Beco sem saída

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Ian não via Mickey a dois dias.

Por algum motivo, pensou que veria Mickey todos os dias, mas isso não ocorreu.

Primeiro veio a preocupação de que havia feito algo de errado, depois se algo havia ocorrido com ele. Recorreu a sua fonte, a mais segura que poderia encontrar:

– Não aconteceu nada de errado com ele, mas bem que um caminhão podia ter passado por cima, ele tá muito chato. – Disse Mandy enquanto mastigava um sanduíche de atum. – Ele só fica no quarto o dia todo com aquela guitarra ou sei lá o que é aquilo.

– É que eu não vi mais ele na rua ou aqui na escola, nem no Kash and Grab, até achei que foi preso de novo. – Disse Ian, tentando disfarçar.

– Não, mas ele deve ter levado um pé na bunda, porque ele tá muito irritado. Mas logo ele volta ao normal, o que não é muito melhor.

Ian não soube se aquilo seria fruto de tudo o que ocorrera entre eles ou se o motivo do desaparecimento repentino fosse outra pessoa. A segunda hipótese começou a embrulhar o seu estômago.

As horas no trabalho passaram-se arrastadas. Por todo o expediente pensou em Mickey.

Tudo o lembrava do Milkovich, dos chocolates no balcão a estante onde se apoiaram para ter o último encontro escondido na despensa.

Tentou evitar Kash o dia todo, o relacionamento dos dois já não era mais o mesmo desde o dia em que tivera a primeira relação com Mickey, mas Kash não entendia os foras que levava de Ian e continuava investindo.

A cada soar de sino anunciando a entrada de um novo freguês, Ian esperava que fosse Mickey, mas nunca era ele.

O dia era de pouco movimento, o que piorava as coisas, pois significava que Ian teria de aturar Kash muito mais do que em dias quaisquer.

Inventou uma desculpa qualquer para a frieza e, após constatar que não havia nada a ser organizado nas prateleiras ou pó para ser limpo em canto nenhum, começou a ler a primeira revista que agarrou na prateleira de revistas, de repente, o diário de pesca parecia muito mais interessante que puxar assunto, passar as horas olhando para um catálogo de iscas artificiais era melhor do que olhar para a cara de Kash, e então passou a entender o motivo de Linda odiá-lo tanto assim.

Naquela tarde, Ian compreendeu que Linda poderia conviver com um marido dentro do armário para o resto de sua vida, mas provavelmente o que a irritava era todo o resto que vinha junto no pacote.

O homem não conseguia o respeito dos próprios filhos pequenos, tampouco dos clientes. Não conseguia evitar os pequenos furtos que aconteciam no balcão de chocolates, ou dizer não para as crianças que entravam na loja em busca de cigarros, e os vendia. Passava a maior parte do dia debruçado sobre o balcão lendo uma revista em vez de manter a postura e patrulhar a loja, e mandava Ian atender os fornecedores que chegavam na parte da tarde, sem conferir se estava tudo certo.

Era inevitável compará-lo com Mickey, pois Mickey era melhor em tudo.

Se relacionar com Mickey lhe causava mais adrenalina, mais incerteza, como a incerteza de vê-lo de novo. A palavra certa era emocionante. Mickey Milkovich era como um trem-bala, enquanto Kash era um carrinho de supermercado estacionado na sessão de grãos.

Era o segundo dia sem vê-lo e o moreno já lhe fazia falta. Os comentários idiotas e sarcásticos, o olhar malicioso que percorria todo o corpo de Ian sempre que se viam, saber que ele odiava todo mundo, mas era diferente com Ian, sem contar a idade apropriada para ter relações com um adolescente de 15 anos.

Para a alegria de Ian, que agora transitava o olhar pela página do calendário lunar que informava quando seria a melhor época do ano para pescar trutas, Kash anunciou a saída meia hora mais cedo.

Gallavich Before The StormOnde histórias criam vida. Descubra agora