A chave para a sobrevivência em uma jornada junto com uma comitiva de anões mal-humorados é a negação. Negava que estava cansada, negava que estava com medo, negava sentir fome, negava até quando queria que prestassem atenção em mim e me dessem ouvidos. E o mais importante de tudo, eu negava que estava em negação. Sei que soa como algo tolo de fazer, mas nós, os seres terráqueos do meu mundo, talvez do futuro, só enxergamos aquilo que queremos e acreditamos naquilo que queremos acreditar e assim talvez as coisas deem certo. Nós mentimos tanto que as mentiras parecem ser verdades. Negamos tanto nossos sentimentos, que a gente não consegue reconhecer a verdade quando está na nossa cara. Onde quero chegar com isso? Bem, vocês vão compreender com o decorrer do que irei narrar a partir de agora.
Os dias de viagem prosseguiram, estávamos abastecidos de provisões suficientes até alcançarmos o local seguro citado por Gandalf, os anões pareciam mais animados e a chuva deu uma trégua. Tudo parecia perfeito e calmo, pelo menos para os anões. Depois do encontro com os Trolls, o medo de morrer pela segunda vez começou a rondar minha mente. E como um sentimento de alerta, talvez um sexto sentido por assim dizer, tinha a impressão de que nosso caminho até Valfenda não permaneceria tranquilo por muito tempo. Porém ao invés de contar a alguém sobre esse sentimento, preferi guarda-lo para mim e seguir em negação, ignorando como qualquer vozinha mental irritante.
Depois de uma longa caminhada pela manhã que progrediu até parte da tarde, decidimos montar acampamento na parte limpa da floresta antes de alcançarmos os terrenos abertos. Afinal teríamos que ser rápidos se quiséssemos passar por aquela área em segurança e alcançar a última casa amiga ao leste. E, para isso, não havia nada melhor do que encher a pança para recuperar as energias e aguentar com mais vigor a longa jornada.
Sentei sobre uma pedra coberta de musgo e retirei a espada da bainha para observa-la. Ela estava impecável, havia polido toda a sua lâmina e base com um pedaço de tecido cedido por Bofur. Mesmo o objeto não precisando ser lustrado desde que o encontramos nas cavernas dos Trolls, limpar sua extensão passava segurança e me acalmava de alguma forma. Se em minha outra vida me dissessem que seria dona de uma espada tão bela, iria rir e não acreditaria. E se tivesse, com certeza não cuidaria dela com tanto esmero e estaria juntando pó pendurada na parede do quarto.
Os anões estavam afastados montando acampamento, assim como Gandalf e o pequeno Bolseiro que conversavam quase em sussurros, com certeza o Hobbit estava recebendo algum tipo de concelho sábio do mago. Me senti levemente ofendida, pois Bilbo sempre pareceu receber os melhores conselhos, enquanto eu vivia recebendo frases estranhas das quais apenas no futuro consegui compreender sua mensagem. Até os dias de hoje Gandalf continua com a mesma forma insuportável de auxiliar.
― Alguma coisa se aproxima! ― Gritou Thorin ao escutar o farfalhar da mata densa, atraindo a atenção de todos para ele.
― Fiquem todos juntos! ― Ordenou Gandalf correndo até o amontoado de anões, os quais pararam o que estavam fazendo para se prepararem para a possível ameaça. ― Protejam a Elphaba!
― Que porra está acontecendo? ― Perguntei enquanto era puxada pelo antebraço por Gloín e escondida no centro do círculo de proteção quase sufocante. ― Gente...
― Fique quieta, Elph. ― Ordenou Dwalin me protegendo com seu corpo e me esmagando entre ele e mais três anões.
― Estão me sufocando. ― Gritei sem entender ao certo o que estava acontecendo.
O barulho de galhos quebrados e mata abrindo se intensificou, revelando que o que quer que fosse estava aproximando com grande velocidade do nosso acampamento. Meu sangue gelou naquele instante, percebendo que aquele poderia ser o primeiro momento que utilizaria uma espada para matar. De repente saindo do meio do mato, surgiu um trenó feito de galhos secos puxado por doze coelhos marrons e conduzido por um mago tão excêntrico quanto o próprio Gandalf. Ele gritava coisas sem sentido enquanto diminuía a velocidade do trenó mais legal que já vi na minha vida.
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𝐎𝐓𝐇𝐄𝐑 𝐒𝐈𝐃𝐄 ⇢ 𝑇𝘩𝑒 𝐻𝑜𝑏𝑏𝑖𝑡
أدب الهواةSempre nos ensinaram a ordem natural da vida é: Nascer, viver e morrer. Mas no meu caso, precisei realmente morrer para poder viver. THE HOBBIT / LOTR PERSONAGEM ORIGINAL ...