãe divina.

—Sim, dentro dessa câmara, o resto do seu espírito ficará em sono profundo até que retorne.

—Você vai tomar cuidado certo? Ninguém pode saber disso... Muito menos Black.

Black era uma pedra no sapato de White, o gêmeo mais velho tinha a posição de cuidadoso número um, não permitiria em nenhuma hipótese que o mais novo se metesse nesse tipo de enrascada.

O plano de White era perigoso de mais, ele se envolveria na vida de um mortal, mudaria o curso dela, se exporia fora do mundo celestial, sua energia primordial estaria disposta para todas as pessoas que ele se relacionasse. Quem precisasse de alento, sugaria aquela energia solar sem sequer notar, o que poderia enfraquecer o Deus.

Isso poderia fazê-lo cair em demonização, o contato com pessoas de energia densa de raiva e rancor. Como o próprio Sean. 

Quando um Deus cai em demonização, ele perde toda sua energia celestial, tendo que viver a eternidade preso no submundo, reino de Black, sendo obrigado a sugar energia dos mortais para sobreviver.

Ou seja, o que White estava fazendo, sem nenhuma razão plausível, era quase um suicídio.

E Gumpa se questionava, se o que levava White a se arriscar assim por um mortal.

Era um sinal negativo, que ele estivesse ignorando por puro carinho ao Deus que ele viu crescer.

Mas assim ele o fez, colocou o corpo celestial de White em sono profundo e despertou o corpo humano com a consciência do Deus.

Os olhos negros redondos se abriram e Gumpa conteve um suspiro alto.

White tinha a aura suave e amorosa de sempre.

E a vontade de ficar próximo dele era forte, assim o mais velho voltou a se questionar, se deveria mesmo seguir com aquele plano.

—White, tenho medo de que isso...

—Nós não existimos para auxiliar os mortais? Eu desejo fazer apenas isso...

—Existimos para equilibrar o universo, não para servir ninguém.

White em seu corpo mortal, encarou o mais velho com um bico adorável, que acabou amaciando o coração do outro.

—Eu preciso disso, ajudar esse mortal.

•*•

Agora parado de frente ao olhar curioso e ainda levemente irritado do mortal que prendia sua atenção. Sean semicerrou os olhos observando novamente o pequeno a sua frente, dos pés a cabeça.

—Dinheiro? Deixe para lá eu tenho. —Mais um puxão forte de Sean e White o seguiu até o prédio próximo dali.

Encarando a nuca de Sean e suas costas, White podia sentir seu coração saltar como o de uma andorinha, ele não conseguiria diferenciar se isso era a ansiedade de auxiliar em algo a vida daquele humano, ou se isso era uma reação a outra coisa.

Algo desconhecido, que nasceu no dia que ele se pôs diante de uma bala por esse homem.

Quem faria isso normalmente? Mesmo sendo um Deus... Quem arriscaria tudo por outro alguém.

Será que era só benevolência que existia no coração do pequeno Deus?

Do lado de fora da farmácia, Sean e White estavam sentados no banco de madeira que se estendia diante do prédio sujo de terra.

Um Sean mal humorado, mas que sentia esse sentimento estranhamente controlado, limpava o ferimento do menor, o cobrindo com uma gaze limpa.

Os dois não trocaram mais nenhuma palavra, estavam absortos de mais dentro de sua própria realidade.

Mas não podiam deixar de ser encararem como se buscassem uma resposta clara para o que estava acontecendo, algo que detalhadamente pudesse explicar não só aquele momento de silêncio profundo, como as atitudes do outro.

—Então você disse que é novo aqui. —Sean abriu o momento de perguntas, subitamente interessado naquele ser de cabelos loiros diante de si, parecido com um querubim.

—So-u-u ... Sou novo sim, na verdade eu estou meio que fugindo.

—Fugindo do que?

Seja convincente White, convincente como o Black é.

—Ahn... Minha família é rica, bem rica, mas eles querem que eu case com alguém... Que eu não quero casar de jeito nenhum. Teve algumas brigas em casa, o casamento vai acontecer em breve, então eu realmente tive que fugir, não trouxe nada comigo, nada mesmo nem roupas. Quis deixar tudo o que os pertencia para trás.

Em uma única lufada de ar White lançou aquela meia verdade, apavorado em não conseguir sustentar uma mentira mais calculada. De fato estavam a séculos brigando com ele para que se casasse com a Deusa do Amor.

Mas essa briga tinha mais tempo do que o bisavô de Sean havia pisado na terra.

Subitamente o mal humorado Sean sentiu uma enorme empatia invadir seu coração, esse sentimento profundo o assustou no primeiro momento e ele se ergueu, afastando as mãos do curativo que cuidadosamente havia feito. Seus olhos se encontraram pela segunda vez naquele dia.

E Sean sentiu o coração se acelerar.

—Então... você não tem onde ficar?

—Não... —Admitiu sinceramente o pequeno Deus que começava a sentir dolorido o machucado e um cansaço estranho o abater.

As dores de ser um mortal eram infinitas?

—Vamos para minha casa então, vou pedir para vovó deixar você ficar um tempo, até conseguir resolver isso da sua família.

White escancarou a boca chocado, nem nos seus melhores pensamentos ele acreditou ser possível aquele homem cheio de ódio se posicionar para tentar ajudar alguém.

Ele sorriu, sentindo a mudança nos sentimentos de Sean e no seu semblante irritado.

Era tão rápido assim ajudar alguém com todo seu rancor de uma vida?

Então de fato ele poderia fazer isso mais vezes.

Levantando do banco atrás do homem alto, White o seguiu prontamente até a moto reluzente, Sean subiu rapidamente e entregou a ele um capacete.

—Sabe andar de moto?

Assim que colocou o objeto pesado na cabeça, White se voltou para Sean negando avidamente com a cabeça. E recebeu um sorriso em resposta.

—Suba então. Vou te explicar... Afinal! Qual é o seu nome?

O Deus corou por baixo do capacete, feliz pelo outro não poder ver.

—Whi-white ...

—Eu sou o Sean! Muito prazer.

por sua glória • SeanWhiteOnde histórias criam vida. Descubra agora