Não aguento mais.
Sério. Eu já teria enlouquecido, se não tivesse me ocupado com os estudos — as meninas estavam me mandando a matéria do dia —, enquanto estou deitada de bruços na cama, com as videochamadas para tranquilizar minha mãe, a maratona de animes que assisti no notebook, as receitas que tentei reproduzir no fogão embutido...
Ok, talvez eu tenha enlouquecido um pouco, se considerarmos os momentos em que rolei de rir no tapete da sala de Zaph, depois de algum diálogo interno, ou quando performei coreografias pela casa inteira com o som nas alturas, ou quando discuti com os pôsteres do Elvis Presley.
Mas a noite chega e, como dizia Kelly Key, com ela também vem a depressão. À noite, a gaiola parece mais reluzente com toda a iluminação artificial que reflete nos vidros e nas superfícies polidas, e, por consequência, relembro da minha verdadeira conjectura.
A TV parecia apenas mais um ruído de fofocas no meio de um salão vazio, sob o som abafado das ondas a quebrar nas areias da praia e das rodas no asfalto lá fora. A brisa marítima sacoleja sem piedade as palmeiras da área da piscina, mas seu barulho não ultrapassa as portas de vidros límpidos. A cozinha bem equipada olhava para mim da esquerda, por sobre a bancada de granito, como se perguntasse: "E agora?".
À direita da sala fica o corredor, com as duas suítes e o estúdio de musculação, onde os posteres do "Rei do Rock" parecem me julgar em silêncio de cima dos seus holofotes. O mesmo serve para os livros em diversos idiomas na estante que ocupa toda a parede, e os vasos de cerâmica, os quais eu daria a vida para ver as mãos de Zaph trabalhando. Sorrio só de imaginar aquele vampiro hiperativo concentrado em criar algo tão delicado e que demanda tanto tempo parado. Parece impossível. E ele está em algum lugar lá fora, cuidando para que nenhum outro vampiro chegue sequer a quinhentos metros dessa cobertura.
Eu estava morrendo de preocupação com ele. Isso é tão injusto, eu ser a única a precisar de proteção assim, colocar os outros em perigo e não poder fazer nada para ajudar.
Na cama king size, enterrada entre os travesseiros, o edredom e o silêncio absoluto, acabei pegando no sono, enquanto trocávamos mensagens. Devia ser de madrugada quando despertei, zonza, ao ouvir sonidos através da porta trancada.
Assim que me situei, meu coração começou a acelerar com a possibilidade de reencontrar um capelobo ou Vacors sedentos como antes, então fiquei quieta, a audição aguçada. Até que reconheci os rangidos da porta da geladeira e dos armários se abrindo suavemente, quase como se o invasor não quisesse provocar estrondos e alarmes. A noite em que um certo vampiro invadiu meu quarto, tão sorrateiro quanto uma raposa-cinzenta, me volta à mente.
É claro que faço a loucura de tirar a pesada coberta de cima de mim, me arrastar para a beirada da cama e correr em direção à porta. Zaph não deixaria alguém estranho entrar na sua casa assim, não é? A não ser que ele esteja... não, eu não quero pensar nessa possibilidade. Escancaro a porta num rompante, atravesso o corredor e paro no meio da sala, com a respiração um tanto arfante.
Zaph está de costas, remexendo na geladeira atrás do balcão e das banquetas, o único ponto de luz que clareia toda a sala. Parece que é a primeira vez que vejo seus ombros largos insertos na camiseta preta. Não me movo, mas ele para o que estava fazendo e levanta a cabeça, como se me pressentisse. O vampiro se vira e seus olhos focam nos meus.
— Só vim repor comida. — diz.
— Eu estava com saudade.
Dou um passo à frente, o que não abala nem um pouco a distância entre nós.
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As Aventuras (Eróticas) de Alice e Zaph
RomantikEm um ano, muita coisa pode acontecer. E logo naquele em que Alice havia, enfim, retornado para casa, decidida a recolocar sua vida de volta nos eixos, ela tem o quarto invadido por Zaph Petrescu, um vampiro vindo diretamente da Romênia. A partir da...